TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019

326 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Administração Regional, assume específica relevância no quadro do regime e âmbito da função pública e dos direitos constitucionais referentes à liberdade de profissão e acesso à função pública. Na delimitação do âmbito da matéria reservada nos termos da alínea d) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição, adverte Ana Fernanda Neves que «o regime jurídico disciplinar, no entanto, enquanto parte do regime jurídico da função pública, não deixa de estar abrangido pela reserva parlamentar das respetivas bases (…), para além de certas infracções disciplinares poderem ser causa da cessação da relação jurídica de emprego público [alíneas t) e b) do n.º 1 do artigo 165.º da CRP] e afectarem a esfera dos direitos, liberdades e garantias dos indivíduos ( v. g. como o direito de acesso à função pública, o direito de segurança no emprego, o direito à greve) (…). Nesta medida, a reserva, ainda que a nível dos princípios, vai um pouco mais além do regime geral da punição das infracções disciplinares.» (cfr. O Direito Disciplinar da Função Pública , vol. II, Universidade de Lisboa, Facul­ dade de Direito, Lisboa, 2007, pp. 135-136, consultado em http://hdl.handle.net/10451/164 ) . 14. Passa-se, assim, a analisar a norma regional desaplicada nos presentes autos atento o enquadramento constitucional da distribuição competencial das matérias entre os órgãos político-legislativos da República e das Regiões Autónomas, avaliando-se, em seguida, do respeito pelo âmbito das reservas materiais de com- petência legislativa parlamentar, de modo a aferir da ocorrência de eventuais vícios orgânicos determinados pela aplicação das regras constitucionais relevantes. A apreciação de vícios de inconstitucionalidade orgânica – questionando-se da eventual invasão de com- petência legislativa reservada da Assembleia da República – convoca o regime constitucional que disciplina a reserva de competência legislativa dos órgãos de soberania e, assim, também as matérias reservadas à com- petência daqueles órgãos, em especial a Assembleia da República nos termos dos artigos 161.º, 164.º (reserva absoluta) e 165.º (reserva relativa) da Constituição, enquanto limite negativo ao poder legislativo das regiões autónomas. Com efeito, sendo o poder legislativo expressão da autonomia regional, o exercício da competência legislativa pelas regiões autónomas (no âmbito regional e em matérias enunciadas nos estatutos político-admin- istrativos respetivos) encontra-se delimitado negativamente já que não pode incidir sobre matérias que estejam reservadas aos órgãos de soberania [artigos 227.º, n.º 1, alínea a), e 228.º, n.º 1, da Constituição], sob pena de inconstitucionalidade. E, no que respeita à matéria de reserva relativa da Assembleia da República, as regiões autónomas apenas poderão legislar mediante autorização da Assembleia da República, com exceção das matérias de reserva relativa da Assembleia da República elencadas na alínea b) do n.º 1 do artigo 227.º da Constituição. O poder legislativo das Regiões Autónomas – competência cometida às respetivas Assembleias Legis- lativas – recortado a partir da conjugação dos artigos 112.º, n. os 1, 4 e 5, 227.º, 228.º e 232.º, n.º 1, da Constituição, é assim balizado na Constituição da República Portuguesa por referência aos limites positivos do âmbito regional e da relação com as matérias enunciadas nos respetivos estatutos político-administrativos e ao limite negativo da reserva de competência dos órgãos de soberania. Este limite negativo encontra uma atenuação no poder definido na alínea b) do n.º 1 do artigo 227.º da Constituição, norma que habilita as regiões autónomas a legislar em matérias da reserva relativa da Assembleia da República (elencadas no n.º 1 do artigo 165.º), mediante autorização desta, com exceção das previstas nas alíneas a) a c) , na primeira parte da alínea d) , nas alíneas f ) e i) , na segunda parte da alínea m) e nas alíneas o) , p) , q) , s) , t) , v) , x) e aa) do n.º 1 do artigo 165.º. Neste quadro, há que determinar se a matéria sobre que incide a norma contida no artigo 194.º, n.º 1, do Estatuto da Carreira Docente/Açores, com o sentido e alcance acima delimitados, se pode incluir [para efeitos do disposto no artigo 227.º, n.º 1, alínea a) , parte final, da Constituição] no âmbito da reserva de competên- cia legislativa da Assembleia da República prevista nos artigos 164.º e 165.º, n.º 1, da Constituição quanto às matérias acima referidas, de modo a aferir-se do respeito pelo limite negativo de competência acima assinalado que veda o poder legislativo regional nas matérias reservadas à competência dos órgãos de soberania. 15. A norma em crise consta do artigo 194.º do Estatuto da Carreira Docente/Açores, regime que con- sagra o seu Capítulo XIX ao «Regime disciplinar». Deste Capítulo XIX do Estatuto da Carreira Docente/

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