TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019
86 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL dados de tráfego ora em análise que justifique uma apreciação distinta da realizada pelo Tribunal Constitu- cional no Acórdão n.º 403/15. No fundo, trata-se de questionar se as alterações introduzidas no sistema de acesso pela Lei Orgânica n.º 4/2017 apresentam diferenças de tal forma significativas em relação às normas anteriormente analisadas por este Tribunal, que o aproximem, de forma decisiva, do processo penal, fundamentando uma mudança quanto ao juízo de constitucionalidade. 11.1.1. O acesso dos oficiais de informações do SIS e do SIED aos metadados, incluindo os dados de tráfego, à luz da Lei Orgânica n.º 4/2017, está sujeito a vários pressupostos de admissibilidade: a) Em primeiro lugar, e desde logo, o respeito pelo princípio da proporcionalidade, em sentido lato, incluindo as dimensões de necessidade, adequação e proporcionalidade em sentido estrito. Esta exigência reflete-se na obrigatoriedade de fundamentação adequada do pedido de acesso aos dados (artigos 5.º e 6.º da Lei Orgânica n.º 4/2017); b) Em segundo lugar, nos termos do n.º 2 do artigo 6.º da Lei Orgânica mencionada, a proibição de interconexão de dados em tempo real; c) Em terceiro lugar, a existência de uma autorização prévia de acesso, para a qual é competente uma formação das secções criminais do Supremo Tribunal de Justiça, constituída pelos presidentes das secções e por um juiz designado pelo Conselho Superior da Magistratura, de entre os mais antigos destas secções (artigo 8.º). A decisão de concessão ou de denegação da autorização deve ser também fundamentada com base em informações claras e completas, nomeadamente quanto aos objetivos do processamento (n.º 3 do artigo 10.º). d) Por último, a colocação em prática de um sistema de controlo permanente, tanto interno como externo, designadamente, para assegurar tanto a atualidade dos dados, quanto o cancelamento dos procedimentos de acesso e a destruição dos dados obtidos de forma ilegal, para além do âmbito da autorização previamente concedida, ou que não importem para o processo. Neste sistema de auto- rização e controlo intervêm juízes conselheiros do Supremo Tribunal de Justiça, o Procurador-Geral da República, a Comissão de Fiscalização de dados do SIRP e o Conselho de Fiscalização do SIRP, respetivamente, nos termos dos artigos 4.º a 11.º, 14.º e 15.º da Lei Orgânica n.º 4/2017. Desta forma, no fundo, e como já se tinha explicado, as normas em causa parecem procurar responder às objeções de natureza jurídico-constitucional anteriormente colocadas, promovendo a intervenção obrigatória de uma autoridade composta por magistrados judiciais e um sistema de controlo que permita enquadrar e limitar a atividade dos serviços de informações nesta matéria. Assim, e tendo em mente tudo o que até agora se afirmou, o que cabe questionar é se, neste caso, pode considerar-se que a intervenção de juízes e a existência de mecanismos de controlo do acesso aos dados de tráfego podem ter-se por materialmente equivalentes aos que caracterizam uma estrutura processual penal num Estado de Direito democrático, nos termos exigidos inequivocamente pela Constituição. Ora, pode, desde já, adiantar-se que a resposta a essa pergunta não pode deixar de ser negativa, por distintas razões. 11.1.2. Em primeiro lugar, é de recordar, nesta sede, o que este Tribunal afirmou, no Acórdão n.º 403/15, acerca da caracterização o SIRP: “os fins e interesses que a lei incumbe ao SIRP de prosseguir, os poderes funcionais que confere ao seu pessoal e os procedimentos de atuação e de controlo que estabelece, colocam o acesso aos dados de tráfego fora do âmbito da investigação criminal”, pelo que “a caracterização dessa concreta atividade como recolha de “informações” para efeitos de “prevenção” dissocia-a, de forma clara e precisa, da atividade própria de investigação criminal” (cfr. o respetivo ponto 19). Desta forma, e apesar das mudanças operadas no sistema de acesso aos dados de tráfego, em relação ao que se previa nas normas fiscalizadas no Acórdão n.º 403/15, não pode deixar de se considerar que, também
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