TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020
140 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL não decorre um qualquer efeito restritivo, e muito menos ablativo, das garantias de defesa do arguido, mormente do direito deste a impulsionar a reapreciação em recurso da declaração de culpabilidade e/ou da questão do sancionamento. Na verdade, em caso de decisão condenatória, a legitimidade conferida ao Ministério Público para recorrer, estatuída na alínea a) do n.º 1 do artigo 401.º do CPP, seja no sentido do agravamento da posição do arguido, seja no seu exclusivo interesse, convive, no sistema normativo processual penal, com a legiti- midade também conferida ao arguido para impugnar as decisões contra ele proferidas [alínea c) do mesmo número e preceito]. Nessa medida, a decisão do arguido sobre o exercício ou não do direito ao recurso de decisão condenatória proferida em 1.ª instância não depende, nem é condicionada pela conduta de outros sujeitos processuais – apenas de si depende. Por assim ser, não podia o arguido deixar de estar consciente de que, escolhendo não impugnar a sua condenação, mormente por com ela se conformar, essa sua opção não operava, por si só, a consolidação do julgamento, pois poderia ser confrontado, como veio a acontecer, com a interposição de recurso in pejus pelo Ministério Público. Não procede, pois, a alegação de que, na hipótese normativa em presença, o ambiente normativo em que se inscreve a norma sindicada impede o arguido de impugnar por via de recurso a decisão proferida em 1.ª instância, estando o Ministério Público legitimado a fazê-lo, ou que atribui um qualquer efeito restritivo do acesso ao Supremo Tribunal de Justiça à opção do arguido de não interpor recurso de tal decisão con- denatória, inexistindo nessa matéria um qualquer favorecimento da acusação em detrimento dos meios de defesa do arguido. 11. É certo que o julgamento do recurso comportou um agravamento da posição processual do arguido relativamente ao antes decidido, mas daí não decorre uma situação de indefesa do sujeito processual, cons- titucionalmente proibida. No âmbito do recurso da decisão condenatória proferida em 1.ª instância, ciente da pretensão de modificação da reação penal e da natureza fundamentalmente substitutiva do julgamento proferido pela 2.ª instância, pôde o arguido, para além de refutar os argumentos do recorrente, perspetivar as eventuais consequências sancionatórias – à semelhança com o que acontece frequentemente no momento da apresentação na 1.ª instância da contestação e rol de testemunhas (artigo 315.º do CPP), ou nas alegações orais proferidas em audiência de julgamento (artigo 360.º do CPP) – e desse modo influenciar decisivamente o julgamento do recurso. No quadro em presença, a limitação das garantias de defesa, na dimensão do exercício do direito ao recurso e do acesso a um terceiro grau de jurisdição, não se mostra desrazoável ou desproporcionada, em atenção ao interesse público relevante prosseguido pelo legislador democraticamente legitimado, impondo- -se afastar a violação do artigo 32.º, n.º 1, em conjugação com o artigo 18.º, n.º 2, ambos da Constituição, ou outros parâmetros de constitucionalidade, designadamente os demais invocados na parte final da recla- mação, os quais, enquanto princípios estruturantes do Estado de direito democrático, são pressupostos da garantia de defesa do arguido em processo penal, não se mostrando por qualquer forma lesados pela norma sindicada. 12. Impõe, por tais razões, manter o julgamento negativo de inconstitucionalidade proferido pela deci- são sumária reclamada e indeferir a reclamação.
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