TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 105.º Volume \ 2019

209 acórdão n.º 344/19 Assembleia da República não pode impedir o Governo de aprovar a criação de contribuições financeiras individua- lizadas no exercício de uma competência concorrente, sem prejuízo da Assembleia sempre poder revogar, alterar ou suspender o respetivo diploma, no exercício dos seus poderes constitucionais”. 9.ª) No caso vertente, a definição dos elementos essenciais da taxa SIRCA, enquanto “contribuição financeira”, nomeadamente a respetiva incidência objetiva e subjetiva e alíquota consta precisamente de um diploma legal, emanado pelo Governo [Decreto-Lei n.º 19/2011, cit., nomeadamente art. 2.º, n.º 1, als. a) e b) ]. 10.ª) Posto isto, é manifesto que concorremos com a qualificação do tributo em causa como “contribuição financeira”, tal como estabelecido na decisão recorrida. 11.ª) Porém, já não podemos acompanhar em todo o seu alcance a afirmação ali aduzida segundo a qual “é o titular da exploração, e não o estabelecimento de abate, aquele que diretamente beneficia da existência e funcio- namento do “SIRCA”, o menos e na exata medida em que (além dos apresentantes do gado) os “estabelecimentos de abate”, nos termos já discriminados, podem aproveitar as prestações administrativas financiadas pela receita da “taxa SIRCA”, e isso é suficiente (e necessário) para efeitos da qualificação do tributo como “contribuição finan- ceira”. 12.ª) Consequentemente, como corolário do que ficou exposto, não podemos aplaudir a conclusão do acórdão recorrido, em sede da consideração da incidência subjetiva da taxa SIRCA, segundo a qual a contribuição finan- ceira em causa é “inconstitucional, por violação do princípio da igualdade, na sua dimensão de equivalência (artigo 13.º da Constituição)”. 13.ª) Na verdade, o critério da equivalência, enquanto concretização do princípio da igualdade tributária, e da igualdade tout court (Constituição, art. 13.º, n. os 1 e 2), é um método destinado a apurar dos requisitos de legitima- ção material das “contribuições financeiras”, no caso em sede da definição da respetiva incidência subjetiva, mor- mente para apurar se procede uma relação de paracomutatividade (prestações presumidas) entre sujeitos passivos e prestações administrativas financiadas com o produto da receita do tributo em causa. 14.ª) Como sucede como o controlo realizado através do princípio da igualdade, enquanto “proibição do arbí- trio”, que fulmina apenas as soluções legais manifestamente arbitrárias e destituídas de bons e racionais fundamen- tos, o critério da equivalência, enquanto expressão da igualdade tributária, tem por genuína valência impedir que as “contribuições financeiras” estejam desprovidas de uma presumível relação compensatória como os respetivos sujeitos passivos, ou seja, que estejam radicalmente destituídas de caráter paracomutativo. 15.ª) No caso em apreço, concretamente, o critério da equivalência somente poderia determinar a desconfor- midade constitucional de uma solução legal que incluísse no domínio da incidência subjetiva desta “contribuição financeira” um grupo de sujeitos passivos que não desse causa, ou não aproveitasse, de todo, as prestações admi- nistrativas custeadas com a receita do tributo em apreço, o que não é o caso como ficou já exposto, pois de outro a decisão constitucional consubstanciaria juízos positivos de política legislativa, usurpando o monopólio do legisla- dor democrático, e correspondentemente” estariam a ditar sentenças constitucionais “aditivas, de princípio”, sem base legal ou jurisprudencial para tanto. 3. Nas contra-alegações, a recorrida concluiu o seguinte: A) É notório que um Sistema de Recolha de Cadáveres de Animais Mortos em explorações agrícolas nada tem que ver com os matadouros que pressupõem, obviamente, que os animais lá cheguem vivos, sendo que o SIRCA cuida única e exclusivamente da recolha dos animais mortos sem que essa morte resulte de abate nos matadouros; B) Não se deverá fazer qualquer censura ao douto acórdão recorrido que, muitíssimo bem preferiu a Constituição à Lei, ora em crise, terminando, aliás, com uma prática de querer cegamente taxar da maneira mais fácil, com absoluta indiferença sobre a identidade dos verdadeiros beneficiários do serviço financiado pela taxa em apreço; C) É inconcebível como pode ser criada uma taxa com uma específica intencionalidade e, por isso, com um espe- cífico sujeito passivo e, a partir de certo momento, continuar a ser aplicada essa mesma taxa em alegada contra- partida da prestação do mesmo serviço (a recolha de animais mortos) mas com um sujeito passivo distinto;

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