TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019
99 acórdão n.º 464/19 Quanto aos critérios, a lei exige (artigo 6.º) que o acesso seja adequado, necessário e proporcional em cada caso concreto – ou seja, que a diligência não se mostre excessiva, atentas todas as circunstâncias rele vantes –, densificando esta exigência através do requisito de que a informação obtida diga respeito a um alvo ou um intermediário determinados (exigência de individuação) e de que seja impossível ou muito difícil obter a informação de outra forma ou em tempo útil (exigência de necessidade). O artigo 10.º, n.º 1, esta- belece ainda que o acesso não compreende «todos os dados», mas apenas as «categorias de dados» que a dili gência reclamar (exigência de restrição), ressalvando-se as «condições de proteção do segredo profissional». Relativamente à forma, a lei determina que o acesso aos dados pelos oficiais de informações do SIS e do SIED seja objeto de autorização judicial «por uma formação das secções criminais do Supremo Tribunal de Justiça, constituída pelos presidentes das secções e por um juiz designado pelo Conselho Superior da Magis tratura, de entre os mais antigos destas secções» (artigos 5.º e 8.º). O processo inicia-se com um pedido dos oficiais de informações sujeito a determinadas exigências de conteúdo (artigo 9.º), o qual é objeto de apreciação judicial fundamentada num prazo de 48 horas (artigo 10.º, n.º 3). Ainda que se entenda que esta formação, na prática, funciona, não como um tribunal, mas como uma entidade administrativa, tal entendimento não muda o equilíbrio de interesses constitucionalmente exigido entre a proteção da vida privada e os poderes-deveres do Estado na prevenção do terrorismo, pois nos termos do artigo 35.º, n.º 2, da Constituição, é suficiente que a garantia da proteção destes direitos seja levada a cabo por uma entidade independente. No que concerne aos limites, destaca-se a proibição, contida no n.º 2 do artigo 6.º, de «interconexão em tempo real com as bases de dados dos operadores de telecomunicações e Internet para o acesso direto em linha aos dados requeridos» Significa isto que é permitido o acesso pelos oficiais de informações do SIS e do SIED apenas aos dados previamente armazenados pelos operadores de telecomunicações, como decorre da definição do objeto que consta do artigo 1.º, n.º 1. Finalmente, quanto a garantias, para além da exigência de autorização judicial, a lei atribui à forma- ção do Supremo Tribunal de Justiça competente para autorizar o acesso o poder de «determinar a todo o momento o cancelamento de procedimentos em curso de acesso a dados…obtidos de forma ilegal ou abusiva», que «violem o âmbito da autorização judicial prévia» ou que sejam «manifestamente estranhos ao processo» (artigo 12.º, n.º 3). Atribui a uma Comissão de Fiscalização de Dados do SIRP a competência para fiscalizar a atividade dos oficiais de informações, com o fito de garantir o «respeito pelos princípios e cumpri- mento das regras relativos à qualidade e à salvaguarda da confidencialidade e da segurança dos dados obtidos» (artigo 15.º, n.º 1). Reconhece ainda poderes de fiscalização, neste domínio, ao Conselho de Fiscalização do SIRP (artigo 16.º). Por fim, o artigo 7.º prevê o agravamento das penas abstratamente aplicáveis aos vários tipos de crime que possam estar implicados no acesso ilegal a dados pessoais. Todas estas medidas procuram assegurar a salvaguarda de uma esfera fundamentalíssima de privacidade e de autodeterminação informativa, limitando ao mínimo indispensável a ingerência estadual. O acesso aos dados previstos e com os objetivos fixados no artigo 3.º da Lei Orgânica n.º 4/2017, difi- cilmente pode ser censurado no plano da adequação e da necessidade. Por um lado, é óbvio que a medida é um meio idóneo de produção de informações que se venham a revelar úteis na prevenção dos atos e na tutela dos interesses mencionados na lei. Por outro lado, não há evidência alguma de que existam meios menos lesivos que permitam, com igual eficácia, alcançar os objetivos a que o regime se destina, tanto mais que a lei faz depender a autorização de acesso e a sua manutenção da verificação da necessidade da diligência. É na proporcionalidade em sentido estrito que se joga a conformidade constitucional da norma. Colo- cam-se aqui duas questões essenciais. A primeira é a de saber se um regime de acesso a «dados de base e de localização de equipamento» pelos oficiais de informações do SIRP, com o efeito inibidor da autodetermina- ção informativa dos cidadãos e com o risco de abuso da privacidade pessoal que a mera existência de um tal regime inevitavelmente implica, reprova no teste da proporcionalidade. Entendendo-se que não, surge-nos uma segunda questão: a de saber se o regime estabelecido na Lei Orgânica n.º 4/2017 limita o acesso aos dados pessoais a que respeita o seu artigo 3.º aos casos concretos em que, tudo visto e ponderado, tal acesso
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