TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019
84 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL para efeitos de apuramento do rendimento mensal do lesado, no âmbito da determinação do montante da indemnização por danos patrimoniais a atribuir ao mesmo, o tribunal apenas pode valorar os rendimentos líquidos auferidos à data do acidente, que se encontrem fiscalmente comprovados, após cumprimento das obrigações declarativas legalmente fixadas para tal período. Importa notar que os julgamentos de inconstitucionalidade, não obstante incidirem sobre o mesmo critério normativo, mobilizaram parâmetros constitucionais distintos. No Acórdão n.º 383/12, o juízo de desconformidade constitucional baseou-se na violação do direito à tutela jurisdicional efetiva, na vertente da garantia de um processo equitativo, consagrada no artigo 20.º, n.º 4, em conjugação com o artigo 18.º, n.º 2, ambos da Constituição, e do direito à justa reparação dos danos, decorrente do artigo 2.º da Constituição; já no Acórdão n.º 273/15, a censura constitucional residiu na violação da reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República em matéria de direitos, liberdades e garantias prevista no artigo 165.º, n.º 1, alínea b) , da Constituição; por fim, no Acórdão n.º 565/18, o julgamento de inconstitucionalidade radicou na violação da mencionada reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República em matéria de direitos, liberdades e garantias e do princípio da igualdade consignado no seu artigo 13.º, n.º 1. Já a Decisão Sumária n.º 520/18 remeteu para a fundamentação dos Acórdãos n. os 383/12 e 273/15. Esta diversidade quanto à fundamentação do mesmo juízo positivo de inconstitucionalidade, se não obsta à organização de um processo de generalização do juízo de inconstitucionalidade, aconselha e justi- fica que na sua apreciação em sede de fiscalização abstrata e sucessiva se tomem em consideração acrescidas preocupações de coerência ao nível do discurso fundamentador, evitando seguir vias argumentativas não indispensáveis à própria declaração de inconstitucionalidade que, pese embora a respetiva legitimidade e consequência, possam tornar menos clara e compreensível a decisão final. 6. É o seguinte o teor do n.º 7 do artigo 64.º do SORCA, na redação dada pelo Decreto-Lei n.º 153/2008: «Para efeitos de apuramento do rendimento mensal do lesado no âmbito da determinação do montante da indemnização por danos patrimoniais a atribuir ao lesado, o tribunal deve basear-se nos rendimentos líquidos aufe- ridos à data do acidente que se encontram fiscalmente comprovados, uma vez cumpridas as obrigações declarativas relativas àquele período, constantes da legislação fiscal.» Trata-se de uma norma exclusivamente aplicável a ações de responsabilidade civil cobertas por seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel – e não já a outros domínios da responsabilidade civil. O seu efeito jurídico principal é a limitação dos poderes de cognição dos tribunais em sede de apuramento do rendimento do lesado para efeitos de determinação da indemnização por danos patrimoniais. Como decorrência daquela regra, não podem ser considerados pelo tribunal rendimentos do lesado não fiscalmente comprovados: ainda que o lesado pudesse demonstrar que beneficiava de rendimentos não declarados à Administração Tributária – designadamente para reclamar indemnização como lucro cessante por força de um período de incapacidade temporária –, não pode tal prova ser atendida. A norma ora em crise não constava da redação originária do regime do SORCA, tendo sido aditada pelo Decreto-Lei n.º 153/2008, de 6 de agosto. A sua introdução foi expressamente fundamentada no respetivo preâmbulo: «[H]oje sucede que a determinação do valor dos rendimentos auferidos pelos lesados em processos de indemnização por acidente de viação, na medida em que contribuem para a definição do quantum indemniza- tório por danos patrimoniais, gera litígios evitáveis, uma vez que as seguradoras, em regra, baseiam o respetivo
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