TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019
156 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL pelos oficiais do SIS e do SIED) e o regime de recolha de prova através dos métodos ocultos de obtenção de prova que têm lugar na fase de investigação prévia à constituição de arguido em inquérito criminal. Ora, cabe dentro do âmbito da autorização constitucional de restrição do direito fundamental à inviolabilidade das comunicações, prevista no artigo 34.º, n.º 4, da Constituição, um regime preventivo paralelo ao pro- cesso penal, o qual, inserindo-se no âmbito da prevenção de crimes graves, assegura garantias que oferecem o mesmo nível de exigência e eficácia das que existem naquele processo. Consequentemente, votei a não inconstitucionalidade da norma. A discordância relativamente a esta conclusão do Acórdão reflete-se inevitavelmente nos demais pontos da fundamentação e da decisão. Com efeito, considerando assente que nos encontramos dentro do âmbito da autorização constitucional para restringir o sigilo das telecomunicações, para efeitos de prevenção de criminalidade grave e organizada, ponderando os direitos e valores constitucionais em confronto, entendo não merecer a menor dúvida que a medida prevista no artigo 4.º da Lei Orgânica respeita os testes do princípio da proporcionalidade impostos pelo artigo 18.º da Constituição (adequação, necessidade e proibição do excesso). Nesta ponderação releva a circunstância de as informações visadas não poderem abranger dados de conteúdo e restringirem-se a dados pretéritos. 10. O juízo de respeito pelo princípio da proporcionalidade referente aos dados gerados no âmbito de comunicações intersubjetivas não pode deixar de estender-se aos dados de tráfego de Internet gerados fora do âmbito daquelas comunicações, bem como – por maioria de razão – aos dados de base e localização. É, portanto, de concluir também pelo respeito do princípio da proporcionalidade da restrição que o acesso a estes dados gera do direito à autodeterminação informativa. Efetivamente, como se salientou no Acórdão n.º 403/15 (ponto 16) «o tipo de restrições ao direito à inviolabilidade das comunicações que é admitido pelo n.º 4 do artigo 34.º da CRP é muito mais exigente do que as restrições toleradas por outros direitos fundamentais em que se protegem os mesmos bens jurídicos (dignidade da pessoa, desenvolvimento da per- sonalidade, garantia da privacidade, autodeterminação comunicativa)». No entanto, surpreendentemente, o presente Acórdão veio, porém, considerar que «a intensidade de escrutínio exigida, apesar da diferença dos parâmetros constitucionais em causa, não pode deixar de ser similar ou equivalente» (ponto 11.2.1.). Não consigo compreender como se pode considerar a intensidade de escrutínio equivalente, face ao afirmado carácter «muito mais exigente» do n.º 4 do artigo 34.º da CRP. Esta nova tese, além de incompreensível, revela-se ainda dificilmente conciliável com a ideia anteriormente expressa de que apenas no que respeita à inviolabilidade das comunicações garantida no artigo 34.º, n.º 4, o legislador constitucional resolveu explicitamente o sentido no qual devem ser resolvidas as eventuais colisões entre os valores constitucionalmente protegidos por reconhecer que só em matéria de processo penal vale uma preferência abstrata pelo valor da segurança em prejuízo da privacidade das comunicações (ponto 9.2.). Se – como pretende o Acórdão – as dimensões da privacidade e da proteção de dados pessoais dos utilizadores eventualmente em causa não têm menor merecimento constitucional do que aquelas que também podem ser lesadas no âmbito das comunicações, por que razão a Constituição as distinguiria? 11. Resta referir que, numa interpretação sistemática e integrada da Lei Orgânica, as referências à “defesa nacional” e à “segurança interna” constantes do seu artigo 3.º não têm de ser consideradas como fins inscritos na norma, a par da prevenção de atos que de seguida o preceito identifica por referência a tipos de ilícito penal, mas antes como a limitação do acesso aos dados para a prevenção daqueles crimes ao âmbito das atribuições dos Serviços de Informações definidas por lei. De acordo com esta interpretação, nenhum problema de constitucionalidade colocaria também esta norma. Os problemas de inconstitucionalidade identificados no Acórdão no que respeita ao artigo 3.º pressupõem a recondução das atribuições dos Serviços a fins autónomos que podem justificar o acesso a dados de base e localização o que, todavia, não me parece
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