TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 105.º Volume \ 2019

67 acórdão n.º 268/19 Assim, para concluir que este processo tem tramitação urgente, seria necessário que da letra e do fim da norma constante do art. 9.º do CIRE resultasse inequivocamente que as ações apensadas se incluem no âmbito objetivo da norma, o que não acontece. A menção do art. 9.º n.º 1 do CIRE a «apensos» visou, não estender o carácter de urgência às ações declarativas apensadas ao abrigo do art. 85.º, mas sim estender esta natureza aos apensos do processo de insolvência stricto sensu , que não apenas a oposição por embargos e o recurso. Com efeito, a norma anterior equivalente, o art. 10.º n.º 1 do CPEREF, dispunha o seguinte: «os processos de recuperação da empresa e de falência, incluindo os embargos e recursos a que houver lugar, têm carácter urgente e gozam de precedência sobre o serviço ordinário do tribunal», e o CIRE veio esclarecer que este carácter urgente se aplica a todos os apensos e incidentes que se incluem dentro do próprio processo de insolvência stricto sensu ; Os apensos do processo de insolvência incluídos no n.º 1 do art. 9.º do CIRE são os apensos de oposição de embargos e recursos, da verificação de créditos, da restituição e separação de bens da massa, da apreensão de bens, da liquidação, da verificação ulterior de créditos, e outros de cuja decisão dependa o decurso e o desfecho do processo de insolvência. Estes apensos são essenciais para a determinação e liquidação do património da Massa Insolvente, e a sua solução prejudica o desfecho deste processo, pelo que se compreende que lhes seja atribuído o carácter de urgência. No entanto, a procedência desta ação declarativa, bem como do recurso de apelação, não se impede nem atrasa a liquidação do património, nem o encerramento do processo de insolvência, que já havia ocorrido. A natureza urgente do processo de insolvência restringe de forma relevante o direito de acesso à justiça e o direito ao contraditório e, quando o faz, implica a adaptação da tramitação do próprio processo e apensos, não se limitando a afastar a regra da suspensão dos prazos em férias judiciais: – impõe também que no requerimento de insolvência apresentado por outrem que não o devedor tenha de se oferecer imediatamente todas as provas, que cada parte não possa apresentar mais de dez testemunhas (art. 25.º do CIRE), que os vícios da petição de insolvência tenham de ser corrigidos no prazo máximo de cinco dias (al. b) do n.º 1 do art. 27.º do CIRE), que a audiência de julgamento deva ser marcada nos cinco dias posteriores à dedução de oposição (n.º 1 do art. 35.º do CIRE), que a audiência do devedor possa ser dispensada quando acarrete demora excessiva (n.º 1 do art. 12.º do CIRE), etc.; no apenso de verificação de créditos os prazos também são muito curtos (vide arts. 135.º, 137.º, 138.º e n.º 1 do art. 140.º) e é por efeito do cariz urgente deste processo que se restringe a acessibilidade ao recurso (art. 14.º do CIRE); o mesmo acontece no apenso de restituição e separação de bens (v. o n.º 2 do art. 144) e nos restantes apensos; Por isso, Sempre que o constrangimento de prazos de defesa não tenha um efeito útil e não seja proporcional, nos ter- mos do n.º 2 do art. 18.º da C.R.P., não é admissível, configurando uma clara e flagrante violação do n.º 5 do art. 20.º da C.R.P. Devia o Tribunal a quo ter decidido que o n.º 1 do art. 9.º do CIRE não se aplica às ações apensadas ao processo de insolvência, por estarmos perante uma norma excecional e bem assim que, tanto por via de uma interpretação histórica, como teleológica, esta ação declarativa não se inclui no âmbito objetivo da norma do n.º 1 do art. 9.º do CIRE, não devendo ser tratada como um processo urgente. O Tribunal a quo decidiu que a julgar-se aplicável o prazo de recurso para os processos urgentes em assintonia com uma série de atos já praticados no processo, representando uma decisão surpresa a aplicação das normais de tramitação do CIRE, já que a presente ação nunca foi tramitada como um processo urgente, nem pelo M. Juiz do Tribunal de 1.ª instância, nem pela secretaria desse Tribunal. A decisão do Tribunal a quo de não admitir o recurso, com fundamento da extemporaneidade do mesmo, com fundamento exclusivo no carácter urgente dos autos ao abrigo do art. 9.º, n.º 1 do CIRE contraria, de forma mani- festa e ilegítima, a segurança jurídica do caso concreto e as legítimas expectativas criadas pelas partes, maxime , pelo autor, ao longo da sua longa tramitação, as quais foram determinantes de relevantes investimentos de confiança nas normas jurídicas que vinham sendo aplicáveis nos autos.

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