TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020

152 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Porém, pese embora esse reconhecimento, os recorrentes pretendem integrar os dois acórdãos emitidos pelo tribunal recorrido, de modo a neles encontram um único ato decisório, argumentando que o acórdão do STJ de 6 de junho de 2019 constitui “confirmação da decisão de aplicar normas inconstitucionais”. Mais uma vez, não lhes assiste razão. Na verdade, a questão versada pelo acórdão recorrido – os pressupostos do recurso para uniformização de jurisprudência, estabelecidos no artigo 688.º do Código de Processo Civil – é inteiramente autónoma e não se confunde com os juízos proferidos anteriormente. Do referido aresto não decorre um qualquer julga- mento confirmatório do antes decidido nos autos, tanto mais que foi proferido pela conferência, em sede de reclamação de decisão do relator (artigo 692.º, n.º 2), e não pelo pleno das secções cíveis, como seria o caso na eventualidade de o recurso ter franqueado o exame preliminar (artigo 688.º). Importa notar que a referida autonomia dos recursos extraordinários encontra tradução na solução normativa acolhida nos n. os 2, 3 e 6 do artigo 70.º da LTC, em sede de admissibilidade do recurso de cons- titucionalidade ou legalidade qualificada: não é exigido, nos casos de mobilização das alíneas b) e f ) do n.º 1 do mesmo preceito, e para verificação do pressuposto de esgotamento das vias de recurso, a exaustão dos recursos destinados à uniformização de jurisprudência; interpondo a parte recurso para uniformização de jurisprudência, o facto deste não ter seguimento por razões de ordem processual não impede, nem cerceia a possibilidade de impugnação jurídico-constitucional, contanto que, como é bom de ver, que estejam reuni- dos todos pressupostos gerais e especiais da via de recurso mobilizada. Assente este ponto, é evidente, como sumariamente decidido, a desconformidade do questionamento formulado com a ratio decidendi do acórdão recorrido, o que determina a inutilidade do conhecimento do recurso. Em rigor, este fundamento não é contrariado pelos reclamantes, que se limitam a alegar, de forma conclusiva, que “se o Tribunal Constitucional apreciar as inconstitucionalidades invocadas, declarando-as, haverá que se proceder a uma reponderação pelo tribunal a quo e, consequentemente, a uma revogação do Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça”; antes, os próprios recorrentes confirmam que o acór- dão recorrido “na realidade, não se (…) pronunci(ou) sobre tais questões”. E, com efeito, no acórdão que indeferiu a reclamação, mantendo a decisão que rejeitou liminarmente o recurso para a uniformização de jurisprudência, não foi feita aplicação, expressa ou implícita, de qualquer dos sentidos questionados pelos reclamantes, o que retira utilidade ao conhecimento do recurso. Como o Tri- bunal Constitucional tem reiteradamente afirmado, considerando o carácter ou a função instrumental dos recursos de fiscalização concreta, caso a norma impugnada não tenha constituído determinante do julgado, não pode o Tribunal tomar conhecimento do objeto do recurso, por falta de interesse processual, já que, qualquer que seja o juízo formulado pelo Tribunal Constitucional sobre a questão jurídico-constitucional, a decisão impugnada mantém-se inelutavelmente incólume. Como se disse, no seu acórdão de 6 de junho de 2019, o STJ limitou-se a conhecer e decidir (negati- vamente) da admissibilidade do recurso para uniformização de jurisprudência, assentando a sua  ratio deci- dendi  unicamente em norma contida no n.º 1 do artigo 688.º do Código de Processo Civil, sobre a qual não versa o recurso. O que significa que, qualquer que fosse o julgamento formulado por este tribunal sobre as questões de inconstitucionalidade formuladas pelos reclamantes, sempre estaria o julgador legitimado a manter inalterada a decisão de rejeição liminar do recurso para uniformização de jurisprudência, por não afetado o efetivo fundamento jurídico em que assenta. Nessa medida, não podendo atingir a instrumentalidade a que está adstrito – a reforma da decisão recorrida (artigo 80.º, n.º 2, da LTC) –, o recurso não pode ser conhecido, cumprindo manter a decisão reclamada. 9. Cumpre, por tais razões, confirmar a decisão sumária de não conhecimento do recurso e indeferir a reclamação apresentada.

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