TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 105.º Volume \ 2019
470 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL autónoma face à posição a que aderiu. Essencial é que essa remissão não esconda uma demissão da função decisória, com o que esta implica de reflexão pessoal e decisão própria. Mais recentemente, no Acórdão n.º 391/15 – proferido no mesmo processo de inquérito que originou o presente recurso e tendo por base a mesma forma de fundamentação de decisões por remissão do mesmo juiz de instrução – apreciou-se novamente a questão, mantendo, no essencial, a linha traçada pela jurisprudência anterior, referindo-se o seguinte: “[…] A função de tutela preventiva dos direitos fundamentais que o Juiz de Instrução Criminal desempenha impõe seguramente que ele ajuíze, de forma crítica e autónoma, as razões de facto e de direito invocadas pelo Ministério Público para promover a medida de prisão preventiva. Na verdade, só uma decisão que resulte de uma pondera- ção própria dá conteúdo material efetivo à reserva de juiz. A satisfação, em grau máximo, desta exigência, só se dá quando o juiz ‘subjetiva’ a fundamentação da prisão pre- ventiva [a decisão que estava em causa neste Acórdão n.º 391/15], formulando, através de palavras suas, a convicção, que o determinou , de que qualquer outra das medidas de coação é inadequada e insuficiente. Quando assim é, fica patente aos olhos de todos, sem margem para qualquer dúvida, que estamos perante uma decisão pessoal do juiz, cujo conteúdo é da sua responsabilidade e não ‘preformatado’ pelo requerimento do Ministério Público. Como se deixou escrito no Acórdão n.º 189/99 (acessível em www.tribunalconstitucional.pt ) : «(…) É óbvio que o despacho, que melhor espelha a responsabilização pessoal do juiz pela ordem de prisão que dá, é aquele em que o juiz enuncia, ele próprio, os motivos de facto da decisão tomada, em vez de se remeter para as razões invocadas pelo Ministério Público». Mas a circunstância da fundamentação da decisão que coloca um arguido em prisão preventiva, proferida por um juiz, remeter para anterior promoção do Ministério Público, não permite, só por si, retirar a conclusão que ela não traduz uma opção livre, autónoma e independente do seu subscritor, uma vez que o quadro em que é feita a remissão pode revelar que a decisão tomada não deixou de ser o resultado duma ponderação própria. A adoção de tal técnica na exposição dos motivos que fundamentam a escolha dessa medida de coação pode significar que o seu autor considerou boas as razões que o Ministério Público invocou para fundamentar a sua proposta de decisão, pelo que as acolheu e fez suas, não tendo visto necessidade de recorrer a outras linhas de fundamentação ou de as expor em redação própria. […] Só em concreto se poderá avaliar se a decisão proferida, neste ou em qualquer outro processo, pelo Juiz de Ins- trução Criminal é suscetível de originar dúvidas sobre se a mesma transmite um juízo autónomo e pessoal do seu subscritor ou representa um simples «’ir atrás’ do Ministério Público» (Acórdão n.º 189/99). E esse é um juízo que cabe exclusivamente às instâncias, não tendo o Tribunal Constitucional competência para o formular. Quanto à observância do dever de fundamentação, o artigo 205.º da Constituição impõe que as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente devam ser fundamentadas na forma prevista na lei. Como é consabido e tem sido referido em variados arestos deste Tribunal, o cumprimento do dever de fundamentação das decisões judiciais pode assumir, conforme os casos, uma certa geometria variável, sendo entregue ao legislador ordinário a tarefa de definir as formas e o grau de fundamentação exigível. Relativamente às medidas de coação [da aplicação destas se tratou neste Acórdão n.º 391/15], com exceção do termo de identidade e residência, o artigo 194.º, n.º 6, do Código de Processo Penal, exige que a fundamen- tação do despacho que as aplique contenha, sob pena de nulidade: 'a) A descrição dos factos concretamente imputados ao arguido, incluindo, sempre que forem conhecidas, as circunstâncias de tempo, lugar e modo; b) A enunciação dos elementos do processo que indiciam os factos imputados, sempre que a sua comu- nicação não puser gravemente em causa a investigação, impossibilitar a descoberta da verdade ou criar perigo para a vida, a integridade física ou psíquica ou a liberdade dos participantes processuais ou das vítimas do crime;
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