TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 105.º Volume \ 2019

177 acórdão n.º 332/19 e da legalidade, que no âmbito do direito administrativo sancionatório, tem o conteúdo essencial de não poder haver agressão/infração/ilícito, nem suspensão ou pena que não resultem de uma lei prévia, escrita, estrita e certa, o que deriva do próprio princípio estruturante do Estado de Direito, da justiça e da proporcionalidade, cfr . artigos 2 . º, 13 . º, 18 . º, 19 . º, n . º 1, 32 . º e 266 . º da CRP . Que a medida de suspensão preventiva, aplicada sem termo, viola de forma desigualitária e desproporcionada, o direito fundamental do Autor ao exercício da sua profissão enquanto Administrador Judicial, violando os artigos 2 . º, 18 . º, 19 . º, n . º 1, 47 . º, 61 . º, n . º 1 e 266 . º da CRP . […] Vejamos. A Constituição da República Portuguesa consagra, ente as «Garantias de processo criminal», que «Todo o arguido se presume inocente até ao trânsito em julgado da sentença de condenação, devendo ser julgado no mais curto prazo compatível com as garantias de defesa.» (artigo 32.º, n.º 2, da CRP). «Tem-se admitido, em todo o caso, que os princípios da constituição criminal, e especificamente os pre- vistos nos artigos 29.º e 32.º da CRP, apesar de se restringirem no seu teor literal ao direito criminal, devam valer, no essencial, e por analogia, para todos os domínios sancionatórios: o princípio da legalidade das penas, o princípio da não retroatividade e o princípio da lei mais favorável ao arguido e o princípio da culpa (acórdãos do TC n. os 161/95, 227/92, 574/95 e 160/04). A jurisprudência constitucional tem igualmente admitido, em processo disciplinar, o princípio da presunção de inocência do arguido, como decorrência do direito a um processo justo, não apenas na sua vertente probatória, correspondendo à aplicação do princípio in dubio pro reo , pelo qual é à Administração que cabe o ónus da prova dos factos que integram a infração, quer ao nível do próprio estatuto ou condição do arguido em termos de tornar ilegítima a imposição de qualquer ónus ou res- trição de direitos que, de qualquer modo, representem e se traduzam numa antecipação da condenação (…)» (Ac. do Trib. Const. n.º 62/16, de 03-02-2016). Citando anterior jurisprudência, lembra o Tribunal Constitucional que o ‘princípio da presunção de ino- cência dos arguidos, consagrado expressamente para o processo criminal no artigo 32.º, n.º 2, da Constituição é “igualmente válido, na sua ideia essencial, nos restantes domínios sancionatórios e, agora, em particular, no domínio disciplinar’ (Ac. n.º 327/13, de 12/06/13). Como se sabe, a suspensão preventiva no domínio disciplinar tem sido considerada medida cautelar. Assim, numa primeira abordagem, poderíamos ser levados a afirmar que tal medida não se funda numa presunção de culpabilidade, não está prevista como lógica de antecipação da condenação do arguido, não brigando com a presunção de inocência (cfr., em paralelo, o Parecer do CC da PGR n.º P000261988, votado em 10-11-1988). Na determinação do princípio da presunção de inocência, Gomes Canotilho e Vital Moreira, apontam, como decorrências do seu conteúdo, as seguintes concretizações: “(a) proibição de inversão do ónus da prova em detrimento do arguido; (b) preferência pela sentença de absolvição contra o arquivamento do processo; (c) exclusão da fixação da culpa nos despachos de arquivamento; (d) não incidência de custas sobre o arguido não condenado; (e) proibição da antecipação de verdadeiras penas a título de medidas cautelares (cfr. AcTC n.º 198/90); (f ) proibição de efeitos automáticos da instauração do procedimento criminal; (g) natureza exce- cional e de última instância das medidas de coação, sobretudo as limitativas ou proibitivas da liberdade; (h) princípio in dubio pro reo , implicando a absolvição em caso de dúvida do julgador sobre a culpabilidade do acusado” ( Constituição da República Portuguesa Anotada, Volume I, Coimbra, 2007, pág. 518). No confronto entre as necessidades cautelares e a presunção de inocência o Tribunal Constitucional tem obtido ponto de equilíbrio por intervenção do princípio da proporcionalidade. Assim, por exemplo, no Ac. n.º 439/87, de 04/11/87, o Tribunal afirmou que «essa garantia não torna ilegítima toda e qualquer suspensão de funções do arguido, que seja funcionário ou agente, aplicada antes do trânsito em julgado da sentença de condenação. A própria prisão preventiva é admitida pela Constituição, «pelo tempo e nas condições que a lei determinar», no caso de «flagrante delito» ou «por fortes indícios de

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