TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 105.º Volume \ 2019
517 acórdão n.º 428/19 Em face de todo o exposto, resta concluir que o requerimento de interposição do recurso de consti- tucionalidade não deveria ter sido, pelo motivo que foi, desentranhado do processo, não constituindo o fundamento invocado no despacho reclamado razão suficiente para considerar tal recurso processualmente inadmissível. 19. Não obstante a conclusão que acabou de alcançar-se, certo é que, para julgar procedente a presente reclamação não basta afastar o fundamento com base no qual o recurso de constitucionalidade foi, em con- creto, desconsiderado. A reclamação apenas poderá ser julgada procedente se não se verificarem outras razões, mesmo que não convocadas na decisão reclamada, que obstem à admissibilidade do recurso. Quer isto significar que o objeto da reclamação se não encontra tematicamente confinado ao fun- damento invocado pelo juiz a quo para justificar a não admissão do recurso de constitucionalidade. Pelo contrário, estando em causa uma eventual revogação da decisão que não admitiu o recurso, o julgamento da reclamação estende-se forçosamente à verificação de todos os pressupostos de cujo preenchimento depende a admissibilidade do recurso. Como, a tal propósito, se escreveu no Acórdão n.º 276/88: «[O] que de todo o modo não parece ser de excluir é a possibilidade de o Tribunal Constitucional alargar […] o objeto da reclamação, quando os autos forneçam os elementos necessários para tanto – ou então, e mais precisa- mente, a possibilidade de alargá-lo na exata medida em que os elementos constantes dos autos o consintam. Apon- tam nesse sentido […] evidentes razões de economia processual tudo conjugado com o facto de se estar perante matéria do conhecimento oficioso do Tribunal (cfr. artigo 495.º Cód. Proc. Civil [que corresponde ao artigo 578.º do CPC atual]). E claro que, a ser pelo menos assim, a decisão da reclamação, no caso de deferimento, fará caso julgado, não apenas quanto ao fundamento ou fundamentos de rejeição do recurso invocados no despacho recla- mado, mas ainda quanto à verificação de todos os pressupostos de admissibilidade daquele de que o Tribunal tenha efetivamente conhecido. Nestas condições […], impõe-se na verdade averiguar se, a vista dos elementos oferecidos pelos presentes autos, ocorre algum outro fundamento, para além do já assinalado, que obste a admissibilidade do recurso neles inter- posto para este Tribunal. E impõe-se isso tanto mais, quanto, no caso, aqueles elementos são de molde a permitir uma indagação completa da verificação dos pressupostos de tal admissibilidade». Este entendimento, pacífico na jurisprudência deste Tribunal, foi recentemente reiterado no Acórdão n.º 304/19, onde, a este propósito, pode ser-se o seguinte: «Segundo o disposto no n.º 4 do artigo 77.º da LTC, a decisão que julgue a reclamação de despacho que inde- fira o recurso de constitucionalidade ou que retenha a sua subida não pode ser impugnada e, caso a reclamação seja deferida, faz caso julgado quanto à admissibilidade do recurso. Significa isto que, no julgamento da reclamação, importa considerar não só os fundamentos em que repousa a decisão de não admissão ou de retenção do recurso de constitucionalidade, como ainda aferir da verificação dos demais pressupostos de admissibilidade do recurso. Dito de outro modo: o julgamento da reclamação deverá não só incidir sobre o fundamento do despacho de não admis- são ou de retenção do recurso de constitucionalidade, como sobre quaisquer outras razões que obstem ao conheci- mento do objeto do recurso. Isto porque o deferimento da reclamação implica a preclusão dos poderes cognitivos do Tribunal em matéria de não admissão do recurso, nos termos do artigo 77.º, n.º 4, da LTC, formando-se caso julgado formal a esse respeito». Tendo presente o que se acabou de expor, atentemos nas razões apontadas pelo Ministério Público para sustentar a conclusão de que o recurso desconsiderado pelo tribunal a quo é processualmente inadmissível.
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