TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 105.º Volume \ 2019
569 acórdão n.º 449/19 15. Decorre do artigo 14.º da LPP que “[o] reconhecimento, com atribuição da personalidade jurídica, e o início das atividades dos partidos políticos dependem de inscrição no registo existente no Tribunal Cons- titucional”. O registo funciona, assim, como condição da atribuição de personalidade jurídica aos partidos políticos, assumindo, neste contexto, uma natureza constitutiva. A este propósito, refere Marcelo Rebelo de Sousa, já citado no Acórdão recorrido, o seguinte ( ibidem , pp. 426, 427): «Do que fica escrito se infere que, em nosso entender, a inscrição dos partidos políticos em registo próprio pelo Tribunal Constitucional assume uma feição constitutiva, numa dupla acepção — condiciona a aquisição da per- sonalidade jurídica e esta aquisição é indissociável da própria organização do substrato partidário. Assim, por um lado, como vimos, o reconhecimento da personalidade jurídica dos partidos políticos depende do respetivo registo. Por outro lado, aquele reconhecimento converge com a organização do substrato partidário sendo a propósito dele que a lei regula os requisitos deste substrato. O partido político não existe antes de tal inscrição e não é admitida perante a ordem jurídica portuguesa a figura do partido político não personalizado ou sem personalidade já que o estatuto jurídico-constitucional e legal do partido político – nomeadamente os seus fins e funções – supõem necessariamente a sua personalização. Convergem assim, cronologicamente, na constituição do partido político a manifestação de vontade inicial de cidadãos e a sua inscrição pelo Tribunal Constitucional. Se esta última faltar, não existe partido político, mas apenas uma associação com fins de natureza política, não lhe sendo, portanto, aplicável o regime do partido político. E, então, de duas uma: ou preenche os requisitos legais genéricos de atri- buição de personalidade jurídica às associações e é uma associação política nos termos e para os efeitos dos citados Decretos-Leis n. os 594/74 e 595/74 ou nem sequer tais requisitos preenche e deve ser considerada uma associação sem personalidade jurídica nos termos dos Artigos 195.º e seguintes do Código Civil.» Como salienta o Acórdão recorrido, o legislador manifesta uma preocupação notória de rodear o regime jurídico partidário de requisitos bastante mais exigentes do que sucede com a generalidade das associações, tendo presente a importância dos fins e funções dos mesmos, bem como a necessidade de segurança jurídica, valor que é particularmente relevante tendo em conta que os partidos políticos concorrem para a organização e para a expressão da vontade popular (artigo 10.º, n.º 2, da Constituição da República Portuguesa), e detêm, por isso, funções e competências no domínio da organização do poder político (artigos 114.º, 151.º, n.º 1, e 180.º do mesmo diploma). De forma particularmente expressiva, Marcelo Rebelo de Sousa hierarquiza o grau de regulamentação jurídica que o legislador assegura, atendendo às diferentes funções partidárias visadas, utilizando tal critério relacional para autonomizar três grupos, que caracteriza do seguinte modo: a) Grupo das funções mais diretamente relacionadas com a essência do regime político democrático e do sistema de governo representativo, como a função representativa e a função de titularidade e exercício do poder político – conjunto em que se inclui, nomeadamente, a apresentação de candi- daturas às eleições dos titulares dos órgãos do poder político –, que compreensivelmente constitui objeto de pormenorizada regulamentação jurídica; b) Grupo das funções que se relacionam com o funcionamento dos mecanismos democráticos repre- sentativos, como a função de criação e apoio a estruturas paralelas, a função pedagógica, a função de relações externas e a função financeira, conjunto que merece enquadramento jurídico avulso, direcionado a assegurar a “isenção dos mecanismos representativos, a igualação de possibilidades partidárias, a salvaguarda da independência nacional, o equilíbrio entre a atividade dos partidos e a de outros grupos sociais e a limitação das ingerências partidárias no tocante à atuação dos parceiros socioprofissionais”; c) Grupo das funções que, pela sua própria natureza, dizem respeito ao núcleo mais íntimo ou reser- vado da atividade partidária, constituindo uma garantia da autonomia substantiva de cada partido, como a função de definição política interna, a função administrativa stricto sensu e a função disci-
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