TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 105.º Volume \ 2019
358 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL ver reconhecido o seu direito ao conhecimento do pai biológico e estabelecida a relação de filiação em relação ao mesmo, intente a pertinente ação de investigação de paternidade dentro de um dado período de tempo, sob pena de deixar de o poder fazer, salvo a ocorrência de novas circunstâncias justificativas, de natureza objetiva ou subjetiva. XII - A perspetiva do indivíduo titular do direito fundamental em causa, embora decisiva – porque deter- minante –, não é necessariamente exclusiva – no sentido de dever ser a única a tomar em consideração; a Constituição portuguesa – e o mesmo é reconhecido com referência ao direito à identidade pessoal no âmbito da Convenção Europeia dos Direitos Humanos – rejeita uma compreensão dos direitos fundamentais individuais centrada exclusivamente no indivíduo; a prevalência de um direito sobre outro que com ele colida num dado momento, não implica que este último não possa ser considerado para efeitos de graduação do nível de proteção do primeiro ao longo do tempo. XIII - Sendo certo que a identidade pessoal e a constituição de família na vertente aqui considerada do estabelecimento do vínculo de filiação são elementos conformadores da autodefinição da pessoa e, nessa medida, do desenvolvimento da sua personalidade, que é necessariamente dinâmico, não é menos certo que tal significado conformador decresce muito acentuadamente com a maturidade e a experiência de vida; daí a importância decisiva de qualquer um dos limites temporais legalmente esta- belecidos para o exercício do direito ao conhecimento da progenitura por via da ação de investigação de paternidade só poder operar depois de o interessado, dispondo das informações por si consideradas suficientes para o efeito, já ter a maturidade e a experiência da vida necessárias a poder tomar neste domínio uma decisão devidamente refletida e ponderada. XIV - Uma vez assegurada a possibilidade de exercício pleno daquele direito, cabe ao legislador democrático decidir se, em face da inconveniência da indefinição do estatuto pessoal do investigante, dos custos que uma dilação excessiva da iniciativa processual importam para a segurança da prova e do risco de lesão dos direitos de terceiros que afinal nenhuma relação biológica têm com o investigante, deve ser atribuído a este último, adicionalmente, a opção de intentar a ação de investigação de paternidade a todo o tempo; num Estado de direito democrático, a avaliação das mudanças operadas na consciência coletiva quanto à valoração de certos bens em face de outros e, bem assim, relativamente à preocu- pação com a verdade e a transparência, e a decisão sobre as consequências normativas a retirar de tais mudanças cabem exclusivamente ao legislador democraticamente eleito, e não ao julgador incumbido apenas de fazer respeitar os valores fundamentais pré-definidos na Constituição para a sociedade des- tinatária de tais escolhas político-jurídicas. XV - O direito ao conhecimento da paternidade biológica, sendo uma importantíssima faculdade incluída no direito fundamental à identidade pessoal, como o Tribunal Constitucional e o próprio legislador reconhecem, não o esgota; a identidade que a Constituição tutela é dinâmica e evolutiva; nesta pers- petiva, não pode deixar de se reconhecer que o direito ao conhecimento da paternidade biológica, enquanto instrumento de definição e construção da identidade, vai assumindo ao longo da vida do filho diferentes configurações normativas, que acompanham e refletem os seus diferentes estádios de desenvolvimento e toda a sua progressão individual e social; o que a Constituição pretende assegurar é que o processo de autonomização dos cidadãos se faça, em relação ao seu agregado familiar de origem, de forma gradual e sustentada, acautelando-se a montante o desenvolvimento são e equilibrado da personalidade das crianças e dos jovens.
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