TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020
219 acórdão n.º 129/20 «Na sua vertente de direito de defesa, a liberdade de escolha de profissão implica que se não possa ser forçado a escolher (e exercer) uma determinada profissão e se não possa ser impedido de escolher (e exercer) qualquer profis- são para a qual se possua os necessários requisitos, bem como de obter esses mesmos requisitos. Por outro lado, a liberdade de escolha de profissão não consiste apenas na faculdade de escolher livremente a profissão desejada, mas garante constitucionalmente os seus diversos níveis de realização, incluindo a obtenção das habilitações académicas e técnicas para o exercício da profissão, o ingresso na profissão e o exercício da profissão, pelo que é de entender que o exercício livre da profissão está igualmente inserido no âmbito normativo de proteção do artigo 47.º, n.º 1. Acresce que o conceito de profissão ou género de trabalho cobre não apenas as profissões de conteúdo funcio- nal estatutariamente definido, mas também toda e qualquer atividade não ilícita suscetível de constituir ocupação ou modo de vida, pelo que nenhuma razão existe para excluir a garantia constitucional do artigo 47.º, n.º 1, em relação a certa espécie ou tipo de trabalho (sobre todos estes aspetos, Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. I, 4.ª edição, Coimbra, p. 653-655)». Efetivamente, e como afirma Jorge Miranda, «[e]mbora a Constituição não defina profissão ou género de trabalho, o conceito constitucional de profissão relevante para efeitos de delimitação do âmbito de pro- teção do artigo 47.º deve ser recortado com grande amplitude. (…) [N]uma ordem de liberdade assente no respeito pela dignidade da pessoa humana, que reconhece que a realização de uma pessoa também passa pela escolha e pelo exercício de uma atividade profissional – enquanto “meio para a realização condigna de proje- tos pessoais de vida, em harmonia, aliás, com o que dispõe o artigo 26.º” (Acórdão n.º 155/09) –, qualquer género de profissão ou trabalho, seja típico ou atípico, permanente, temporário ou sazonal, subordinado ou independente, em exclusividade ou em cumulação, está coberto prima facie pela tutela do artigo 47.º» (Jorge Miranda/Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo I, 2.ª edição, Coimbra: Coimbra Editora, 2010, pp. 964 e seguintes). Ou, nas palavras de Gomes Canotilho/Vital Moreira: «O conceito de profissão ou de género de tra- balho cobre não apenas as profissões de conteúdo funcional estatutariamente definido, mas também toda e qualquer atividade não ilícita suscetível de constituir ocupação ou modo de vida. (…) O âmbito semân- tico-constitucional do termo não abrange apenas as profissões cujo “perfil” tradicional está juridicamente fixado; mas, também, as atividades profissionais “novas”, “atípicas” e “não habituais”. Corresponde, assim, ao sentido normativo-material de liberdade de profissão o direito de criação de novas profissões e o direito de caracterização intrínseco da atividade profissional» ( Constituição da República Portuguesa Anotada, Vol. I, 4.ª edição, Coimbra: Coimbra Editora, 2007, pp. 654 e seguintes).» É igualmente pacífico na jurisprudência constitucional que a liberdade de escolha de profissão consa- grada no artigo 47.º, n.º 1, da Constituição se apresenta como um direito fundamental complexo, que inte- gra, ao lado de direitos de defesa contra a imposição ou impedimento da escolha ou exercício de uma dada profissão, direitos a prestações conexionadas com o direito ao trabalho e com o direito ao ensino, como o direito à obtenção das habilitações necessárias para o exercício da profissão, os direitos ao ingresso e à progres- são nela e o direito ao livre exercício da mesma profissão (cfr., por exemplo, os Acórdãos n. os 155/09, 94/15, 509/15 e 319/18; na doutrina, vide Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada , vol. I, 4.ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2007, anotações I e seguintes ao artigo 47.º, p. 653 e seguintes; e Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada , tomo I, 2.ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2010, anotações III e seguintes ao artigo 47.º, pp. 965 e seguintes). Do mesmo modo, é pacífico também que, tal como resulta expressamente da parte final do preceito que a consagra, a liberdade de escolha e de exercício de profissão se encontra sob reserva das restrições legais impos- tas pelo interesse coletivo ou inerentes à sua [ – do respetivo titular – ] capacidade. Na formulação seguida no Acórdão n.º 509/15, trata-se, «portanto, de um dos casos a que se reporta o artigo 18.º, n. os 2 e 3, da Constitui- ção, pelo que tais restrições ou condicionamentos legais, sejam de índole objetiva ou subjetiva, são admissíveis,
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