TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020
137 acórdão n.º 104/20 Ou seja, atualmente, bem vistas as coisas e perante, por exemplo, uma condenação em pena não privativa da liberdade, seja ela qual for, admoestação, multa, trabalho a favor da comunidade, e perante, recurso para a relação interposto pelo MP (aliás um direito constitucionalmente garantido), e passar de multa para pena de prisão efetiva de 5 anos, já não pode recorrer, posto que o MP «lhe queimou» essa etapa de garantia de defesa, «incluindo o recurso», pelo 2.º grau de jurisdição. Salvo o devido respeito não nos parece que essa norma satisfaça na plenitude esses comando constitucionais, basta pensar o que interessava ao arguido o legislador «conceder-lhe» o triplo grau de jurisdição se fossem sempre utilizados pelo MP para «prender» efetivamente o arguido e depois de esgotadas essas fases e, consumado o propó- sito, já o mesmo não podia reagir. Daí, e apesar dos mui doutos argumentos da douta decisão sumária continuamos a propender para a incons- titucionalidade da mesma. Na verdade esta norma, nesta fase processual, conflitua de uma forma clara com o princípio da presunção da inocência e direito ao recurso da decisão, consagrado no artigo 32.º n.º 1 e 2 da nossa Lei Fundamental. Conflitua ainda com o subprincípio das garantias processuais e procedimentais ou no justo procedimento, aflorado em diversos preceitos da CRP, segundo o qual a todos é garantido um procedimento justo e adequado de acesso ao direito e de realização do direito. Do sub principio do Estado Constitucional ou da Constitucionalidade consagrado no art.º 3.º n.º 3 da CRP, segundo o qual e para além do mais, a validade das leis e demais atos do estado depende da sua conformidade com a constituição; Sub principio da independência dos tribunais e do acesso á justiça consagrado nos artigos 20.º e 205 e seguintes da CRP, segundo o qual, e para além do mais, a todos é garantido o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legítimos, incumbindo aos tribunais, na administração da justiça, a defesa desses mesmos direitos e interesses legalmente protegidos; Sub principio da prevalência da lei segundo o qual a lei deliberada e aprovada pelo Parlamento tem supe- rioridade e preferência relativamente a atos da administração que está proibida de praticar atos contrários à Lei Fundamental; Sub princípio da segurança jurídica e da confiança dos cidadãos que significa que o cidadão tem o direito de poder confiar que às decisões públicas relativo aos seus direitos serão aplicadas as normas legais vigentes e os respe- tivos efeitos, dentro dos limites da nossa Lei Fundamental.» 6. Por seu turno, o Ministério Público pronunciou-se pela improcedência da reclamação, entendendo que o recorrente não adianta novos fundamentos ou argumentos que justifiquem o prosseguimento dos autos, com a apresentação de alegações e o posterior pronunciamento pelo pleno da secção. Cumpre apreciar e decidir. II – Fundamentação 7. Vem o recorrente reclamar da decisão sumária, discordando do julgamento negativo de inconstitucio- nalidade nela proferido e, inerentemente, da orientação jurisprudencial seguida. Em suporte da pretendida reversão do sumariamente reclamado, argumenta essencialmente com a gravi- dade da pena privativa da liberdade, aplicada em recurso interposto por outro sujeito processual, convocando para tanto as ponderações inscritas no Acórdão n.º 595/18. Mais sustenta que se vê privado de recorrer dessa condenação em resultado do impulso deduzido pelo Ministério Público e que a norma questionada importa a sua indefesa perante o risco da alteração em recurso da pena imposta pela 1.ª instância, por fundamentos de facto e de direito que não podia antecipar nesse contexto.
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