TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 105.º Volume \ 2019
46 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL compreensível para dar adequada satisfação às exigências do artigo 29.º, n.º 1, da Constituição, ou seja, não encerra tal previsão a ambiguidade ou dúvida que o recorrente assinalou. V - Não cabe ao Tribunal Constitucional sindicar a apreciação dos factos invocados pelo recorrente, pon- deração que corresponderia a um recurso ordinário de mérito, mas em caso algum a um recurso inci- dental com natureza normativa. Acordam, em Conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional: I – A Causa 1. Correu termos no Juízo Central Cível e Criminal de Ponta Delgada um processo comum para jul- gamento por tribunal coletivo com o número 372/16.5JAPDL, sendo arguido A. (o ora recorrente), que foi condenado em primeira instância na pena de seis anos de prisão, em cúmulo jurídico de penas parcelares aplicadas pela prática de cinco crimes de violação, previstos e punidos pelo artigo 164.º, n.º 2, do Código Penal (crimes esses praticados pelo arguido, como médico prestando serviço no Hospital de Ponta Delgada, sobre pacientes por ele atendidas no Serviço de Urgência daquela unidade hospitalar). 1.1. Inconformado com esta decisão condenatória, dela interpôs recurso o arguido para o Tribunal da Relação de Lisboa. Das respetivas alegações consta, designadamente, o seguinte: “[…] Da inconstitucionalidade do artigo 164.º, n.º 2, do Código Penal Na sentença recorrida, refere o Tribunal a quo que não acompanha o juízo de inconstitucionalidade defendida pelo arguido em sede de alegações. Sem razão. O artigo 164.º do Código Penal, que prevê o crime de violação, reza o seguinte: ‘1 – Quem, por meio de violência, ameaça grave, ou depois de, para esse fim, a ter tornado inconsciente ou posto na impossibilidade de resistir, constranger outra pessoa: a) A sofrer ou a praticar, consigo ou com outrem, cópula, coito anal ou coito oral; ou b) A sofrer introdução vaginal ou anal de partes do corpo ou objetos; é punido com pena de prisão de três a dez anos. 2 – Quem, por meio não compreendido no número anterior, constranger outra pessoa: a) A sofrer ou a praticar, consigo ou com outrem, cópula, coito anal ou coito oral; ou b) A sofrer introdução vaginal ou anal de partes do corpo ou objetos; é punido com pena de prisão de 1 a 6 anos’. A atual redação do crime do crime previsto e punido pelo artigo 164.º do Código Penal foi dada pela Lei n.º 83/2015. O bem jurídico protegido pela incriminação é a liberdade sexual de outra pessoa. E não é possível analisar os factos deste processo sem atender à ratio deste crime – é necessário partir do bem jurídico, que deverá iluminar a interpretação do tipo legal de crime, para melhor o compreender.
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