TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 105.º Volume \ 2019
316 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 7. O processo de fiscalização concreta de constitucionalidade surge entre nós como um processo inci- dental através do qual se atribui aos juízes de todos os tribunais o dever de apreciar, nos feitos que lhes são submetidos, a conformidade à Lei Fundamental das normas a aplicar ao caso concreto sujeito a decisão (artigo 204.º da CRP). De acordo com o preceituado no artigo 280.º da CRP e no artigo 70.º da LTC, são as seguintes, em termos genéricos, as decisões de que cabe recurso de constitucionalidade para o Tribunal Constitucional: a) decisões que recusem a aplicação de certa norma com fundamento em inconstitucionalidade [artigo 280.º, n.º 1, alínea a) , da CRP, e artigo 70.º, n.º 1, alínea a) , da LTC]; b) decisões que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo [artigo 280.º, n.º 1, alínea b) , da CRP e artigo 70.º, n.º 1, alínea b) , da LTC]; c) decisões que apliquem norma anteriormente julgada inconstitucional pelo Tribunal Constitucional [artigo 280.º, n.º 5, da CRP e artigo 70.º, n.º 1, alínea g) , da LTC] ou já anteriormente julgada inconstitucional pela Comissão Constitucional [artigo 70.º, n.º 1, alínea h) , da LTC]. 8. Os recursos de decisões que recusem a aplicação de qualquer norma com fundamento na sua incons titucionalidade [alínea a) ] são de interposição obrigatória para o Ministério Público se a norma constar de convenção internacional, de ato legislativo ou de decreto regulamentar – artigo 280.º, n.º 3, da CRP. Os recursos das decisões que apliquem norma de que tenha sido suscitada durante o processo a respetiva inconstitucionalidade [alínea b) ] só podem ser interpostos pela parte que tenha suscitada tal questão (artigo 280.º, n.º 4, da CRP e artigo 72.º, n.º 2, da LTC) e apenas cabem de decisões que não admitam recurso ordinário, por a lei o não prever ou por já haverem sido esgotados os que no caso cabiam (artigo 70.º, n.º 2, da LTC). No caso de decisões que apliquem normas constantes de convenção internacional, ato legislativo ou decreto regulamentar já anteriormente julgadas inconstitucionais quer pelo Tribunal quer pela Comissão Constitucional [alínea c) ], o recurso é obrigatório para o Ministério Público. Esta regra tem como exceção as decisões conformes com a orientação que se encontre já estabelecida, a respeito da questão em causa, em jurisprudência constante do Tribunal Constitucional. 9. No caso em apreço, o Mm.º juiz a quo recusou a aplicação da norma constante do artigo 178.º, n. os 1 e 3, do CPP, enquanto defere ao Ministério Público a competência para autorizar, ordenar ou validar a apreensão de objetos que constituam o lucro, o preço ou a recompensa do crime, por violação do artigo 32.º, n.º 4, da CRP, pelo que estamos perante uma decisão em que o recurso por parte do Ministério Público é obrigatório (artigo 280.º, n.º 3, da CRP e artigo 72.º, n.º 3, da LTC). Nestes casos, a obrigatoriedade do recurso oficioso justifica-se pelo princípio da presunção da constitu- cionalidade das leis e atos com valor equivalente (princípio do favor legis ), pretendendo-se evitar que os atos normativos de maior relevo do ordenamento jurídico possam ser desaplicadas por decisões dos tribunais sem que o Tribunal Constitucional – que detém a competência específica para administrar a justiça em matérias de natureza jurídico-constitucional – tenha a última palavra sobre a questão de constitucionalidade. Como refere Gomes Canotilho (in Direito Constitucional, 4.ª edição, p. 801), os recursos facultativos de partes e os recursos obrigatórios do Ministério Público têm lógicas diferentes. Os primeiros destinam-se, em geral, a defender interesses subjetivos (mas não só), o que justifica o seu carácter facultativo. Os segundos destinam-se a salvaguardar princípios objetivos de ordem jurídico-constitucional, assim se explicando o seu carácter obrigatório. Relativamente à questão de saber se os recursos de constitucionalidade interpostos ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC devem ser diretamente para o Tribunal Constitucional (por oposição à necessidade de esgotamento dos recursos ordinários), o Acórdão n.º 193/91, deste Tribunal, veio dissipar eventuais dúvidas ao fazer constar o seguinte:
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