TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 105.º Volume \ 2019
224 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL A qualificação como contribuição só se torna mais problemática porque o sujeito passivo pode não ser causador ou beneficiário das prestações administrativas que a contribuição visa remunerar. Porém, atenta a finalidade compensatória, a falta de adequação da base subjetiva de incidência ao custo ou benefício não desvirtua a natureza paracomutativa própria das contribuições, já que foi criado para acorrer ao financia- mento do SIRCA, e não para realizar tarefas que respeitem ao todo da comunidade. Não obstante aquele problema colocar um “caso difícil” de qualificação, é no plano da legitimidade material do tributo que deve ser resolvido. 10. No plano constitucional, os tributos comutativos – taxas e contribuições – legitimam-se pelo princípio da equivalência, enquanto expressão do princípio da igualdade. Como já se disse, a equivalência como critério de igualdade vincula o legislador a adequar os tributos comutativos aos custos e benefícios das prestações que estão em jogo. De modo que a primeira consequência que se pode extrair do princípio da equivalência é a proibição do legislador criar categorias tributárias dessa natureza sobre factos que não revelem custos ou benefícios a compensar. Portanto, a Constituição impõe que o legislador conforme os diversos elementos constitutivos dos tributos comutativos em função do custo e benefício das prestações que visam compensar, designadamente a base de incidência objetiva e subjetiva. No que se refere à base subjetiva de incidência, o princípio da equivalência exige que o custo ou o bene- fício da prestação administrativa efetiva ou presumida seja suportado pelo causador ou beneficiário. No caso das contribuições, porque se dirigem à compensação de um conjunto mais largo de prestações presumidas, o universo dos sujeitos passivos tem que ser identificado pela pertença ao grupo de sujeitos passivos que as provoca ou aproveita em comum. Como refere Sérgio Vasques, «a exigência elementar do princípio da equi valência está em prevenir que se isolem grupos de pessoas às quais não estejam presumivelmente associados custos ou benefícios comuns. A preocupação essencial que o princípio da equivalência aqui nos deve inspirar é a de prevenir que as contribuições sirvam a uma tributação predatória e de assegurar que a presunção em que assentam pode, com alguma razoabilidade, ser referida ao universo de pessoas do qual as contribuições são exigidas» ( Ob . cit . pp. 513 e 514). Ora, a exigência que o princípio da equivalência faz à delimitação da base de incidência subjetiva de um tributo com a natureza de contribuição não foi cumprida pela norma que se estrai do n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 19/2011, de 7 de fevereiro. Com efeito, os estabelecimentos de abate não são os causadores nem tão pouco os beneficiários diretos das prestações associadas ao SIRCA, já que os destinatários deste ser- viço são os detentores dos animais mortos nas explorações de onde são removidos pela entidade pública para efeitos de análise e destruição por inceneração ou outra forma cientificamente apropriada. As alíneas a) e b) do n.º 1 daquele artigo 2.º orientam a contribuição à compensação dos custos do SIRCA provocados pelos sujeitos passivos: a “taxa” é fixada, «de acordo com o princípio da proporcionali- dade, não devendo ultrapassar os custos associados». Ora, a estruturação da contribuição pelo princípio da cobertura de custos torna mais claro que os estabelecimentos de abate não são os causadores desses custos. Os custos associados ao SIRCA, nomeadamente, os custos administrativos, de recolha, de análise, de trans- porte e de destruição dos animais mortos nas explorações, são exclusivamente provocados pelos produtores ou detentores desses animais. Aliás, se os titulares das explorações não atuarem o SIRCA, porque dispõem de um sistema próprio de recolha e destruição autorizado pela DGAV, não se constitui a obrigação tributária, não obstante se ter verificado o facto tributário (n.º 4 do artigo 2.º). Ou seja, o tributo não é cobrado rela- tivamente aos animais apresentados para abate que sejam provenientes de explorações que assegurem, por si ou através de organizações de produtores, a recolha, transporte e destruição dos animais mortos nas suas explorações, o que significa que os provocadores dos custos SIRCA são apenas aqueles que não dispõem de plano de destruição dos cadáveres. Ainda que se considere que a contribuição também está orientada à compensação do benefício – e não parece ser essa a intenção do legislador – não se vislumbra que vantagens o SIRCA proporciona aos esta- belecimentos de abate. De facto, os matadouros não constituem os imediatos beneficiários das prestações
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