TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 105.º Volume \ 2019
179 acórdão n.º 332/19 gerais. Em todos estes casos, a persistência de uma dúvida razoável após a produção da prova tem de atuar em sentido favorável ao arguido e, por conseguinte, conduzir à consequência imposta no caso de se ter logrado a prova completa da circunstância favorável ao arguido». Neste domínio, estamos em sede de fiscalização concreta de constitucionalidade. No caso em presença, deve lançar-se mão do princípio da interpretação em conformidade com a Constituição, enquanto princípio de conservação de normas. Na ‘relação concretamente existente entre a carga coativa decorrente da medida adotada e o peso específico do ganho de interesse público que com tal medida se visa alcançar’ (Ac. do Trib. Const. n.º 632/08, de 23/12/2008) – não esquecendo a ‘prerrogativa de avaliação’, o ‘crédito de confiança’ que há de ser reconhecido no exercício legiferante – o princípio da proporcionalidade aflora ainda como não preservado, também face ao princípio da presunção de inocência, quando se admita que a suspensão preventiva possa ter como limite o prazo de prescrição do procedimento criminal. Na verdade, não é consentâneo com a duração do prazo de prescrição do procedimento criminal, que no caso do inquérito criminal instaurado contra o Autor, poderá elevar-se a 10 anos. E vem vistas as coisas, a suspensão do exercício das funções de Administrador Judicial pelo tão extenso período afigura-se configurar a aplicação de uma pena sem, sequer, ter tido a oportunidade de exercer o seu direito de defesa. Quanto à questão da violação do princípio da presunção da inocência e da proporcionalidade em sede de medida de suspensão preventiva de funções, mais recentemente o Tribunal Constitucional pronuncia pelo Acórdão n . º 62/16, do qual resulta e no que de essencial importa á economia dos presentes autos, o seguinte: ‘(…) Tem-se admitido, em todo o caso, que os princípios da constituição criminal, e especificamente os previstos nos artigos 29.º e 32.º da CRP, apesar de se restringirem no seu teor literal ao direito criminal, devam valer, no essencial, e por analogia, para todos os domínios sancionatórios: o princípio da legalidade das penas, o princípio da não retroatividade e o princípio da lei mais favorável ao arguido e o princípio da culpa (acórdãos do TC n. os 161/95, 227/92, 574/95 e 160/04). A jurisprudência constitucional tem igualmente admitido, em processo disciplinar, o princípio da presunção de inocência do arguido, como decorrência do direito a um processo justo, não apenas na sua vertente probatória, correspondendo à aplicação do princípio in dubio pro reo , pelo qual é à Administração que cabe o ónus da prova dos factos que integram a infração, quer ao nível do próprio estatuto ou condição do arguido em termos de tornar ilegítima a imposição de qualquer ónus ou res- trição de direitos que, de qualquer modo, representem e se traduzam numa antecipação da condenação (assim, o acórdão do TC n.º 123/92, que julgou inconstitucional a norma que determina, na sequência da prolação do despacho de pronúncia, e durante a suspensão do exercício de funções da mesma decorrente, a perda da totalidade do vencimento). Analisando à luz desse parâmetro de constitucionalidade, a norma do artigo 6.º, n.º 1, do Estatuto Disci- plinar de 1984 (que tinha plena correspondência com a norma agora sindicada), o acórdão do Tribunal Cons- titucional n.º 439/87, pronunciou-se no sentido da não inconstitucionalidade, consignando, no essencial, o seguinte: Mas essa garantia [a presunção de inocência do arguido] não torna ilegítima toda e qualquer suspensão de funções do arguido, que seja funcionário ou agente, aplicada antes do trânsito em julgado da sentença de condenação. A própria prisão preventiva é admitida pela Constituição, «pelo tempo e nas condições que a lei determinar», no caso de «flagrante delito» ou «por fortes indícios de prática de crime doloso a que corresponda pena maior»(-). A suspensão só será constitucionalmente ilegítima quando viole o princípio da proporciona- lidade, «o qual – como se lê no citado Acórdão n.º 282/86 – encontra afloramento no artigo 18.º, n.º 2, da Constituição e sempre há de reputar-se como componente essencial do princípio do Estado de direito demo- crático (cfr. o artigo 2.º)».
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