TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 105.º Volume \ 2019
35 acórdão n.º 450/19 criação, extinção e modificação ( idem ), o regime da elaboração e organização dos orçamentos das autarquias locais [artigo 164.º, alínea r) ], o estatuto das autarquias locais, incluindo o regime das finanças locais [artigo 165.º, n.º 1, alínea q) ], a participação das organizações de moradores no exercício do poder local [artigo 165.º, n.º 1, alínea r) ] e regime e forma de criação das polícias municipais [artigo 165.º, n.º 1, alínea aa) ]– encontram-se reservadas à competência legislativa da Assembleia da República, absoluta e relativa, sem pos- sibilidade de autorização às Assembleias Legislativas Regionais. Conforme se concluiu no Acórdão n.º 420/18, «por força do disposto nos artigos 227.º, n.º 1, alíneas a) e b) e 228.º, n.º 1, da Constituição, o enquadramento infraconstitucional das autarquias locais – sem excecionar as autarquias locais existentes nas Regiões Autónomas – assume um caráter unitário, de âmbito nacional , decidido no plano parlamentar nacional » (itálico aditado). A razão de ser da opção do legislador constituinte (e de revisão) foi igualmente explicitada no aludido aresto. De acordo com o que aí se escreveu, tal opção repousa «na compreensão da autonomia das autarquias locais (e da sua existência) no quadro do Estado unitário (artigo 6.º, Constituição) e na organização democrática do Estado (artigo 235.º, n.º 1)», que aponta, por sua vez, «para a igualdade estatutária das autarquias locais exis- tentes (municípios e freguesias), diferenciando o continente e as Regiões Autónomas tão só quanto à existência das (ainda não criadas) regiões administrativas (artigo 236.º, n. os 1 e 2). No demais, as condições específicas das «ilhas» poderão determinar o estabelecimento, por lei, de outras formas de organização territorial autárquica (artigo 236.º, n.º 3), que não os atualmente previstos municípios e freguesias» (itálico aditado). 18. Ao reservar à Assembleia da República a definição do “estatuto das autarquias locais, incluindo o regime das finanças locais», sem limitação às “bases gerais” ou ao “regime geral” daquele estatuto, a alínea q) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição comete, à partida, à lei parlamentar a definição de todo o regime daquela maté- ria. Trata-se, pois, de um caso em que a inclusão de determinada matéria na reserva relativa de competência da Assembleia da República opera in toto (cfr., neste sentido, Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional, Vol. III, Tomo V, Atividade Constitucional do Estado , Coimbra, Coimbra Editora, 2014, n.º 68, p. XXX, ou Jorge Miranda/Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada , Volume II, Organização Económica, Organização do Poder Político, Artigos 80.º a 201.º, 2.ª edição, Lisboa, UCP, 2018, Anotação ao artigo 164.º, III, p. 529). A questão está, assim, em saber o que deve considerar-se incluído no âmbito material do “estatuto das autarquias locais, incluindo o regime das finanças locais”, a que alude a alínea q) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição. Conforme sublinhado no aresto que vimos acompanhando, a «cláusula de reserva relativa prevista na alínea q) do n.º 1 do artigo 165.º da Constituição, invocada como fundamento determinante de inconsti- tucionalidade [também] nos presentes autos, assume relevância no quadro da garantia constitucional da autonomia do poder local, tal como resulta do regime constitucional contido no seu Título VII, dedicado ao Poder Local, e artigos que o integram (artigos 235.º a 262.º)». É esse o quadro que permite apreender (Jorge Miranda/Rui Medeiros, Constituição , Anotação ao artigo 165.º, I, pp. 543-544), ainda que sem os esgotar, o significado e alcance da matéria integrada na reserva prevista naquela alínea. Ao perspetivar, no seu artigo 6.º, a estrutura do Estado unitário, a Constituição estabelece um «princípio constitucional geral – a unidade do Estado – e quatro princípios de âmbito específico, que qualificam aquele sem o contrariarem: a autonomia regional, a autonomia local, o princípio da subsidiariedade e a descentral- ização administrativa» (J. J. Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, Vol. I, 4.ª edição, 2007, Anotação ao artigo 6.º, p. 232). Na arquitetura dos poderes que integram o Estado unitário e na correlação entre eles estabelecida, o princípio constitucional da autonomia local – que, tal como dali decorre, se apresenta como «um dos pilares fundamentais em que assenta a organização territorial da República Portuguesa» (Acórdão n.º 494/15) –, assume, nos termos da própria Constituição, uma vertente garantística: ao estabelecer que a «organização democrática do Estado compreende a existência de autarquias locais», enquanto «pessoas coletivas territoriais dotadas de órgãos representativos, que visam a prossecução de interesses próprios das populações respetivas»,
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