TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 105.º Volume \ 2019

64 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL E acrescentam, de seguida, os mesmos autores: «Porém, na vigência destes diplomas a urgência apenas estava legalmente consagrada relativamente a certa fase do processo. Com a entrada em vigor do CPEREF deu-se mais um importante passo nesse sentido, alargando-se o âmbito da urgência a todas as fases dos então processos de recuperação da empresa e de falência, incluindo, na expressão legal, os embargos e os recursos que fossem deduzidos por quem tivesse legitimidade para o efeito. O texto do n.º 1 do art.º 10.º do CPEREF deixava espaço para a dúvida sobre se a urgência era extensível a todos os apensos do processo ou se, pelo contrário, apenas abrangia aqueles que expressamente referia, a saber, os embargos e, quando devessem ser processados por esse meio, os recursos. Independentemente de qual devesse ser a melhor resposta, a questão viria a ficar totalmente esclarecida com a entrada em vigor do n.º 1 do preceito em anotação, CIRE, no sentido de que tudo o que se relacione com o processo de insolvência é urgente, aí se incluindo os incidentes, apensos e recursos». E se, como afirmam também os autores referidos, se poderia sustentar que, sendo os incidentes e seus apen- sos uma parte integrante do próprio processo de insolvência, eles estariam já cobertos pela urgência que a este é conferida, sem necessidade de uma referência específica, certo é que a menção direta que agora se lhes faz afasta qualquer tipo de discussão. Assim, no regime atual tudo o que respeita ao processo de insolvência é urgente, o que, aliás, se compagina com aquele que se apresentou como um dos principais objetivos a atingir com a entrada em vigor do CIRE e que foi precisamente o fomento da sua celeridade (cfr. n.º 12 do preâmbulo do Dec. Lei n.º 53/2004, de 18/3, que aprovou o CIRE). Daí que, sendo a celeridade do processo de insolvência uma das principais preocupações do CIRE, que se traduziu na atribuição de carácter urgente igualmente a todos os seus apensos, incidentes e recursos, é lógico concluir-se que o legislador teve em vista não apenas o processo de insolvência propriamente dito, mas também os seus apensos, que integram, formal e estruturalmente, o próprio processo, ainda que com tramitação específica. Acresce que, tal como se mostra atualmente redigido o n.º 1 do art.º 9.º do CIRE, é hoje claro que o legislador não deixou qualquer margem de discricionariedade ao julgador no âmbito da qualificação e atribuição do carácter urgente a processado em processo de insolvência, incidentes e apensos. Por fim, tendo presente que atribuiu o legislador carácter urgente ao processo de insolvência, incluindo todos os seus incidentes, apensos e recursos interpostos, processados e julgados no âmbito do processo de insolvência, neles se incluindo aqueles que venham a ter lugar nos apontados incidentes e apensos, e não distinguindo – para o referido efeito – o mesmo legislador qual a natureza, fase e importância do incidente ou apenso, segundo as regras da hermenêutica jurídica, onde o legislador não distinguiu, de todo que não cabe ao intérprete vir a fazê-lo. Assim sendo, em sede de interpretação da lei – cfr. art.º 9.º do Código Civil–, importa atender à unidade do sistema jurídico e às circunstâncias em que a lei foi elaborada, sendo para nós inquestionável que o prazo de recurso de decisões proferidas em processos apensos ao processo de insolvência – como sucede no caso em apreço – é manifestamente o prazo de 15 dias, que não o de 30 dias, por força do estipulado nas disposições conjugadas dos art. os 9.º, n.º 1, do CIRE e 638.º, n.º 1, do CPC, correndo tal prazo mesmo durante as férias judiciais, nos termos do art.º 138.º, n.º 1, do CPC. Daí que, como entendeu o despacho reclamado e a decisão singular, o recurso foi interposto extemporanea- mente. Sustenta o reclamante que a interpretação do citado are 9.º, n.º 1, do CIRE é inconstitucional, por manifes- tamente desproporcionada, cerceando a defesa dos interesses dos cidadãos, impedindo a sua tutela efetiva e con- substanciando um tratamento desigual dos cidadãos perante a lei, violando o disposto nos art. os 2.º, 13.º, n.º 1, e 20.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, pois que a natureza urgente de um processo, seus incidentes e apensos não constitui um valor absoluto e abstrato, não se justificando, no caso a celeridade do procedimento, considerando os interesses em questão.

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