TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 105.º Volume \ 2019
536 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL É certo que o período eleitoral em curso diz respeito a eleições para o Parlamento Europeu, e não para os órgãos da autarquia. Nessa medida, a relação entre a mensagem política transmitida pelos cartazes e a formação da decisão política dos eleitores é ténue e oblíqua. Mas nem por isso deixa de conter um potencial de enviesamento, tendo em conta que a campanha eleitoral é largamente preenchida pelas mesmas forças políticas que se apresentam aos demais atos eleitorais, nomeadamente as eleições locais, e que as questões de política interna são reiteradamente trazidas para o debate político que precede as eleições para o Parlamento Europeu. Na verdade, a absoluta cisão entre estas e aquelas não tem a menor aderência à realidade que se presume ter concitado a solução legal. A lei estabelece um «princípio da absoluta neutralidade e imparcialidade de todas as entidades públicas relativamente ao ato eleitoral em curso», como se afirma no Acórdão, com amplo e documentando apoio na jurisprudência constitucional. O fundamento de tal proibição é o perigo abstrato de que publicidade institucional com conotações partidárias, por mais vagas que estas sejam, possa enviesar o debate público e a formação da vontade eleitoral. Reitera-se que este dever, até pela sua extensíssima amplitude, pode ceder perante considerações de sentido contrário, nomeadamente os deveres de informação invocados pelo impug- nante. Mas verificando-se in casu não haver necessidade alguma de utilização de linguagem com conotação partidária para o cumprimento de tais deveres, basta uma relação ténue e oblíqua entre aquela e o ato eleito- ral para se consubstanciar a violação do dever de imparcialidade e neutralidade que a lei impõe às entidades públicas − tanto mais que estas, pela sua natureza estritamente instrumental do interesse público, não gozam de direitos fundamentais à liberdade de expressão ou de informação, direitos estes que se pudessem reputar excessivamente restringidos por tão ampla proibição legal. – Gonçalo de Almeida Ribeiro. DECLARAÇÃO DE VOTO Vencida quanto à decisão nos termos que sumariamente se explicitam. Ainda que se admita, como se afirma na fundamentação, que «nem toda a publicidade institucional se encontra abrangida pelo âmbito da proibição da norma aplicável, até porque pode ter um conteúdo infor- mativo» (cfr. II, 11) – entende-se que a concreta publicidade institucional em causa nos autos (painéis publi- citários relativos à atividade de um município) ainda se pode encontrar abrangida pela proibição da norma face ao seu fim último – o propósito de evitar a utilização de publicidade institucional com um conteúdo ou um sentido que, objetivamente, possa favorecer ou prejudicar determinadas candidaturas à eleição em curso, em violação dos princípios da neutralidade e imparcialidade das entidades públicas e do princípio da igualdade de oportunidade e de tratamento das diversas candidaturas (artigo 57.º da Lei n.º 14/79, de 16 de maio, aplicável por força do disposto no artigo 1.º da Lei n.º 14/87, de 29 de abril). A concreta publicidade em causa, é formulada senão em termos elogiosos da atividade do município, pelo menos em termos muito positivos que não se afigurarão estritamente necessários para fins informativos. Em especial, ao utilizar o hashtag “#VISEUFAZBEM”, também empregue na candidatura à presidência da Câmara Municipal de Viseu nas eleições autárquicas (2017), a publicidade institucional em causa afigura-se suscetível, ainda que de modo indireto (por se tratar de diferente ato eleitoral), de favorecer ou prejudicar as candidaturas eleitorais às eleições europeias e influenciar a apreciação das mesmas por parte dos eleitores, por força da eventual associação, por muito remota ou ténue que seja, que possa ser estabelecida entre as candi- daturas às eleições em curso e a candidatura – e partido – que naquelas outras eleições o utilizou. Pelo exposto, entende-se que a publicidade institucional em causa nos presentes autos viola o dever de imparcialidade e neutralidade das entidades públicas, consagrado no artigo 57.º da Lei n.º 14/79, de 16 de maio, aplicável por força do disposto no artigo 1.º da Lei n.º 14/87, de 29 de abril. – Maria José Rangel de Mesquita.
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=