TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 105.º Volume \ 2019

56 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 1.3.1. O recorrente reclamou desta decisão para a conferência, sintetizando as suas razões nas seguintes conclusões: “[…] 1.º O Senhor Relator não analisou todas as questões jurídicas invocadas, mais concretamente não analisou a conformidade do artigo 164., n.º 2, do Cód. Penal, com o princípio ínsito no artigo 32.º, n.º 2, da Constituição, restringindo a sua decisão apenas a uma análise do artigo 29.º, n.º 1, da Constituição. 2.º Impõe-se a V. Exas., Venerandos Juízes reunidos em Conferência, diante desta omissão de pronúncia por parte do Senhor Relator, julgar inconstitucional a norma contida no artigo 164.º, n.º 2, do Cód. Penal, por violação do disposto no artigo 32.º, n.º 2, da Constituição. 3.º O n.º 2 do artigo 164.º, na redação que lhe foi dada pela Lei de 2015, é inconstitucional e não vai de encontro ao estabelecido na Convenção de Instambul, nem satisfaz os seus propósitos e o valor doutrinariamente atribuído a esta convenção não permite que nova lei ordinária nacional derrogue a disposição proveniente de instrumento internacional ao qual Portugal se vincule. 4.º O legislador não cumpre no artigo 164.º, n.º 2, do Cód. Penal, o dever que sobre ele impende de identificar com a máxima precisão que a natureza da linguagem consentir o facto voluntário que considera punível: a des- crição da infração criminal feita pelo legislador não cumpre na verdade as exigências decorrentes do princípio constitucional de lex certa , previsto no n.º 1 do artigo 29.º da Constituição. 5.º Enquanto o n.º 2, do artigo 164.º, do Cód. Penal, não for alterado e dele passar a constar “sem o seu consen- timento (da vítima)” os tribunais não podem aplicá-la, sob pena de termos o absurdo de a vítima poder consentir constrangidamente num relacionamento com o agressor (consentimento este, viciado e, como tal, nulo) não por violência ou ameaça grave, mas por outros meios. 6.º A questão nunca se colocou antes de 2015 porque os outros meios tinham de resultar dum abuso de autori- dade, que agora deixou de existir: a alteração legislativa de 2015 afronta contra a Constituição, ao ponto de terem vindo recentemente a lume notícias que dão conta que o grupo de peritos que avaliou a aplicação da Convenção de Istambul apela que Portugal corrija a legislação sobre crimes sexuais para garantir que essas ofensas sejam baseadas na ausência do livre consentimento da vítima. 7.º O constrangimento não pode ficar preso ao conceito de violência, ameaça grave e colocação na impossibilidade de resistir, que são as formas previstas já no n.º 1 do artigo 164.º – donde que, ou a lei diz quais são os meios os meios e as situações em que há constrangimento ou, então, ao referir-se a “outros meios” tinha de usar a expressão “sem consentimento”, como aliás faz noutros crimes de execução livre. 8.º As expressões contidas no artigo 164.º, n.º 2, do Cód. Penal, são ambíguas, e só se dele constasse a expressão “sem o seu consentimento (da vítima)” é que poderia constituir uma norma penal incriminadora – como tal, e na

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