TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 105.º Volume \ 2019

83 acórdão n.º 269/19 9. Ora, também este facto (a recorrente tem uma condição social e económica débil, é divorciada e tem 59 anos de idade), era imediatamente apreensível pelo tribunal recorrido, considerando a documentação de concessão do benefício de apoio judiciário junta nos autos, e essencial para a aplicação ponderada do disposto no art.º 1087.º do Código Civil. 10. Igualmente o mesmo foi, inexplicavelmente ignorado pelo tribunal da 1.ª instância, repetindo-se tal erro no tribunal recorrido, não obstante a condição pessoal da despejada ser um fator a ponderar na fixação do prazo de despejo do arrendado, como adiante se demonstrará. 11. Qualquer dos dois factos que abaixo se sistematizam, eram do conhecimento do tribunal recorrido (bem como do tribunal da 1.ª instância) os quais tinham, aliás, o dever de sobre os mesmos se pronunciarem, indepen- dentemente de alegação, como resulta das disposições conjugadas dos art. os 411.º, 412.º n.º 2 e 413.º, todos do Código de Processo Civil: – O acordo verbal entre autores e ré foi celebrado em meados dos anos 80, sendo assim a ré arrendatária da men- cionada habitação há mais de 30 anos; – A ré tem uma condição cultural, social e económica débil, é divorciada e tem 59 anos de idade; 12. É obrigação do juiz realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apu- ramento da verdade e à justa composição do litígio, não carecem de alegação os factos de que o tribunal tem conhecimento pelo exercício das suas funções, e o tribunal deve tomar em consideração todas as provas produzidas. 13. Conhecimento que neste caso é também da faculdade, competência e obrigação de V. Excelências, Senhores Con- selheiros do Tribunal Constitucional. 14. A recorrente, de baixa condição económica e social, e a residir no arrendado há mais de 30 anos, tinha como certo e adquirido que, continuando a pagar as rendas devidas, como sempre fizera, teria assegurada até ao fim da sua vida a habitação no locado. 15. Verdade que entrou em mora quanto às rendas de agosto, setembro e outubro de 2016. Verdade igualmente que a recorrente procedeu no prazo legal ao depósito dessas rendas em mora. 16. Mas afinal porque foi resolvido o contrato de arrendamento e decretado o despejo? Porque ao depositar as rendas em mora a recorrente não depositou a indemnização prevista no art.º 1041.º n.º 1 do Código Civil, ou seja, 50% do valor de cada uma das rendas em dívida. 17. Contudo, a ré/recorrente quando procedeu ao depósito das rendas em mora não procedeu ao imediato depósito da respetiva indemnização, porque os autores não o pediram, limitando o seu pedido à resolução do contrato de arrenda- mento, à condenação da ré no despejo e no pagamento das rendas e juros vencidos, no montante total de 186,54 € , bem como, no pagamento das rendas e juros vincendos até integral e efetivo despejo. 18. Apenas em sede de resposta à contestação, vieram os autores alegar que, depositadas as rendas vencidas, não tinha sido depositada a indemnização prevista no art.º 1041.º n.º 1 do Código Civil. 19. Todavia, esta tardia invocação não tinha a virtualidade de alterar nem ampliar o pedido formulado na petição inicial, e, por isso, é obrigatório concluir que o tribunal recorrido e o tribunal de 1.ª instância violaram os limites da condenação tal como previsto nos art. os 608.º n.º 2 e 609.º n.º 1, ambos do Código de Processo Civil. 20. A condenação “extra vel ultra petitum” está condicionada ao prévio cumprimento do contraditório, con- cedendo-se à parte com aquela possivelmente prejudicada a possibilidade prática para alegar o que sobre a matéria entender conveniente à defesa dos seus interesses, ou praticar os atos que para o mesmo efeito sejam os adequados. 21. Porque, efetuado o pedido e citado o réu, ficam reunidos os requisitos que obrigam ao cumprimento do princípio da estabilidade da instância, nos exatos termos das disposições conjugadas dos art. os 260.º e 564.º, al. b) , do Código de Processo Civil. 22. Mas mesmo que se entenda que, no caso dos autos, os autores mantinham o direito de pedir o despejo da ré, por não ter sido depositada a indemnização não pedida, ou seja, mesmo admitindo que o pedido de pagamento da indemnização apenas formulado na resposta dos autores, é uma ampliação legítima e admissível por se tratar de um desenvolvimento ou consequência do pedido primitivo – art.º 265.º n.º 2, do Código de Processo Civil, sempre

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=