TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020

139 acórdão n.º 104/20 à Lei n.º 20/2013, a qual censurou com fundamento unicamente nas exigências do princípio da legalidade em matéria criminal), em trecho referido na decisão sumária reclamada: «Entendendo, também, que muito embora se aceite que o legislador possa fixar um limite acima do qual não é admissível um terceiro grau de jurisdição, preciso é que “com tal limitação se não atinja o núcleo essencial das garantias de defesa do arguido”, devendo a limitação dos graus de recurso ter “um fundamento razoável, não arbitrário ou desproporcionado”. Porquanto a garantia constitucional do direito ao recurso não se esgota naquela dimensão. Esta garantia, “conjugada com outros parâmetros constitucionais, pressupõe, igualmente, que na sua regulação o legislador não adote soluções arbitrárias e desproporcionadas, limitativas das possibilidades de recor- rer – mesmo quando se trate de recursos apenas legalmente previstos e não constitucionalmente obrigatórios” (Acórdãos n. os 189/01 e 628/05. E, ainda, Acórdão n.º 64/06, todos disponíveis e m www.tribunalconstitucional.pt ). 9. O argumentário esgrimido na reclamação assenta na transposição das ponderações avançadas no Acórdão n.º 595/18 para a dimensão normativa em análise, o que, na ótica do recorrente, justifica que se afirme a imposição constitucional da admissibilidade de recurso do arguido em todos os casos de agravação das consequências jurídicas do crime pelo tribunal de recurso, mormente nos casos em que é substituída a pena de suspensão de execução da pena de prisão por pena de prisão, imediatamente exequível. Acontece que a dimensão normativa em análise não comporta o elemento caracterizador essencial da fundamentação daquele aresto: a substituição em recurso de decisão absolutória por outra condenatória. Na verdade, não se está perante uma reversão de decisão absolutória, substituída pelo tribunal de recurso por decisão condenatória, no âmbito da qual, e por decorrência da declaração de culpabilidade e punibilidade do acusado, é apreciada e decidida pela primeira vez a questão da determinação da sanção. Esse elemento, central ao juízo formulado pelo Tribunal no referido Acórdão, não se encontra presente na dimensão normativa aqui em apreço, uma vez que, quer a 1.ª instância, quer o tribunal de recurso, pro- feriram decisões condenatórias, existindo dupla conforme decisória quanto à declaração de culpabilidade do arguido, o que significa que ambas as decisões conheceram da questão da determinação da sanção. E, ademais, a divergência decisória decorre da modificação do decidido relativamente a outras questões, seja quanto aos fundamentos de facto, por decorrência da procedência da impugnação em matéria de facto [artigo 431.º, alínea b) , do CPP], seja quanto aos fundamentos de direito, por via do juízo positivo formulado pela segunda instância relativamente aos pressupostos da reincidência, cujo efeito agravante conduziu o tribunal a quo a uma diferente ponderação das consequências jurídicas do crime, maxime quanto à espécie da pena aplicada: pena de suspensão da execução da prisão com a duração de cinco anos, imposta pela 1.ª instância, enquanto a relação decidiu pela condenação em pena de prisão (efetiva), com a mesma duração. Não são, então, transponíveis para a apreciação da dimensão normativa em apreço as ponderações inscritas no referido aresto em função da cognição pelo tribunal de recurso de questão não apreciada pela 1.ª instância. 10. Também não colhe o argumento de que o aqui recorrente não teve acesso à interposição e modelação de recurso sobre a sua condenação e que se vê prejudicado, nesse plano, pelo recurso interposto pelo Minis- tério Público – na expressão do recorrente, por aquele ter, entretanto, «esgotado todas as jurisdições possíveis no nosso ordenamento jurídico». Contrariamente que sucede em caso de decisão absolutória, em que não assiste ao arguido interesse em agir, o regime processual vigente não comporta restrição ao direito ao recurso sobre a decisão conde- natória proferida em 1.ª instância, que não se encontra limitado em função da sanção imposta, ou mesmo pela dispensa de pena (cfr. artigos 375.º, n.º 3, e 399.º do CPP). Naturalmente, a dimensão normativa pressupõe que o reexame seja pedido por outro sujeito processual, assumindo este interesse contraposto ao do arguido, no sentido do agravamento das consequências jurídicas antes impostas. Mas desse facto

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