TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020

228 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL ressarcir; deste modo, a responsabilidade pelo pagamento da diferença revela-se, não como uma obrigação fiscal, mas como a sanção cominada pelo incumprimento de uma obrigação acessória de natureza sancionatória. III - A norma sindicada, ao exigir ao proprietário ou responsável legal pela exploração dos postos de com- bustível, em consequência do incumprimento da obrigação de emissão de fatura, que pague o imposto que seria devido se o gasóleo colorido e marcado fosse vendido a quem razoavelmente se presume não beneficiar do direito a adquiri-lo, impõe uma ablação patrimonial que agrava os custos suportados com o exercício da atividade económica, consubstanciando uma restrição à liberdade de iniciativa económica consagrada no n.º 1 do artigo 61.º da Constituição. IV - Aos particulares chamados a colaborar nas tarefas de administração, gestão e controlo do respeito pelas leis fiscais são impostos encargos – que condicionam, mais ou menos extensamente, o exercício da sua atividade económica –, que visam a finalidade legítima de promover o interesse geral na cobrança célere e rigorosa dos impostos, mas que se encontram sujeitos, como toda a medida restritiva de direi- tos fundamentais, ao crivo da proibição do excesso, que incide, não apenas sobre a obrigação imposta, mas sobre a sanção cominada; admitindo-se que a medida sob escrutínio tem carácter restritivo e visa fins legítimos, impõe-se questionar se a opção legislativa é idónea, exigível e proporcionada. V - Embora a exigência de identificação do titular dos adquirentes na fatura não seja evidentemente ade- quada a prevenir, por si só, a utilização irregular de gasóleo colorido e marcado, concede-se que seja útil para sancionar e reprimir os comportamentos abusivos, na medida em que facilita o controlo pelas autoridades dos consumos efetuados pelos titulares dos cartões, não podendo considerar-se desade- quado o sancionamento do incumprimento da obrigação. VI - Porém, o incumprimento é sancionado, nos termos do Regime Geral das Infrações Tributárias, com a aplicação de uma coima que pode atingir um valor expressivo, mostrando-se por isso desnecessária a exigência adicional de suportar os impostos que seriam devidos se fosse efetuada venda a quem não era titular do direito ao referido benefício fiscal; a obrigação de o vendedor pagar a diferença entre a taxa de imposto normal e a aplicável ao gasóleo colorido e marcado, nos casos em que não é emitida fatura em nome do titular do cartão, «vai além do necessário para prevenir a fraude e evasão fiscal»; a função sancionatória é plenamente assegurada no plano contraordenacional, perfilando-se a sanção adicional imposta pela norma sindicada – com a estrutura de uma norma de incidência fis- cal, ainda que servindo uma finalidade sancionatória – como um corpo estranho e funcionalmente redundante. VII - A medida seria razoável – porventura até indispensável – caso se pudesse presumir a utilização abusiva do regime da venda do gasóleo colorido e marcado nos casos em que é registada a operação no sistema eletrónico de controlo, não sendo emitida fatura em nome do titular do cartão; porém, essa presunção não tem justificação alguma, razão pela qual a responsabilidade pelo pagamento da diferença entre o imposto devido com e sem benefício fiscal não tem natureza propriamente tributária, sendo de con- cluir que a norma sindicada reprova no teste da necessidade, consubstanciando uma restrição excessiva da liberdade de iniciativa económica.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=