TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 105.º Volume \ 2019

212 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL tal, afigura-se desconforme a tal princípio configurá-lo não como substituto tributário, com ou sem retenção, mas como contribuinte direto. Entendemos, pois, ser inconstitucional, por violação do princípio da igualdade, na sua dimensão de equiva- lência (artigo 13.º da Constituição), a taxa “SIRCA” tal como configurada pelo Decreto-Lei n.º 19/2011, de 7 de fevereiro, na medida em que configura o “estabelecimento de abate” como contribuinte direto do tributo, quando o presumível beneficiário do serviço que esta se destina a financiar é, não ele, mas o titular da exploração». Não obstante o acórdão não se referir expressamente a uma norma ou interpretação normativa arguida de inconstitucionalidade, mas antes, genericamente, ao “regime jurídico” configurado no Decreto-Lei n.º 19/2011, de 7 de fevereiro (com a redação conferida pelo artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 38/2012, de 16 de fevereiro), a norma que foi efetivamente desaplicada, por violação do princípio da igualdade tributária, está integrada o n.º 1 do artigo 2.º daquele diploma, no segmento em que define a incidência subjetiva do tributo. De facto, é essa a norma visada no acórdão recorrido quando refere que a taxa “SIRCA” é inconsti- tucional, «na medida em que configura o “estabelecimento de abate” como contribuinte direto do tributo, quando o presumível beneficiário do serviço que esta se destina a financiar é, não ele, mas o titular da explo- ração». Assim, tal como indicado no requerimento de interposição de recurso e nas alegações, o objeto material do recurso é constituído pela norma extraída do n.º 1 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 19/2011, de 7 de fevereiro, alterado pelo Decreto-Lei n.º 38/2012, de 16 de fevereiro, na medida em que impõe aos estabe- lecimentos de abate a cobrança de uma taxa para efeitos de financiamento do sistema de recolha de cadáveres de animais mortos nas explorações. 5. Assim delimitado o objeto material do recurso, impõe-se antes de mais enquadrar a denominada “taxa SIRCA” no sistema tributário, começando por conhecer as razões que levaram à sua criação, assim como a evolução do respetivo regime legal. Na origem do tributo esteve a adoção pela União Europeia de sucessivas medidas de proteção da saúde humana e animal em relação ao risco causado por encefalopatias espongiformes transmissíveis (EET), que se acentuou com o aparecimento em 1996 da nova variante da doença de Creutzfeld-Jakob , cujo agente tinha semelhanças com o da encefalopatia espongiforme bovina (BSE). Entre as várias “medidas de emergência”, a então Comissão das Comunidades Europeias proibiu o Reino Unido de expedir do seu território bovinos e seus derivados orgânicos e transformados, impondo aos demais Estados-membros a adoção de medidas internas que se conformassem com essa proibição (Decisões da Comissão n. os 96/239/CE, de 27 de março de 1996, alterada pela Decisão da Comissão n.º 96/362/CE, de 11 de junho de 1996 e 96/449/CE, de 18 de julho de 1996, e 97/534/CE, de 30 de julho de 1997) Na sequência dessas decisões, Portugal elaborou um plano de erradicação da BSE que previu o abate compulsivo e destruição de todos os animais da espécie bovina e seus co-habitantes nas explorações onde ocorressm casos de BSE – aprovado pela Decisão da Comissão n.º 96/381/CE, de 20 de junho de 1996 –, no qual se comprometeu a pôr em vigor medidas legislativas, regulamentares e administrativas necessárias à sua aplicação. Assim, após ter começado por interditar a utilização, para qualquer fim, com exceção de fins científicos, produtos de origem bovina provenientes de animais que apresentassem sintomatologia de encefalopatia espongiforme e interditar a entrada, por qualquer forma, na cadeia alimentar humana, bem como a deten- ção e comercialização para esse efeito, de determinados materiais de risco especificado (artigos 1.º e 2.º do Decreto-Lei n.º 32-A/97, de 28 de janeiro), criou um quadro global de combate à BSE composto por três diplomas complementares: (i) o Decreto-Lei n.º 387/98, de 4 de dezembro, que estendeu o regime de interdição de utilização de produtos bovinos e de entrada na cadeia alimentar humana e animal de matérias de risco especifi- cado (MRE) aos produtos de origem ovina e caprina e estabeleceu os procedimentos necessários à

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