TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 105.º Volume \ 2019

81 acórdão n.º 269/19 Acordam na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional: I – Relatório 1. No âmbito dos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação do Porto, em que é recorrente A. e recor- ridos B. e C., foi interposto recurso, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitu- cional (doravante, “LTC”), do acórdão proferido por aquele tribunal em 15 de maio de 2018, que confirmou a sentença proferida pelo Juízo Local Cível de Matosinhos – Juiz 3 –, datada de 18 de dezembro de 2017. 2. Os aqui recorridos intentaram contra a ora recorrente uma ação declarativa sob a forma de pro- cesso comum, pedindo que fosse declarado resolvido o contrato de arrendamento celebrado entre as partes, condenando-se a última no imediato despejo do locado, bem como no pagamento do valor correspondente quer rendas e juros, vencidos e vincendos, até integral e efetivo despejo. Através de sentença datada de 18 de dezembro de 2017, o tribunal de primeira instância decidiu: i) declarar resolvido o contrato de arrendamento celebrado entre autores (aqui recorridos) e ré (aqui recor- rente), condenando a mesma a despejar o locado nos termos previstos no artigo 1087.º do Código Civil; e (ii) condenar a ré (aqui recorrente) a pagar aos autores (aqui recorridos) os juros contabilizados à taxa legal de juro civil desde a data de vencimento de cada uma das rendas referentes aos meses de agosto, setembro e outubro de 2016, desde a data dos respetivos vencimentos, bem como as rendas entretanto vencidas e vin- cendas e respetivos juros até integral e efetivo despejo. 3. Inconformada, a ora recorrente interpôs recurso de apelação para o Tribunal da Relação do Porto, recurso esse que foi julgado integralmente improcedente através do acórdão ora recorrido. No segmento que aqui releva, pode ler-se na fundamentação do referido aresto: «O art.º 65.º da Constituição da República Portuguesa consagra o direito à habitação, o qual faz parte dos direitos sociais. O direito à habitação está igualmente consagrado na Declaração Universal dos Direitos Humanos das Nações Unidas e na Carta Social Europeia, estando Portugal vinculado a ambas. No entanto, tal como explica Gomes Canotilho, as normas constitucionais não devem ser consideradas isola- damente, mas sempre integradas num todo unitário em obediência ao princípio da unidade constitucional. Além disso, cabe ao legislador ordinário a tarefa de concordância prática entre os bens constitucionalmente tutelados e os valores que representam. Ora, não podemos esquecer que a Constituição da República Portuguesa consagra, a par do princípio invocado pela Recorrente, igualmente o direito à propriedade privada, no respetivo art.º 62.º, prescrevendo que “A todos é garantido o direito à propriedade privada e à sua transmissão em vida ou por morte, nos termos da Constituição. Bem como que as regras atinentes à cessação da relação jurídica de arrendamento consagradas no C Civil são precisamente uma forma de conciliação entre estes dois princípios constitucionais potencialmente conflituantes. Assim sendo, a mera alegação da Recorrente que viveu durante 30 anos no mesmo locado e que foi despejada por um período curto de mora no pagamento das rendas não pode seguramente levar à conclusão de que a deci- são recorrida praticou uma inconstitucionalidade. Aliás, a Recorrente poderia ter obstado ao despejo, caso tivesse optado por depositar as rendas em falta, acrescida da indemnização previsto na lei.» 4. Deste acórdão foi então interposto o presente recurso de constitucionalidade, através de requeri- mento com o seguinte teor: «1. O presente recurso visa a fiscalização concreta da constitucionalidade do art.º 1087 do CC na interpretação que lhe foi dada pelo Acórdão do Tribunal da Relação do Porto.

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