TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 105.º Volume \ 2019
87 acórdão n.º 269/19 Não é outro, com efeito, o sentido atribuível à argumentação expendida, entre outras, sob conclusões 30 e 54 das alegações apresentadas: apesar de reiterar o que pressupusera já no requerimento de interposição do recurso – isto é, que a norma constante do artigo 1087.º do Código Civil fora objeto de uma interpretação declarativa no acórdão recorrido –, a recorrente acaba por concluir ali que daquele preceito legal foi extraída, afinal, pelo tribunal a quo a interpretação segundo a qual «o único prazo possível para a desocupação do locado é de um mês» ou, numa outra formulação, «no sentido de que o prazo de desocupação do locado é necessariamente, um mês». Ora, ao enunciar no requerimento de interposição de recurso a norma ou interpretação normativa cuja constitucionalidade pretende ver apreciada, o recorrente delimita, em termos definitivos, o objeto do recurso, não lhe sendo lícito expandi-lo (mas apenas comprimi-lo) nas alegações produzidas (cfr., entre muitos, o Acórdão n.º 512/06). Quer isto significar que o recorrente se encontra impedido de sindicar, no âmbito das alegações, norma ou interpretação normativa diversa da especificada no requerimento de inter- posição do recurso, especialmente se o critério normativo que enuncia, para além de inovador, não encontrar na decisão recorrida a menor correspondência. É também isso que sucede no caso presente. Ao invés do que sustenta a recorrente, o Tribunal da Relação do Porto não considerou que, perante o disposto no artigo 1087.º do Código Civil, o único prazo possível para a desocupação do locado em conse- quência da cessação do contrato de arrendamento era de um mês. Concluiu, sim, que as circunstâncias ale- gadas pela ora recorrente seriam sempre inidóneas ou insuficientes para justificar a reversão da sentença então recorrida e, consequentemente, a fixação judicial de prazo diverso daquele que se encontra supletivamente estabelecido no referido preceito legal. Ao pretender discutir o acerto da decisão recorrida quanto ao concreto prazo fixado para a entrega do imóvel, a recorrente não só amplia indevidamente o objeto do recurso, tal como definido no respetivo requerimento de interposição, como passa a incluir nele a pretensão de certo tipo de sindicância que, por incidir diretamente sobre o resultado da atividade ponderativa própria das instâncias, o presente recurso não acomoda por força da natureza estritamente normativa do nosso sistema de fiscalização concreta da consti- tucionalidade. 9. Acresce ainda que a recorrente, apesar de ter indicado, no requerimento de interposição do recurso, apenas o artigo 65.º da Constituição como parâmetro a considerar, procede, em determinados segmentos das alegações apresentadas, à invocação do princípio da segurança jurídica, extraível do artigo 2.º da Lei Funda- mental, cuja violação, além do mais, perspetiva a partir do facto, que reconhece não ter ficado demonstrado, de o contrato de arrendamento que lhe conferiu o direito à ocupação do locado ter sido celebrado há mais de 30 anos. É o que resulta, em especial, dos argumentos articulados sob as conclusões 37, 41 e 50 da peça que apresentou. Conforme referido já, constitui entendimento reiteradamente expresso por este Tribunal que, ao iden- tificar, no requerimento de interposição de recurso, a questão de constitucionalidade que pretende ver apre- ciada, o recorrente delimita, em termos definitivos, o respetivo objeto, não lhe sendo consentido ampliá- lo (mas apenas restringi-lo) em momento ulterior, mormente nas alegações produzidas (cfr., Acórdãos n. os 487/08 e 283/14). Encontrando-se o recorrente impedido de proceder, em sede de alegações, à reconfiguração ou à amplia- ção do objeto do recurso, parece seguro que, pelo menos nos casos em que a substituição do parâmetro previamente invocado – ou a convocação de um outro, distinto daquele – implique a “descaracterização da questão de constitucionalidade”, tal como definida no requerimento de interposição do recurso, – “ou lhe adicione uma outra, de diferente natureza” –, o recurso não poderá ser nessa parte considerado “por incidir sobre questão diversa” daquela com que foi delimitado o respetivo objeto (neste sentido, Acórdão n.º 698/16).
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