TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 105.º Volume \ 2019
360 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL XX - Pode questionar-se o mérito de uma solução legal que, impedindo o exercício do direito de ação do filho após um determinado prazo, acaba por beneficiar a posição jurídica de quem não o merece, na sub-hipótese de o pai ter conscientemente fugido às suas responsabilidades parentais, mas não se pode dizer que esta solução seja manifestamente carecida de base constitucional de apoio; deve também reconhecer-se que o mero prosseguimento das ações, atenta a natureza das questões de facto e de direi- to aí debatidas, produz, só por si, graves perturbações na vida pessoal e familiar do investigado, ainda que no final aquelas venham a ser julgadas improcedentes; a opção legal de estabelecer um prazo de caducidade para o exercício do direito de ação de investigação da paternidade não é, pois, manifesta- mente infundada ou arbitrária, seja considerando o interesse público prosseguido, seja considerando os direitos fundamentais igualmente atendidos. XXI - Quanto ao requisito constitucional da adequação, parece claro que o prazo de caducidade estabele- cido no n . º 1 do artigo 1817 . º do Código Civil é apto a assegurar a tutela jurisdicional efetiva, quer dos direitos fundamentais do investigante a saber quem é o seu pai e a estabelecer com ele o respetivo vínculo jurídico, quer dos direitos fundamentais do investigado a saber quem é o seu filho e a estabe- lecer com ele a correspondente relação jurídico-familiar; a solução alternativa da ausência de prazos de caducidade para o exercício do direito de ação, não estando constitucionalmente vedada, poderia comprometer a realização dessas finalidades, sendo legítimo ao legislador escolher uma solução que, dentre as várias constitucionalmente admissíveis, se lhe afigure mais adequada à realização do interes- se público, que passa pela constituição e estreitamento das relações familiares, e à compatibilização dos direitos fundamentais em presença, os do investigante e do investigado. XXII - Em relação ao requisito da proporcionalidade stricto sensu , também não se afigura que a lei tenha ido longe de mais na concretização das finalidades visadas com o estabelecimento de um prazo de caducidade para o exercício do direito de ação de investigação da paternidade; embora a observância do prazo de caducidade constitua, para o investigante, um verdadeiro ónus, o de intentar a ação de investigação da paternidade dentro do prazo legalmente previsto para efeito, sob pena de extinção dos direitos substantivos que através dela se pretendem assegurar – o direito ao conhecimento da paternidade biológica e o direito ao estabelecimento do respetivo vínculo jurídico –, estes direitos sofrem ao longo do tempo assinaláveis modulações e redimensionamentos, do ponto de vista dos bens jurídicos tutelados, que não podem ser desconsiderados; mostrando-se doutro modo assegura- dos esses mesmos bens jurídicos, seja pela restante família, seja pelo Estado, na falta ou incapacidade daquela, o direito ao conhecimento e reconhecimento jurídico da paternidade passa a assumir na fase adulta uma dimensão essencialmente patrimonial. XXIII - Os bens jurídicos do filho concretamente atingidos pelo prazo de caducidade não assumem, na «hierar- quia axiológica da Constituição», o valor (quase) absoluto que a decisão recorrida lhes atribui, mesmo quando confrontados com a esfera jurídico-constitucional do pai, não havendo razão para concluir que as finalidades prosseguidas através do estabelecimento de prazos de caducidade para o exercício do direito de ação de investigação da paternidade são atingidas à custa de bens que, na perspetiva da Constituição, valem muito mais do que aqueles que, direta ou reflexamente, são tutelados por esses mesmos prazos; comparando os benefícios, individuais e sociais assegurados pelo prazo de caducidade, com os custos, essencialmente patrimoniais, sofridos pelo investigante por causa da sua inobservância, parece claro que não estamos perante uma medida legal desproporcional, e, muito menos, manifestamente despropor- cional; indispensável é que esteja assegurado o exercício efetivo do direito de ação de investigação da paternidade dentro do prazo de caducidade legalmente previsto e em termos compatíveis com a natureza
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