TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019
325 acórdão n.º 502/19 respetivos órgãos de governo próprio», o que, mesmo neste enunciado contido, revela abertura à intervenção do legislador regional em matéria estatutária do pessoal docente, em face das especificidades da Região. 13.1. É certo que a Constituição, no seu artigo 164.º, alínea i) , reserva em absoluto à Assembleia da República a definição das bases do sistema de ensino, deixando, no entanto, à normação governamental ou regional o desenvolvimento dos princípios ou das bases gerais dos regimes contidos em leis que a eles se circunscrevam [artigo 198.º, n.º 1, alínea c), e 227.º, n.º 1, alínea c) , da Constituição]. A Constituição não contém uma definição do que sejam as bases ou bases gerais de certa e determinada matéria. Quanto às bases do sistema de ensino, a jurisprudência constitucional tem-lhes feito corresponder as opções fundamentais, os princípios retores e a definição dos direitos fundamentais relevantes no âmbito do sistema educativo. Pode ler-se no Acórdão n.º 184/08: «Como se disse, por exemplo, nos Acórdãos n.º 38/84, n.º 125/00 e n.º 262/06 (publicados em Acórdãos do Tribunal Constitucional , Vol. 3.º, pp. 75 e ss., Vol. 46.º, pp. 489 e ss., e Vol. 64.º, pp. 43 e ss., respectivamente), consideram-se bases do sistema de ensino as opções fundamentais e a disciplina básica dos princípios e direitos constitucionais relativos ao ensino, designadamente, a liberdade de ensino, o direito ao ensino, o estatuto das uni- versidades e o direito de participação no ensino.» Ora, a matéria disciplinada na norma legal sub judice não consubstancia uma opção fundamental do sistema de ensino, não corresponde a uma diretriz desse sistema, tão pouco regula os direitos fundamentais relativos ao ensino ou os princípios (e objetivos) prosseguidos pelo sistema de ensino, não integrando, assim, qualquer base do sistema educativo cuja disciplina se mostra reservada à intervenção parlamentar, de acordo com o citado artigo 164.º, alínea i), da Constituição. No entanto, em bom rigor, a matéria regulada na norma sindicada também não corresponde a qualquer desenvolvimento da Lei de Bases do Sistema Educativo. Da leitura da Lei de Bases do Sistema Educativo (Lei n.º 46/86, de 14 de outubro, sucessivamente alterada pelas Leis n. os 115/97, de 19 de setembro, 49/2005, de 30 de agosto e 85/2009, de 27 de agosto) resulta que nenhuma disposição desta lei enquadra ou regula o regime disciplinar dos docentes, os tipos de sanções aplicáveis ou os efeitos das penas correspondentes. O mesmo se diga quanto às condições de acesso dos docentes ao ensino público por via da constituição de relações de emprego público ou a respetiva restrição (o que não se confunde com o estabelecimento de requi- sitos, designadamente de formação académica, com vista à qualificação profissional necessária ao exercício da profissão docente, como os previstos no artigo 34.º da referida Lei de Bases). 13.2. Mesmo não respeitando diretamente ao setor educativo, afigura-se que a matéria regulada no artigo 194.º, n.º 1 do Estatuto da Carreira Docente/Açores – no segmento normativo delimitado como objeto do presente recurso –, dispondo-se inovatoriamente no âmbito do regime sancionatório aplicável a docentes contratados do ensino público na região autónoma, com consequências no acesso a novo vínculo de emprego público pelo período de três anos, se encontra na confluência de duas temáticas relativamente às quais o legislador constitucional criou uma reserva de competência legislativa da Assembleia da República: o estatuto (disciplinar) da função pública e o regime dos direitos, liberdades e garantias [cf. artigo 165.º, n.º 1, respetivamente, alíneas t) e b) , CRP]. Isto, mesmo tendo-se presente que se, prima facie , a matéria disciplinar – como a regulada pelo artigo 194.º, n.º 1, do Estatuto da Carreira Docente/Açores no segmento normativo posto em crise – poderia con- vocar a reserva de competência legislativa da Assembleia da República prevista no artigo 165.º, n.º 1, alínea d) , da Constituição em matéria do regime geral de punição das infrações disciplinares, deve ter-se em conta que a norma em apreciação, estabelecendo uma (nova) consequência da aplicação da sanção disciplinar de suspensão a docentes com contrato de trabalho em funções públicas a termo resolutivo que se repercute no acesso a novo contrato para o exercício da profissão docente em estabelecimentos de ensino ou educação da
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