TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 105.º Volume \ 2019

249 acórdão n.º 365/19 Artigo 15.º Entrada em vigor […] 5 – A alteração efetuada pelo presente decreto-lei à alínea l) do n.º 1 do artigo 4.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, aprovado pela Lei n.º 13/2002, de 19 de fevereiro, em matéria de ilícitos de mera orde- nação social por violação de normas de direito administrativo em matéria de urbanismo, entra em vigor no dia 1 de setembro de 2016. Considerando que o critério resultante da concatenação dos artigos 4.º, n.º 1, alínea l) , do ETAF, e 62.º, n.º 1, do RGCO, ao impor como momento relevante para «determinar o tribunal competente em razão da matéria o da apresentação a juízo do processo de impugnação de coima pelo Ministério Público», é incompa- tível com o princípio do juiz natural ou legal, acolhido no n.º 9 do artigo 32.º da Constituição, o tribunal a quo recusou a sua aplicação ao caso concreto, tendo-o feito com base numa fundamentação que, apesar de não ter prescindido da crítica, designadamente nos planos sistemático e teleológico, à interpretação da lei ordinária sufragada pelo Tribunal de Conflitos, é decisivamente suportada por um juízo de inconstitucionalidade. Pressupondo acertadamente a existência, também na Constituição, de uma identidade ou homologia entre o processo contraordenacional e o processo penal em grau suficiente para justificar a sujeição daquele primeiro à incidência do princípio do juiz natural ou juiz legal acolhido no n.º 9 do respetivo artigo 32.º – pressuposto que, conforme adiante melhor se verá, não é sequer indispensável para situar o caso sub judicie no âmbito de aplicação do referido preceito constitucional –, o tribunal recorrido definiu seguidamente o alcance de tal princípio em matéria contraordenacional, considerando dele resultar que o momento relevante para a determinação da jurisdição materialmente competente para a apreciação dos recursos de impugnação interpostos de decisões administrativas aplicativas de coima só pode ser aquele em que o ilícito-típico tiver sido praticado, devendo considerar-se consequentemente vedada pela proibição de desaforamento qualquer norma que venha a atribuir competência para o julgamento de tais recursos a tribunal diverso, sempre que posterior ao momento em que a prática de tal ilícito tiver tido lugar. Aplicando tal entendimento ao caso sub judice , o juiz a quo concluiu que a única interpretação dos artigos 4.º, n.º 1, alínea l) do ETAF, na redação introduzida pelo Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 2 de outubro, e 61.º, n.º 2, do RGCO, compatível com o artigo 32.º, n.º 9, da Constituição, passaria por considerar que a competência que o referido Decreto-Lei, através da alteração daquele primeiro preceito, veio atribuir aos tri- bunais administrativos para a apreciação das impugnações judiciais «de decisões da Administração Pública que apliquem coimas no âmbito do ilícito de mera ordenação social por violação de normas de direito administra- tivo em matéria de urbanismo», apenas abrange os processos cujos ilícitos hajam sido praticados em momento posterior, e não também anterior, ao dia da entrada em vigor dessa mesma alteração, ou seja, de acordo com a norma transitória constante do n.º 5 do artigo 15.º do Decreto-Lei n.º 214-G/2015, a 1 de setembro de 2016. Assim, tendo em consideração que a contraordenação por cuja prática foi sancionada a aqui recorrida ocorrera em 31 de abril de 2014 e, bem assim, que, nessa data, a competência para o julgamento dos cor- respondentes recursos de impugnação se encontrava atribuída à jurisdição comum, o tribunal recorrido recusou a aplicação da norma subjacente ao juízo decisório formulado no acórdão proferido pelo Tribunal dos Conflitos, que, conforme se viu, elegeu como momento relevante para a determinação da lei aplicável em matéria de aferição da jurisdição competente o da apresentação dos autos em juízo pelo Ministério Público, verificada, no caso, em 19 de setembro de 2016, data em que era já aplicável a alínea l) do n.º 1 do artigo 4.º do ETAF, na redação introduzida pelo Decreto-Lei n.º 214-G/2015, de 2 de outubro. 12. Conforme notado pelo Ministério Público nas respetivas alegações, ao juízo de inconstitucionali- dade formulado pelo tribunal recorrido encontra-se subjacente um entendimento demasiado amplo, senão mesmo equivocado, do sentido do princípio do juiz natural ou legal e respetivo âmbito de proteção.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=