TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020
236 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL As limitações ou restrições à liberdade de empresa, nela incluída a liberdade de concorrência, devem ser justifi- cadas à luz do princípio da proibição do excesso (n.º 2 do artigo 18.º da CRP): respeitado o “núcleo essencial” da liberdade de empresa, qualquer restrição não pode ir além do estritamente adequado ou necessário.» Aos particulares chamados a colaborar nas tarefas de administração, gestão e controlo do respeito pelas leis fiscais são impostos encargos que condicionam, mais ou menos extensamente, o exercício da sua ativi- dade económica − pense-se, v. g. , no dever de possuir sistemas informáticos de faturação sofisticados e segu- ros, e nas implicações que a imposição de tal dever tem para muitos operadores económicos com volumes reduzidos de negócio. São condicionamentos que visam a finalidade legítima de promover o interesse geral na cobrança célere e rigorosa dos impostos, mas que se encontram sujeitos, como toda a medida restritiva de direitos fundamentais, ao crivo da proibição do excesso (vide, a este respeito, o acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia, de 2 de junho de 2016, C-355/14 Polihim-SS , disponível em eur-lex.europa.eu ) . Esta exigência de proporcionalidade incide, não apenas sobre a obrigação imposta, mas sobre a sanção cominada; a proibição do excesso respeita, não apenas ao facto de o particular se encontrar adstrito ao cumprimento de uma obrigação mais ou menos onerosa, mas ao peso maior ou menor das consequências associadas ao incumprimento. Na verdade, as duas coisas são incindíveis – duas faces de uma e mesma medida submetida a escrutínio. 12. O Acórdão n.º 123/18 resumiu nos seguintes termos o abundante acervo jurisprudencial no domí- nio da proibição do excesso: «O princípio da proibição do excesso incide sobre medidas legislativas não liminarmente interditadas pela Constituição, e que prosseguem finalidades legítimas através de meios restritivos: finalidades legítimas, no sen- tido em que não são constitucionalmente proscritas; meios restritivos, porque implicam a ablação de direitos ou interesses fundamentais. (…) Como reconhece, há muito, a jurisprudência constitucional (vide, por todos, o Acórdão n.º 187/01), o princípio da proibição do excesso analisa-se em três subprincípios: idoneidade [ou ade- quação], exigibilidade [ou necessidade] e proporcionalidade [em sentido estrito ou justa medida]. O subprincípio da idoneidade determina que o meio restritivo escolhido pelo legislador não pode ser inadequado ou inepto para atingir a finalidade a que se destina; caso contrário, admitir-se-ia um sacrifício frívolo de valor constitucional. O subprincípio da exigibilidade determina que o meio escolhido pelo legislador não pode ser mais restritivo do que o indispensável para atingir a finalidade a que se destina; caso contrário, admitir-se-ia um sacrifício desnecessário de valor constitucional. Finalmente, o subprincípio da proporcionalidade determina que os fins alcançados pela medida devem, tudo visto e ponderado, justificar o emprego do meio restritivo; o contrário seria admitir soluções legislativas que importem um sacrifício líquido de valor constitucional.» Admitindo-se – como se admitiu − que a medida sob escrutínio tem carácter restritivo e visa fins legíti- mos, impõe-se questionar se a opção legislativa é idónea, exigível e proporcionada. A resposta não pode deixar de ser negativa. Embora a exigência de identificação do titular dos adquirentes na fatura não seja evidentemente ade- quada a prevenir, por si só, a utilização irregular de gasóleo colorido e marcado, concede-se que seja útil para sancionar e reprimir os comportamentos abusivos, na medida em que facilita o controlo pelas autoridades dos consumos efetuados pelos titulares dos cartões. Em consequência, não pode considerar-se desadequado o sancionamento do incumprimento da obrigação. Acontece que o incumprimento é sancionado, nos termos do RGIT, com a aplicação de uma coima que pode atingir um valor expressivo (a fixar entre os 250 € e os 165 000 € ). Mostra-se por isso desnecessária a exigência adicional de suportar os impostos que seriam devidos se fosse efetuada venda a quem não era titular do direito ao referido benefício fiscal.
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=