TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 105.º Volume \ 2019
492 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL arrendamento (cfr., por exemplo, a já citada Exposição de Motivos da Proposta de Lei n.º 250/XII) – apreciação essa que não cabe a este Tribunal questionar –, a toda a comunidade. Trata-se, pois, de um fim legítimo. Por outro lado, a solução legal de precludir a possibilidade de o arrendatário impedir ou diferir a transição para o NRAU do seu arrendamento e ou limitar e condicionar a atualização do valor das rendas não é funcionalmente inadequada para tal objetivo. A verdade, porém, é que tal solução se revela desnecessária para o efeito. Uma vez comunicada ao senhorio a idade ou a incapacidade do arrendatário ou o seu rendimento anual bruto, aquele – que até pode ter conhecimento pessoal desses dados (ao menos quanto à idade e à incapacidade, tal até será a situação mais provável, de acordo com a experiência comum) – fica a saber que a sua intenção de fazer transitar o arrendamento para o NRAU, a menos que as alegações do arrendatário sejam falsas, está comprometida ou limitada. Mas nada impediria que, até ao momento em que tais circunstâncias pessoais do arrendatário fossem por este devidamente comprovadas, a transição prosseguisse sob condição. Agindo de boa fé, como é dever de todas as partes contratuais, o arrendatário também tem interesse numa rápida clarificação da situação. O mais tardar, no âmbito do procedimento especial de despejo referido nos artigos 15.º e seguintes do NRAU, a veracidade das alegações do arrendatário teria de ser comprovada, sem prejuízo do dever de compensação de eventuais danos causados pela demora na comprovação daquelas situações objetivas. E, de qualquer modo, opondo-se o arrendatário à transição para o NRAU, esta, mesmo abstraindo dos regimes especiais do “arrendatário com RABC inferior a cinco RMNA” (artigo 35.º) e do “arrendatário com idade igual ou superior a 65 anos ou com deficiência com grau de incapacidade superior a 60%” (artigo 36.º), só implica a imediata cessação do vínculo de arrendamento no caso de o senhorio não aceitar o valor da renda proposto, expressa ou tacitamente, pelo arrendatário e optar pela denúncia imediata do contrato mediante o pagamento de indemnização, nos termos do artigo 33.º, n.º 5, alínea a) (cfr. supra o n.º 5.3.). A solução consubstanciada na norma objeto do presente recurso revela-se, além disso, desproporcionadamente onerosa para o arrendatário, por comparação com os benefícios que a mesma traz para o senhorio e para o interesse comum. Aliás, estes não seriam excessivamente lesados caso tal norma não vigorasse. Com efeito, o senhorio não perde nem o seu direito a promover a transição para o NRAU nem o direito a eventuais compensações devidas pela demora na efetivação dessa mesma transição. Já o arrendatário que reúna as condições que alega – RABC inferior a cinco RMNA e idade igual ou superior a 65 anos ou com deficiência com grau de incapacidade superior a 60% – sem as comprovar no momento devido e que até à comunicação da intenção do senhorio de fazer transitar o seu contrato de arrendamento para o NRAU gozava de um direito consolidado ao locado com uma certa renda, fica, por força de tal norma, numa situação muito precária, já que o seu direito à habitação no locado e a garantia de uma renda ajustada ao seu rendimento ficam dependentes da boa vontade do senhorio. Ou seja, numa fase já muito avançada da vida, e em que dificilmente encontrará soluções equivalentes à que tinha por consolidada, o arrendatário pode, contra a sua vontade, ver-se confrontado com um contrato de arrendamento com prazo certo e, portanto, sujeito a caducidade, e, ou, com uma renda de valor demasiado elevado para o seu nível de rendimentos (cfr. supra os n. os 5.3. e 5.4.). 7. Considera, todavia, o recorrente que a circunstância de estar em causa apenas a atualização da renda (e não a transição para o NRAU) obsta a que se considere transponível para o presente caso a fundamenta- ção do aresto citado, por serem significativamente menos gravosas as consequências que para o arrendatário resultam de se dar por não comprovado o valor anual do RABC. No entanto, este argumento supõe que a atualização da renda imposta in casu vigoraria, apenas, até à apresentação de nova declaração de rendimentos – pressuposto que, conforme referido supra , não pode dar- -se por verificado. Ademais, não há dúvida de que – ainda que não esteja em causa a transição para o NRAU – da atualização da renda pode advir para o arrendatário que dispõe de baixos rendimentos um agravamento significativo das condições de vida, igualmente em fase em que «dificilmente encontrará soluções equivalen- tes à que tinha por consolidada». Por último, é de referir que no caso apreçado no Acórdão n.º 277/16 se deu por demonstrado o incumpri- mento, por parte do arrendatário, do ónus de comprovação das circunstâncias de que pretendia beneficiar. Diver- samente, no caso em apreço, a arrendatária havia apresentado, em julho do ano anterior, documento comprovativo
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