TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 105.º Volume \ 2019
464 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL (constante da Lei Constitucional n.º 1/97, de 20 de setembro), passou a incluir, no artigo 32.º, a menção expressa ao recurso, incluído nas garantias de defesa, assim consagrando, aliás, a jurisprudência constitucional anterior a esta revisão, e segundo a qual a Constituição consagra o duplo grau de jurisdição em matéria penal, na medida (mas só na medida) em que o direito ao recurso integra esse núcleo essencial das garantias de defesa previstas naquele artigo 32.º Para além disso, algumas vozes têm considerado como constitucionalmente incluído no princípio do Estado de direito democrático o direito ao recurso de decisões que afetem direitos, liberdades e garantias constitucionalmente garantidos, mesmo fora do âmbito penal (ver, a este respeito, as declarações de voto dos Conselheiros Vital Moreira e António Vitorino, respetivamente no Acórdão n.º 65/88, Acórdãos do Tribunal Constitucional, vol. 11.º, p. 653, e no Acórdão n.º 202/90, idem , vol. 16.º, p. 505). Em relação aos restantes casos, todavia, o legislador apenas não poderá suprimir ou inviabilizar globalmente a faculdade de recorrer. Na verdade, este Tribunal tem entendido, e continua a entender, com A. Ribeiro Mendes ( Direito Processual Civil, III – Recursos, AAFDL, Lisboa, 1982, p. 126), que, impondo a Constituição uma hierarquia dos tribunais judiciais (com o Supremo Tribunal de Justiça no topo, sem prejuízo da competência própria do Tribunal Consti- tucional – artigo 210.º), terá de admitir‑se que «o legislador ordinário não poderá suprimir em bloco os tribunais de recurso e os próprios recursos» (cfr., a este propósito, Acórdãos n.º 31/87, Acórdãos do Tribunal Constitucional , vol. 9.º, p. 463, e n.º 340/90, idem, vol. 17.º, p. 349). Como a Lei Fundamental prevê expressamente os tribunais de recurso, pode concluir‑se que o legislador está impedido de eliminar pura e simplesmente a faculdade de recorrer em todo e qualquer caso, ou de a inviabilizar na prática. Já não está, porém, impedido de regular, com larga margem de liberdade, a existência dos recursos e a recorribilidade das decisões (cfr. os citados Acórdãos n. os 31/87 e 65/88, e ainda n.º 178/88 ( Acórdãos do Tribu- nal Constitucional, vol. 12.º, p. 569); sobre o direito à tutela jurisdicional, ainda Acórdãos n.º 359/86 ( Acórdãos do Tribunal Constitucional, vol. 8.º, p. 605), n.º 24/88 ( Acórdãos do Tribunal Constitucional, vol. 11.º, p. 525) e n.º 450/89 ( Acórdãos do Tribunal Constitucional, vol. 13.º, p. 1307). O legislador ordinário terá, pois, de assegurar o recurso das decisões penais condenatórias e ainda, segundo certo entendimento, de quaisquer decisões que tenham como efeito afetar direitos, liberdades e garantias cons- titucionalmente reconhecidos. Quanto aos restantes casos, goza de ampla margem de manobra na conformação concreta do direito ao recurso, desde que não suprima em globo a faculdade de recorrer.” Não se vislumbra nenhuma razão para abandonar aqui a referida jurisprudência, mesmo que esteja em causa um alegado caso de oposição de julgados existente entre acórdãos proferidos pela Secção de Contencioso Adminis- trativo e pela Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo. Mesmo na jurisdição administrativa e tributária, até por força de um argumento a fortiori , o direito de acesso aos tribunais e a garantia jurisdicional administrativa não vão além de um segundo grau de jurisdição, conforme já foi reconhecido pelo Tribunal Constitucional no Acórdão n.º 520/07 (…).» Esta posição foi retomada pelo Tribunal Constitucional no Acórdão n.º 69/09, da 1.ª Secção (Conferên- cia), que indeferiu a reclamação relativa à decisão sumária tomada no processo n.º 754/08, em 5 de janeiro de 2009, onde se refere: «(…) Está, assim, em causa a pretensão do recorrente em impugnar o entendimento fixado na decisão recorrida segundo o qual, em contencioso tributário, o recurso para uniformização de jurisprudência, que decorre da apli- cação supletiva do artigo 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), apenas cabe entre acórdãos proferidos por uma secção de Contencioso Tributário, seja ela do Supremo Tribunal Administrativo, seja ela dos Tribunais Centrais Administrativos. É este entendimento que o recorrente contesta. Contudo, é manifesto que dos artigos 20.º e 268.º da Constituição não resulta para o legislador qualquer obrigação de admitir que o recurso para uniformização de jurisprudência previsto no artigo 152.º do Código de
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