TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020

172 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL político-legislativa estruturante e basilar, ordenadora quer do direito penal, quer do direito contraordenacional. Na verdade, e como se referiu nos Acórdãos n.º 335/18, 336/18, 363/18 e 394/18, para além da referida remis- são para o regime do processo penal, o diploma de enquadramento do direito de ordenação social não deixou de integrar disciplina que tem implícita a opção fundamental pelo efeito suspensivo da impugnação judicial, vedando a execução da decisão administrativa sancionatória em caso da impugnação prevista no artigo 59.º do RGCO. É o que decorre do artigo 58.º do RGCO, onde se estipulam os requisitos a que deve obedecer a decisão que aplica a coima ou as sanções acessórias, sendo imposta a explicitação, no texto da própria decisão, que a condenação apenas se torna definitiva e exequível se não for judicialmente impugnada [n.º 2, alínea a) ] e que o termo inicial do prazo para pagamento da coima apenas ocorre «após o caracter definitivo ou o trânsito em julgado da decisão» [n.º 3, alínea a) ]. Temos, então, que o legislador governamental, ao estipular como regime-regra da impugnação judicial o efeito devolutivo, veio regular matéria coberta pelo regime geral do processo contraordenacional, que alterou no âmbito regulatório da saúde sem que se encontrasse credenciado por autorização parlamentar, infringindo desse modo a reserva relativa de competência da Assembleia da República, estabelecida pela alínea d) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição (destacado)”. Considerando que tal raciocínio, relativo àquele procedimento legístico, repetido pelo Decreto-Lei n.º 74/2019, é perfeitamente transponível para o presente processo e, por conseguinte, aplicável à norma constante do artigo 43.º, n.º 4, daquele diploma, impõe-se concluir que também à luz da alínea d) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição a norma ora em análise é inconstitucional. Em razão do exposto, a norma do artigo 43.º, n.º 4, dos Estatutos da AMT, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 74/2019, de 14 de maio, no sentido em que determina que o recurso que visa a impugnação judicial das decisões finais condenatórias da AMT em processo de contraordenação tem, por regra, efeito meramente devolutivo, ficando a atribuição de efeito suspensivo dependente da prestação de caução e da verificação de um prejuízo considerável, para o recorrente, decorrente da execução da decisão, é organicamente inconsti- tucional por violação da competência reservada da Assembleia da República, constante das alíneas b) e d) do n.º 1 do artigo 165.º, conjugadas com os n. os 2 e 10 do artigo 32.º, ambos da Constituição da República Portuguesa. III – Decisão Pelo exposto, decide-se: a) Julgar inconstitucional a norma constante do artigo 43.º, n.º 4 dos Estatutos da AMT, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 78/2019, de 14 de maio, no sentido em que determina que o recurso que visa a impugnação judicial das decisões finais condenatórias da AMT em processo de contraordenação tem, por regra, efeito meramente devolutivo, ficando a atribuição de efeito suspensivo dependente da prestação de caução e da verificação de um prejuízo considerável, para o recorrente, decorrente da execução da decisão, por violação da competência reservada da Assembleia da República, cons- tante das alíneas b) e d) do n.º 1 do artigo 165.º, conjugadas com os n. os 2 e 10 do artigo 32.º, ambos da Constituição da República Portuguesa; b) Negar provimento ao recurso interposto. Sem custas. Lisboa, 12 de fevereiro de 2020. – Mariana Canotilho – Pedro Machete – Fernando Vaz Ventura – Manuel da Costa Andrade.

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