TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 106.º Volume \ 2019
141 acórdão n.º 464/19 condicionalismos estabelecidos no direito do caso do TJUE estão salvaguardados na adjetivação estabelecida na LO 4/2017; e isto sem embargo de todos esses condicionalismos terem sido estabelecidos num contexto diame tralmente oposto ao aqui em causa – na sua essência (que o caso Ministerio Fiscal , aludido na nota 26, supra , aliás, intui por uma espécie de redução teleológica) referem-se essas decisões a transferências de dados em massa das bases das operadoras para os serviços de informações, ou visando propiciar um acesso direto a essas bases, tudo consequências que a LO 4/2017 expressamente afasta. A inconstitucionalidade (afirmada pela maioria) do artigo 4.º da LO 4/2017 3. O Tribunal, na alínea c) do dispositivo, declarando a inconstitucionalidade do artigo 4.º da LM, inviabilizou o acesso dos serviços de informações a dados de tráfego. Esse pronunciamento decisório diferen- cia, na indicação dos parâmetros de desconformidade constitucional, a existência, ou não, de uma comuni- cação intersubjetiva, reportando a violação do artigo 34.º, n.º 4, da CRP, aos casos envolvendo esse circuns tancialismo, e a violação dos artigos 26.º, n.º 1, e 35.º, n. os 1 e 4, por via do artigo 18.º, n.º 2, todos da CRP, às situações que não pressupõem comunicação intersubjetiva. Constituem os dados de tráfego – e estamos sempre a pressupor as definições constantes da LM – um subgrupo dentro do grupo geral formado pelos “dados de telecomunicações” e pelos “dados de internet ” [artigo 2.º, n.º 1, alíneas a) e b) , da LM]. Estes, agregados, correspondem aos “[…] dados previamente arma- zenados pelos prestadores de serviços de comunicações eletrónicas […]” cujo acesso pelos serviços de infor- mações a LO 4/2017 permite e regula (cfr. o respetivo artigo 1.º, n.º 1), sendo diferenciados no artigo 2.º, n.º 2, alíneas a) , b) e c) , da mesma Lei, em vista da respetiva recondução à permissão de acesso do artigo 3.º (relativa a dados de base e de localização de equipamento) ou do artigo 4.º (respeitante a dados de tráfego), com distintas condições de acesso num e noutro caso. Vale isto por dizer, centrando-nos nos dados de tráfego – “[…] os dados tratados para efeitos do envio de uma comunicação através de uma rede de comunicações eletrónicas ou no âmbito de um serviço de telecomunicações, ou para efeitos da faturação da mesma” [artigo 2.º, n.º 2, alínea c) , da LM –, que estes incluem “dados de telecomunicações” e “dados de Internet ”. Independentemente da distinção criada pelo Tribunal entre dados de tráfego que envolvem, ou não, comunicação intersubjetiva, correspondendo ao meu entendimento que o artigo 34.º, n.º 4, da CRP, no seu trecho final limitativo – “[aos] casos previstos na lei em matéria de processo criminal” –, não é incompatível com o acesso dos serviços de informações ao tipo de dados de tráfego em qualquer caso visados no artigo 4.º da LO 4/2017, concretamente nas condições estabelecidas neste Diploma, apreciarei essa questão à margem da distinção introduzida pelo Tribunal [28]. Claro que, ultrapassada a questão do artigo 34.º, n.º 4, da CRP, que constituiu o elemento central da argumentação do Tribunal em 2015, surge, na indagação de conformidade constitucional do artigo 4.º da LO 4/2017, a necessidade de levar a cabo um controlo de proporcionalidade (artigo 18.º, n.º 2, da CRP) [28] Todavia, admitindo que a distinção introduzida pelo Tribunal se refere a alguma ambiguidade significativa presente no elemento dinâmico dos dados de internet (cfr. pontos 11.2 e 11.2.1. do Acórdão), parece-me evidente – abordando o exemplo intuitivamente em causa relativamente à internet – que uma listagem dos sites visitados por alguém, é tão desafiante, relativamente à ideia de autodeterminação informacional e de proteção da privacidade, como o conhecimento dos números de telemóvel para os quais alguém ligou ou dos quais recebeu comunicações. Considero, pois, que qualquer permissão de acesso a listagens de sites visitados – mesmo que assente num relacionamento comunicacional unilateral – traduz-se, como claramente decorre da LM, na obtenção de dados de tráfego e, em função do seu especial potencial disruptor da privacidade, deve ser objeto de um rigoroso controlo de pertinência ao enquadramento temático motivador da pretensão de acesso. Ora, é evidente – é mesmo ostensivo – que a LM faz incidir sobre as pretensões de acesso a dados por parte dos serviços de infor- mações mecanismos adjetivos e critérios substanciais de controlo (pela formação judicial autorizante) suficientemente densos, exigentes e, considerando globalmente os diplomas do SIRP, suficientemente diversificados, através da atuação de várias estru- turas independentes de fiscalização, para podermos afirmar que existe, em tal contexto, uma exigentíssima filtragem do acesso.
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