TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 105.º Volume \ 2019

197 acórdão n.º 332/19 “[…] [A] introdução dessa norma constitucional (efetuada, pela revisão constitucional de 1989, quanto aos processos de contraordenação, e alargada, pela revisão de 1997, a quaisquer processos sancionatórios) o que se pretendeu foi assegurar, nesses tipos de processos, os direitos de audiência e de defesa do arguido, direitos estes que, na versão originária da Constituição, apenas estavam expressamente assegurados aos arguidos em processos disciplinares no âmbito da função pública (artigo 270.º, n.º 3, correspondente ao atual artigo 269.º, n.º 3). Tal norma implica tão‑só ser inconstitucional a aplicação de qualquer tipo de sanção, contraordenacional, administrativa, fiscal, laboral, disciplinar ou qualquer outra, sem que o arguido seja previamente ouvido (direito de audição) e possa defender‑se das imputações que lhe são feitas (direito de defesa), apresentando meios de prova e requerendo a realização de diligências tendentes a apurar a verdade (cfr. Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada , tomo I, Coimbra, 2005, p. 363). É esse o limitado alcance da norma do n . º 10 do artigo 32 . º da CRP, tendo sido rejeitada, no âmbito da revisão constitucional de 1997, uma proposta no sentido de se consagrar o asseguramento ao arguido, “nos processos disciplinares e demais processos sancionatórios”, de “todas as garantias do processo criminal” (artigo 32.º‑B do Projeto de Revisão Constitucional n.º 4/VII, do PCP; cfr. o correspondente debate no Diário da Assembleia da República , II Série‑RC, n.º 20, de 12 de setembro de 1996, pp. 541‑544, e I Série, n.º 95, de 17 de julho de 1997, pp. 3412 e 3466). Mas, como se reconheceu nesse Acórdão n.º 659/06, é óbvio que não se limitam aos direitos de audição e defesa as garantias dos arguidos em processos sancionatórios, mas é noutros preceitos constitucionais, que não no n.º 10 do artigo 32.º, que eles encontram esteio. É o caso, desde logo, do direito de impugnação perante os tribu- nais das decisões sancionatórias em causa, direito que se funda, em geral, no artigo 20.º, n.º 1, e, especificamente para as decisões administrativas, no artigo 268.º, n.º 4, da CRP. E, entrados esses processos na “fase jurisdicio- nal”, na sequência da impugnação perante os tribunais dessas decisões, gozam os mesmos das genéricas garantias constitucionais dos processos judiciais, quer diretamente referidas naquele artigo 20.º (direito a decisão em prazo razoável e garantia de processo equitativo), quer dimanados do princípio do Estado de direito democrático (artigo 2.º da CRP) (…). […]” (sublinhados acrescentados). Ou, ainda, na formulação do Acórdão n.º 373/15: “[…] [O] conteúdo das garantias processuais é diferenciado, consoante o domínio do direito punitivo em que se situe a aplicação […] no âmbito contraordenacional, atendendo à diferente natureza do ilícito de mera ordenação e à sua menor ressonância ética, em comparação com o ilícito criminal, é menor o peso do regime garantistico, pelo que as garantias constitucionais previstas para os ilícitos de natureza criminal não são necessariamente aplicáveis aos ilícitos contraordenacionais ou a outros ilícitos no âmbito de direito sancionatório (cfr., neste sentido, entre muitos outros, os Acórdãos n. os 158/92, 50/99, 33/02, 659/06, 99/09 e 135/09). […]”. Em suma, nas palavras do Acórdão n.º 123/18, “[…] as garantias de processo sancionatório […] não têm, no domínio contraordenacional, o mesmo peso axiológico que têm no âmbito criminal”. Tendo presente a diferente densidade da proteção conferida pelo n.º 10 do artigo 32.º da Constituição, resulta evidente que a dimensão normativa em causa nos presentes autos – referida à suspensão preventiva – não acarreta violação dos direitos de audição e de defesa consagrados naquele preceito, nem de quaisquer garantias do processo sancionatório. O que está em causa, segundo a decisão recorrida e no enquadramento sustentado pelo recorrido e pelo recorrente Ministério Público, é, no essencial, a duração da medida de sus- pensão, o que não contende, propriamente, com as garantias defesa.

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