TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020
211 acórdão n.º 129/20 x) A liberdade de trabalho e de profissão mostra-nos uma relação estrita com o direito ao trabalho, logo, no sistema constitucional português, o trabalho releva enquanto liberdade de escolha e de exercício de profissão, nos termos do disposto no artigo 47.º da CRP e como um direito social, por força do artigo 58.º do mesmo diploma legal. y) Uma ordem de liberdade assente no respeito pela dignidade da pessoa humana, que reconhece que a realiza- ção de uma pessoa também passa pela escolha e, acima de tudo, pelo exercício de uma profissão, está abrigada pelo artigo 47.º da CRP, o que, salvo melhor entendimento, foi violado in casu . z) Considerando que, estamos a tratar de uma atividade pessoal, numa vertente duradoura e economicamente preponderante, um pacto de não concorrência pós cessação contratual padece inevitavelmente de inconsti- tucionalidade no sentido de que se trata de uma severa limitação à escolha e exercício de uma profissão visto à luz da realização da personalidade da pessoa, cabe reforçar que a liberdade de trabalho deve ser entendida como ocupação da vida através da qual se realiza a personalidade e se obtêm meios de subsistência. aa) Quaisquer restrições ao exercício de atividade profissional, após cessação de vinculo, contrariam o direito a não ser impedido de exercer uma profissão para a qual se esteja habilitado, ainda que temporariamente. bb) Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição , 4.ª edição, Almedina, Coimbra, 2000, p. 447, realça que em matéria de direitos, liberdades e garantias, “a exigência da adequação aponta para a necessidade de a medida restritiva ser apropriada para a prossecução dos fins invocados pela lei (conformi- dade com os fins). A exigência da necessidade pretende evitar a adoção de medidas restritivas de direitos, liberdades e garantias que, embora adequadas, não são necessárias para se obterem os fins de proteção visados pela Constituição ou a lei. Uma medida será então exigível ou necessária quando não for possível escolher outro meio igualmente eficaz, mas menos ‘coativo’ relativamente aos direitos restringidos. O princípio da proporcionalidade em sentido restrito (= princípio da ‘justa medida’) significa que uma lei restritiva, mesmo adequada e necessária, pode ser inconstitucional, quando adote ‘cargas coativas’ de direitos, liberdades e garantias ‘desmedidas’, ‘desajustadas’, ‘excessivas’ ou desproporcionadas’ em relação aos resultados obtidos.” cc) Deste modo, por terem sido violados direitos fundamentais no presente caso, por não se terem respeitado imposições legais imperativas, por ser desproporcional e contrário à ordem pública, o pacto de não concor- rência aqui em causa é inconstitucional. dd) Assim, por tudo quanto se disse, entende a recorrente que o n.º 1 e 2 do artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 178/86, é inconstitucional, quando interpretado no sentido de que é inconstitucional estabelecer um pacto de não concorrência, após a cessação de contrato, por um período máximo de dois anos, na medida em que ninguém pode ser impedido de exercer uma profissão para a qual esteja habilitado por violar os artigos 47.º, n.º 1, e 58.º, n.º 1, ambos da Constituição da República Portuguesa. ee) No mesmo sentido, é inconstitucional na interpretação de que os n. os 1 e n.º 2 do artigo 9.º do Decreto-Lei 178/86, de 3 de julho violam o pleno da liberdade de trabalho e de escolha e exercício de profissão, podendo, nessa medida, ser entendidas como atentatórias de um direito ou liberdade fundamental e indisponível, como o é a liberdade ao trabalho e liberdade de trabalho. ff ) Concomitantemente, os n. os 1 e n.º 2 do artigo 9.º do Decreto-Lei 178/86, de 3 de julho, cuja constitucio- nalidade se pretende ver apreciada, colidem com princípios de ordem pública na medida em que restringem direitos indisponíveis, sendo certo que, toda a limitação voluntária ao exercício dos direitos de personalidade é nula, se for contrária à ordem pública nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 81.º do Código Civil» 5. As recorridas apresentaram contra-alegações com o seguinte teor: «[…] II – Do objeto do recurso Da leitura das conclusões do douto recurso interposto resulta que a questão que se submete à apreciação deste Tribunal, se resume ao seguinte:
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