TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 107.º Volume \ 2020

131 acórdão n.º 104/20 2. Para melhor compreensão, releva que o aqui recorrente/reclamante foi condenado em 1.ª instância, pela prática de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 2 anos e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, mediante regime de prova, e na pena acessória de proibição de contacto com a vítima. Apenas o Ministério Público interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, o qual, julgando procedente o recurso, decidiu alterar a decisão em matéria de facto relativamente aos antecedentes criminais do arguido, revogar a sentença recorrida na parte em que condenou o arguido como autor de um crime de violência doméstica e lhe impôs pena de prisão suspensa na sua execução, e condenar o arguido pela prática, como reincidente, de um crime de violência doméstica previsto e punido pelo artigo 152.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 2 anos e 6 meses de prisão (efetiva). O arguido não se conformou e recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça (STJ), peticionando a manutenção da medida punitiva em que fora condenado na primeira instância e invocando a verificação de «erro e má aplicação do direito» na aplicação de pena privativa da liberdade, em vez de pena de substituição. O STJ, por decisão singular do relator proferida em 6 de fevereiro de 2019, decidiu rejeitar o recurso, com os seguintes fundamentos: «A questão prévia que veio a ser suscitada é a de precisar se é admissível o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça face ao disposto na al. e) do n.º 1 do art. 400.º do CPP onde é estabelecida a irrecorribilidade dos acórdãos das relações proferidos em recurso que hajam aplicado pena não privativa da liberdade ou pena de prisão não supe- rior a 5 anos, como é o caso dos autos. A atual redação da norma foi introduzida pela Lei n.º 20/2013, de 21 de Fevereiro, no seguimento da jurispru- dência fixada [no acórdão de fixação de jurisprudência n.º 14/2013] no domínio da Lei n.º 48/2007 no sentido de ser irrecorrível a decisão da relação que revogando a suspensão da pena fixada pela 1.ª instância aplicasse ao arguido pena de prisão não superior a 5 anos. A situação agora em apreço difere de modo essencial daquela outra que deu origem à declaração de inconstitu- cionalidade lavrada inicialmente no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 429/16 e que, com força obrigatória geral, veio a ser sufragada no Acórdão n.º 595/18. Aí, colocava-se a questão da irrecorribilidade do acórdão da relação que inovatoriamente, face à decisão de absolvição proferida em primeira instância, condenasse o arguido a pena de prisão efetiva não superior a 5 anos. Não é o caso. Em situações como a presente, ou seja, em que o arguido é condenado em pena de prisão com a respetiva execução suspensa, por conseguinte, numa pena de substituição e em que essa pena é alterada – em que se decide somente não haver lugar à substituição – mercê do recurso interposto pelo Ministério Público, o Tribunal Consti- tucional vem reiteradamente afirmando não ser inconstitucional a mencionada alínea e) do n.º 1 do art. 400.º do CPP interpretada no sentido de, em tal caso, não ser admissível recurso para o STJ. Assim sucedeu mormente nos Acórdãos 101/18, 243/18 e 476/18. Na verdade, do que se tratou não foi de reverter uma decisão absolutória numa decisão condenatória mas somente [de] modificar a espécie da pena derivando essa modificação de uma alteração da matéria de facto. Em relação a ambas – alteração da matéria de facto e reapreciação das consequências do crime ao nível da modificação da espécie da pena – teve o recorrente a oportunidade de assegurar os seus direitos de defesa designa- damente quando lhe foi conferida a oportunidade de, ao abrigo do art. 413.º, n.º 1 CPP, contrariar com os seus argumentos a proposta do recurso interposto pelo Ministério Público. O que vai de encontro à necessidade de salvaguarda da intervenção do tribunal que ocupa o [topo] da hierar- quia da organização judiciária para os casos de maior merecimento penal, como vem sendo frisado pela doutrina e pela jurisprudência.» O recorrente deduziu reclamação para a conferência do STJ, o qual, por acórdão de 28 de março de 2019, decidiu confirmar na íntegra o sumariamente decidido.

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