TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 105.º Volume \ 2019

347 acórdão n.º 387/19 policial – artigo 174.º, n.º 6, 252.º, n.º 3, ou 252.º-A, n.º 2, do Código de Processo Penal – incompatíveis com o formalismo inerente a uma intervenção antecipada do juiz de instrução.  Ainda que assim não fosse – ou seja, mesmo a admitir-se que a reserva do juiz só deverá comprimir a reserva do Ministério Público na medida do necessário para a proteção efetiva dos direitos, liberdades e garantias quando esteja em causa uma restrição severa –, as sombras da afronta à Constituição continuariam a pesar sobre a dimensão normativa em sindicância. Logo porque a apreensão provisória para efeitos de garantia patrimonial não configura, certamente, um limite imanente do direito de propriedade privada (neste sentido, ver o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 294/08). Pretender que o programa normativo de tutela da propriedade reconhecido no artigo 62.º da Lei Fundamental deve ceder face ao ilícito penal não pode esquecer a circunstância de aqui apenas estar em causa um mero ato cautelar materializado em inquérito sem qualquer indiciação qualificada da putativa responsabilidade criminal do arguido, menos ainda sem «culpa formada». Trata-se, pois, de um argumento que apenas teria sentido em face da própria decisão de perda do bem decretada na sequência de sentença transitada em julgado. É que, contrariamente ao propugnado no entendimento que fez maioria, estamos perante uma ingerên- cia claramente gravosa no direito de propriedade. Que, sem limite temporal definido, priva o proprietário não só do direito de disposição, antes inviabiliza, identicamente, o uso e fruição do bem. Que fica à guarda do processo e pode mesmo ser afetado a fins absolutamente estranhos ao arguido nos termos do Decreto-Lei n.º 11/2007, de 19 de janeiro, diploma que estabelece o regime jurídico da avaliação, utilização e alienação de bens apreendidos pelos órgãos de polícias criminal. Tudo a contribuir, como tal, para a consideração de que a apreensão para garantia patrimonial surge, efetivamente, como norma restritiva de direitos. E que obriga, como tal, à mobilização de um juízo de ade- quação, necessidade e proporcionalidade que só pode ser materializado pelo juiz de instrução com carácter prévio. Efetivamente, tal figura reclama, “para além de um regime irredutivelmente diferenciado, um discurso epistemológico-hermenêutico autónomo e incomunicável. Que, por vias disso, só pode ser subjetivizado por uma diferente instância formal de controlo, portadora de diferente estatuto e obedecendo a uma realidade distinta. Uma coisa é, com efeito, o juízo de pendor criminalístico, atinente à fecundidade heurístico-pro- batória sobre que assenta a apreensão para efeito de prova; coisa completamente outra é a qualificação de um bem como preço, lucro ou recompensa do crime e a sua antecipação como objetos idóneos da decisão de perda a favor do Estado, sobre que assenta a apreensão para efeitos de garantia da eficácia da decisão de perda. Ali está em causa um juízo perfeitamente ajustado à instância que compete dirigir o inquérito; aqui um juízo de índole claramente subsuntiva de factos em previsões normativas e, como tal, só ao alcance de um juiz” (Costa Andrade/ Maria João Antunes, Ob. cit ., p. 369). – Manuel da Costa Andrade . Anotação: 1 – Acórdão publicado no Diário da República , II Série, de 8 de outubro de 2019. 2 – Os Acórdãos n. os 76/85, 236/86 e 7/87 estão publicados em Acórdãos, 5.º, 8.º e 9.º Vols., respetivamente. 3 – Os Acórdãos n. os 340/87, 23/90 e 198/90 estão publicados em Acórdãos, 10.º, 15.º e 16.º Vols., respetivamente. 4 – Os Acórdãos n. os 188/91 e 193/91 estão publicados em Acórdãos, 19.º Vol. 5 – Os Acórdãos n. os 630/95, 329/99 e 425/00 estão publicados em Acórdãos, 32.º, 44.º e 48.º Vols., respetivamente. 6 – Os Acórdãos n. os 391/02, 374/03 e 395/04, estão publicados em Acórdãos, 54.º, 56.º e 59.º Vols., respetivamente. 7 – Os Acórdãos n. os 358/05, 67/06 e 159/07 estão publicados em Acórdãos, 62.º, 64.º e 68.º Vols., respetivamente. 8 – Os Acórdãos n. os 450/07 e 620/07 estão publicados em Acórdãos, 70.º Vol. 9 – Os Acórdãos n. os 294/08, 309/09 e 474/12 estão publicados em Acórdãos, 72.º, 75.º e 85.º Vols., respetivamente. 10 – Os Acórdãos n. os 127/13 e 392/15 estão publicados em Acórdãos, 86.º e 93.º Vols., respetivamente.

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