TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020

145 acórdão n.º 105/20 «18. No recurso de uniformização de jurisprudência interposto pelos ora recorrentes em 21/09/2018, foi invo- cada a inconstitucionalidade do acórdão de revista proferido pelo STJ em 14/06/2018. 19. Com efeito, a interpretação do disposto no artigo 2.º, alínea a) do Regime Jurídico da adoção (RJPA), aprovado pela Lei 143/2015, de 8 de setembro, no sentido de negar a revisão e confirmação da adoção plena e legalmente decretada em Guiné Bissau quando os adotantes têm residência habitual tanto no seu país de origem, Portugal, como no país da nacionalidade e residência dos adotados, é não só ilegal, por violação do disposto no artigo 82.º, n.º 1 do Código Civil (CC), como manifestamente inconstitucional por violação do disposto no artigo 36.º, n. os 1 e 7 da Constituição da República Portuguesa (CRP). (…) 23. Ora, ao decidir como no acórdão recorrido, violou o tribunal recorrido a quo as acima indicadas normais legais e constitucionais, tendo negado aos adotantes, ora Recorrentes, o direito a constituir família, à luz do orde- namento jurídico português e aos adotados a mencionada tutela da constituição de uma relação jurídica de adoção. (…) 26. Verifica-se, pois, a inconstitucionalidade da interpretação da Lei do Regime Jurídico do Processo de Adoção (RJPA), segundo a qual um cidadão português ou um casal de cidadãos portugueses não pode adotar uma criança, nascida, conhecida por eles na sua terra de origem, a Guiné Bissau, quando lá residiam legalmente, em Catió, na Guiné Bissau, senão ao abrigo da Lei do RJPA, que se lhes não aplica, por o processo de adoção nada ter a ver com esse RJPA, não ser uma adoção internacional tal como definida na Lei. E uma vez decretada a adoção, na Guiné Bissau, segundo a lei da Guiné Bissau, que não é Parte da Convenção relativa à proteção das crianças e à cooperação em matéria de adoção internacional, concluída em Haia em 21/05/1993 a que Portugal aderiu, transposta para a Lei 143/2015, de 8 de setembro, que fixou o Regime Jurídico do Processo de Adoção Internacional, e que recusa o efeito da adoção feita por um casal de cidadão portugueses aí residentes (também) ao proibir que os filhos adotivos com eles seus pais entrem em Portugal nessa qualidade, e aqui sejam como tal registados e protegidos pela lei com todos os direitos inerentes. 27. Recusando o reconhecimento da sentença por dizerem que o Tribunal da Guiné Bissau é incompetente para atribuir a adoção em conclusão de um processo de adoção de duas crianças nascidas na Guiné Bissau, dois anos e meio e três anos e meio, por um casal de portugueses residente em Catió e no Porto ou em Matosinhos ou onde for. 28. Ao restringir o direito do casal de portugueses a adotar segundo a lei da Guiné Bissau, em processo da Guiné Bissau, no Tribunal da Guiné Bissau, de duas crianças aí nascidas e residentes por eles terem também residência aí e em Portugal, significa uma restrição absolutamente inaceitável do direito de cidadãos portugueses a exercerem o direito fundamental a adotar no estrangeiro, onde residem segundo a lei local, o processo local ainda para mais de um país da CPLP com o qual Portugal tem até acordo especial de reconhecimento das decisões judiciais. 29. Acresce que, a decisão recorrida, é ainda inconstitucional, por entender que deverá ser um órgão adminis- trativo – a Autoridade Central – a rever e confirmar uma decisão judicial. 30. Com efeito, é inconstitucional a aplicação feita pelo STJ, do disposto no artigo 90.º, n.º 3 da Lei 143/2015, de 8 de setembro, quando interpretado no sentido de que deverá ser um órgão administrativo do Estado (a Auto- ridade Central da Segurança Social) a rever e confirmar uma sentença judicial de adoção, por violação do disposto nos artigos 2.º e 111.º da CRP. 31. Relativamente à legitimidade do Ministério Público, veio o Tribunal recorrido reforçar a defesa da sua competência para recorrer “pela existência de dois incapazes por menoridade – artigo 3.º, n.º 1 alínea a) do EMP.” 32. Refere o artigo 3.º, n.º 1, alínea a) do EMP, “1 – Compete, especialmente, ao Ministério Público: a) Representar o Estado, as Regiões Autónomas, as autarquias locais, os incapazes, os incertos e os ausentes em parte incerta”; 33. Acontece que a intervenção do Ministério Público deve, em cada processo, centrar-se no interesse que defende – cfr. artigo 5.º, n.º 1, alíneas c) do EMP, “O Ministério Público tem intervenção principal nos processos: c) Quando representa incapazes, incertos ou ausentes em parte incerta;”

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