TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 105.º Volume \ 2019
330 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL ex. dever de uso (artigo 88.º) e condicionamento (artigo 90.º, n.º 2) de meios de produção, ambiente, urbanismo, segurança e saúde públicas, património cultural e natural». Com efeito, reconduzindo-se o direito de propriedade a um direito de natureza análoga à dos direitos, liberdades e garantias «naquilo que represente de espaço de autonomia perante o Estado» (Jorge Miranda, ob . cit ., loc cit. ), só é possível encontrar sentido numa tal garantia (de autonomia na esfera patrimonial da titularidade) quando associada a possibilidade de utilização dos bens livre e no interesse próprio. A existência de projeções diferenciadas da garantia constitucional da propriedade privada foi enunciada pelo Tribunal Constitucional logo no Acórdão n.º 76/85, Plenário, ponto III.A.2., o que tem sido repetido em numerosos arestos posteriores. Ora, às diferentes faculdades correspondem também dimensões tutelado- ras diferenciadas. Como notado pelo Conselheiro Joaquim de Sousa Ribeiro ( O direito de propriedade privada na juris- prudência do Tribunal Constitucional, Relatório português apresentado à Conferência Trilateral Espanha/Itália/ Portugal, outubro de 2009, disponível em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/ctri.html ): «A aglutinação deste conjunto diversificado de faculdades dentro do conceito de propriedade privada objeto de tutela constitucional não significa que elas comunguem do mesmo regime, ficando sujeitas a um tratamento unitário. A observação remete para a aplicação parcial, neste âmbito, do regime dos “direitos, liberdades e garantias”. (…) [Q]uanto à qualificação do direito de propriedade privada como direito fundamental de natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias, pode dizer-se que se observa na jurisprudência do TC uma certa evolução, no sen- tido de uma progressiva sedimentação de uma precisão delimitativa. Numa primeira e curta fase, observa-se que a equiparação é afirmada sem qualquer restrição – cfr., por exem- plo, os Acórdãos n. os 25/85 e 236/86. Mas, logo de imediato, começou a despontar uma orientação cingindo a natureza análoga ao “núcleo garantístico essencial” do direito de propriedade privada. Essa fórmula foi utilizada pelo Acórdão n.º 404/87, que julgou a conformidade constitucional do regime de aquisição forçada da propriedade pelo colono-rendeiro. Aí se pode ler, em trecho depois parcialmente transcrito nos Acórdãos n. os 194/89 e 195/89: «Certo que o direito à propriedade privada não é elencado pela Constituição portuguesa entre os chamados “direitos, liberdades e garantias”, mas deve entender-se que é um direito fundamental a estes análogo, e sujeito, por consequência, e por força do artigo 17.º da Constituição, ao respetivo regime jurídico (incluindo aí a reserva parlamentar), se não, porventura em todos os aspetos do seu estatuto e regulamentação, ao menos naqueles (como é agora o caso) que são verdadeiramente significativos e determinantes da sua caracterização como garantia cons- titucional». (…) Mas, já no Acórdão n.º 329/99, se operam concretas determinações, positiva e negativa, da qualificação como direito de natureza análoga, deixando-se expresso que faz parte do núcleo essencial da propriedade privada, reves- tindo-se dessa natureza, “o direito de cada uma a não ser privado da sua propriedade, salvo por razões de utilidade pública”, não se incluindo nesse núcleo, pelo contrário, “os direitos de urbanizar, lotear e edificar”. De imediato acolhida nos Acórdãos n. os 377/99 e 517/99, esta concretização do critério distintivo da pertença ou não ao núcleo ou dimensão essencial do direito de propriedade tornou-se jurisprudência firme do TC, mantida até hoje. Em arestos posteriores, houve oportunidade de especificar outras faculdades excluídas do núcleo essencial do direito de propriedade e, por via disso, do regime próprio dos direitos, liberdades e garantias. Assim se pronuncia- ram, quanto ao direito de apropriação, os Acórdãos n. os 187/01 e 139/04. No mesmo sentido, quanto ao direito de transmissão, decidiram o primeiro desses Acórdãos e o Acórdão n.º 425/00».
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