TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 105.º Volume \ 2019
230 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL desde o início, que ao processo era conferida natureza urgente, por força da circunstância de ter arguidos sujeitos a medidas de coação privativas da liberdade, o que implicava, por razões de celeridade – que concomitantemente servem a ideia de prolação de justiça em tempo razoável e os interesses dos arguidos – que os prazos da prática dos atos se não interrompessem ou suspendessem aquando das férias judiciais. A circunstância do processo ter natureza urgente implica uma maior celeridade na prática dos atos do processo também para o Juiz, a quem a lei impõe a necessidade de fixar a data de audiência com precedência sobre qualquer outro julgamento (artigo 312.º, n.º 3, do Código de Processo Penal), obrigação ancorada na prossecução do desiderato de garantia de uma justiça administrada de forma célere. Como se assinalou no Acórdão n.º 486/16 (na senda de outros acórdãos, designadamente, os Acórdãos n. os 122/02 e 46/05), a garantia de acesso ao direito e à justiça é compatível com a imposição, pelo legislador ordinário, de normas que acarretam ónus processuais, como sejam a prática do ato de interposição de recurso nas férias judiciais, dado que tal determinação não implica para o recorrente qualquer agravamento da sua situação processual. Além disso, no caso dos processos com arguidos sujeitos a medida de coação privativa da liberdade, a não suspensão da contagem de prazos durante as férias judiciais radica a sua teleologia nas exigências de celeridade e prioridade que devem nortear estes processos, mostrando-se, por isso, indelevelmente conexionada com os fins funcionalmente prosseguidos no processo penal, sem que constitua um ónus formal, arbitrário ou desprovido de sentido útil (artigo 18.º, n.º 2, da Constituição). 8. No que respeita ao outro parâmetro convocado – o direito ao recurso previsto no n.º 1 do artigo 32.º da Constituição – adianta-se, desde já, que o mesmo também não se acha inobservado. Este Tribunal Constitucional tem uma jurisprudência consolidada no sentido de que no número 1, do artigo 32.º da Constituição se consagra o direito ao recurso em processo penal, como uma das mais relevantes garantias de defesa do arguido (v., os Acórdãos n. os 482/14, 584/16, 29/16, 672/17, 232/18, 595/18, 677/18). Como se assinalou no acórdão n.º 186/19, a jurisprudência jusfundamental tem também reconhecido que a modelação legislativa do processo penal, mesmo no que tange ao exercício do direito ao recurso, não pode deixar de obedecer a exigências de racionalização e celeridade que igualmente decorrem da Constituição e «encontra[m] justificação, não apenas na necessidade de garantir proteção rápida e eficaz aos bens jurídicos tutelados pelo direito penal (artigo 40.º do Código Penal), como no próprio princípio da presunção de inocência do arguido (artigo 32.º, n.º 2, pri- meira parte, da Constituição), que é naturalmente incompatível com o atraso ou prolongamento indefinido de um processo que visa determinar a sua responsabilidade criminal em face da acusação formal da prática de um ou mais crimes (…).» Ora, como é bom de ver, a circunstância de a decisão recorrida ter interpretado os artigos 103.º, n.º 2, alínea a) e 104.º, n.º 2, ambos do Código de Processo Penal, como impondo ao arguido, não privado da liberdade, o ónus processual de praticar o ato de interposição de recurso, sem atender à suspensão de prazos provocada pelas férias judiciais, não comporta qualquer compressão ou entrave ao seu direito ao recurso, o qual se manteve intocável, à sua plena disposição e foi, aliás, exercido – simplesmente foi-o extemporaneamente. 9. Finalmente, quanto à invocada preterição do princípio da igualdade previsto no artigo 13.º da Constituição, retoma-se a fundamentação desenvolvida no Acórdão n.º 384/93 deste Tribunal: «De facto, e como se expôs naquele Acórdão n.º 213/93, o legislador, ao adoptar um regime distinto de contagem dos prazos processuais nos processos em que haja arguidos detidos ou presos e nos processos em que não haja arguidos detidos ou presos, teve antes de tudo em consideração a defesa de valores constitucional- mente relevantes, como os da celeridade e eficiência da justiça criminal, da liberdade do arguido e da eficiência do sistema penal. E, «uma vez que todos os intervenientes processuais, sempre que haja arguidos detidos ou presos, estão sujeitos à mesma regra de celeridade, não ocorre qualquer afronta à regra da igualdade constitu- cionalmente consagrada».
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