TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020
208 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Mais concretamente, os n. os 1 e n.º 2 do artigo 92 do Decreto-Lei 178/86, de 3 de julho, quando interpretados no sentido de […] estabelecer um pacto de não concorrência, após a cessação de contrato, por um período máximo de dois anos, na medida em que ninguém pode ser impedido de exercer uma profissão para a qual esteja habilitado por violar os artigos 47.º, n.º 1, e 58.º, n.º 1, ambos da Constituição da República Portuguesa, conjugando ainda com a interpretação de que os referidos preceitos legais colidem com princípios de ordem pública na medida em que restringem direitos indisponíveis, sendo certo que, toda a limitação voluntária ao exercício dos direitos de per- sonalidade é nula se for contrária à ordem pública nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 81.º do Código Civil». 4. Depois de para o efeito notificada, a recorrente requereu que fossem consideradas as alegações que apresentara juntamente com o requerimento de interposição do recurso, no âmbito das quais concluiu do seguinte modo: «Conclusões a) O digníssimo Tribunal de primeira instância decidiu julgar não verificada a nulidade da cláusula de não concorrência por ser contrária à ordem pública porque limitativa do direito de trabalho e ao trabalho da recorrente, considerando que o direito ao trabalho não está limitado, pois nada obstaria a que aquela exercesse qualquer outra profissão, remunerada, no período de dois anos acordado, caso contrário a norma contida no artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 178/86 seria inconstitucional, o que não se verifica. b) Esta decisão foi confirmada pelo não menos digníssimo Tribunal da Relação do Porto, o que não concorda a recorrente com a douta decisão ora recorrida. c) O artigo 9.º Decreto-Lei 178/86 de 3 de julho, na sua atual redação, dispõe o seguinte: “Artigo 9.º Obrigação de não concorrência 1 – Deve constar de documento escrito o acordo pelo qual se estabelece a obrigação de o agente não exer- cer, após a cessação do contrato, atividades que estejam em concorrência com as da outra parte. 2 – A obrigação de não concorrência só pode ser convencionada por um período máximo de dois anos e circunscreve-se à zona ou ao círculo de clientes confiado ao agente.” d) Entende a recorrente que os n. os 1 e 2 do artigo 9.º do Decreto-Lei 178/86, de 3 de julho, são inconstitucio- nais quando interpretados no sentido de que se pode estabelecer um pacto de não concorrência pós cessação contratual, por um período máximo de dois anos, na medida em que ninguém pode ser impedido de exercer uma profissão para a qual esteja habilitado por violar os artigos 47.º, n.º 1 e 58.º, n.º 1, ambos da Constitui- ção da República Portuguesa. e) E, são inconstitucionais na medida em que é violado o pleno exercício da liberdade de escolha e, acima de tudo, de exercício de profissão, podendo, ser entendido como atentatórios de direitos ou liberdades funda- mentais e indisponíveis. f ) O referido pacto de não concorrência carece de proporcionalidade, adequação e necessidade pelo extenso período de limitação de atividades e pela restrição excessiva do exercício de várias atividades. g) Ademais, resulta do disposto no n.º 1 do artigo 81º do Código Civil que: “Toda a limitação voluntária ao exercício dos direitos de personalidade é nula, se for contrária à ordem pública.”, e resulta do n.º 2 do artigo 280.º do C.C. que: “É nulo o negócio contrário à ordem pública, ou ofensivo dos bens costumes”, sendo que, o critério para aferir da validade ou invalidade deste pacto é o Princípio Geral da ordem pública. h) Logo, o pacto de não concorrência previsto nos n. os 1 e 2 do artigo 9.º Decreto-Lei 178/86, de 3 de julho, na sua atual redação, para além de violarem uma norma imperativa, são uma clara exceção aos princípios consagrados nos artigos 47.º, n.º 1, e 58.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa na medida em que ninguém pode ser impedido de exercer uma profissão para a qual se encontre apto. i) Sabendo que, cessando o contrato, o agente (ou subagente) fica obrigado a abster-se de levar a cabo atividades concorrenciais com o seu anterior “empregador/representado”, tal implica a impossibilidade de atuação na área para a qual adquiriu formação e se encontra apto.
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