TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020

221 acórdão n.º 129/20 do contrato, e desde que constasse, por forma escrita, do contrato de trabalho, incidisse sobre atividade cujo exercício pudesse efetivamente causar prejuízo à entidade patronal e fosse acompanhada da atribuição ao trabalhador de uma retribuição durante o período de limitação da sua atividade, ainda que suscetível de redução equitativa nos casos em que a entidade patronal houvesse despendido somas avultadas com a sua formação profissional. Numa abordagem próxima daquela que vem sendo adotada pelo Tribunal de Justiça da União Europeia – de acordo com a qual o direito de trabalhar e de exercer uma profissão livremente escolhida ou aceite, bem como a liberdade de empresa, consagrados, respetivamente, nos artigos 15.º, n.º 1, e 16.º da Carta dos Direi- tos Fundamentais da União Europeia, não devendo ser entendidos como «prerrogativas absolutas», podem ser objeto de «restrições», desde que estas correspondam, efetivamente, a «objetivos de interesse geral prosse- guidos pela União e não constituam, face a esses objetivos, uma intervenção desproporcionada e intolerável, suscetível de atentar contra a própria essência desses direitos», nos termos que decorrem do artigo 52.º, n.º 1, da Carta (Processo C-190/16, ponto 54, e Processo C-614/13, ponto 59) –, o Tribunal começou por esclarecer, no Acórdão n.º 256/04, que a conformidade constitucional da restrição à liberdade de trabalho originada pela celebração do pacto de não concorrência dependia «da emissão de um juízo de proporciona- lidade, adequação e necessidade», e que este, por sua vez, não poderia deixar de passar «pela ponderação dos interesses conflituantes em presença». Levando a cabo tal ponderação, o Tribunal concluiu ali o seguinte: «A este propósito referem Mário Pinto, Pedro Furtado Martins e António Nunes de Carvalho (obra e local citados): “2. À proibição estabelecida no n.º 1 segue-se a previsão de uma exceção, mediante a afirmação da pos- sibilidade de celebração do chamado «pacto de não concorrência», isto é, de um acordo por virtude do qual o trabalhador se obriga a não desenvolver a sua atividade por forma que possa ser prejudicial para a anterior entidade patronal, comprometendo-se, designadamente, a não trabalhar para uma empresa concorrente ou a não exercer por conta própria atividades concorrentes. Compreende-se que, em certos casos, o empregador se queira precaver contra os prejuízos que lhe podem advir do facto de o trabalhador passar a exercer, por conta própria ou alheia, atividades concorrentes. Na constância da relação de trabalho impende sobre o trabalhador um dever de lealdade, do qual decorre a obrigação de se abster de divulgar informações reservadas ou de as usar em proveito próprio ou alheio, bem como a proibição de trabalhar para uma empresa concorrente, desde que, atenta a natureza das funções desenvolvidas e a sua situação nessa empresa, tal envolva o perigo de contribuir para um desvio, atual ou meramente potencial, de clientela [cfr. supra , artigo 20.º, n.º 1, alínea d) , e respetiva anotação]. Uma vez terminada a relação de trabalho, poder-se-ia pensar que se extingue essa obrigação. Simplesmente, acontece que não cessam os perigos do exercício de atividades concorrenciais. É certo que permanece ainda, mesmo na ausência de qualquer pacto de não concor- rência, um dever geral de lealdade pós eficaz, que torna ilícita, por exemplo, a divulgação de segredos comerciais e industriais (vide Raúl Ventura, Extinção... , cit., pp. 358-359), bem como as atuações contrárias à boa fé, como a disponibilização pelo trabalhador junto de uma empresa concorrente «de documentação a que tenha tido acesso (assim, listas de clientes, suportes informáticos, etc.) em termos de prejudicar o antigo empresário» – Bernardo Xavier, in Curso de Direito do Trabalho, Verbo, Lisboa, 1992, p. 543. Mas o que está em causa não se resume à não divulgação de segredos [a qual, de resto, é expressamente tutelada por normas penais – cfr. supra , anotação ao artigo 20.º, n.º 1, alínea d) ] ou de documentação reservada. No desenvolvimento da relação laboral o trabalhador adquire uma série de conhecimentos da mais diversa natureza: desde os que diretamente se relacionam com a forma de exercício das suas funções (como os relativos à aplicação das técnicas profissionais), até aos que se prendem com a própria atividade da empresa para a qual trabalha (conhecimentos de técnicas industriais, comerciais e organizacionais, muitas das quais não constituem verdadeiros segredos cuja divulgação seja ilícita, conhecimentos sobre os mercados e forma de neles atuar

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