TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019

75 acórdão n.º 181/19 beneficiário. Assim, ‘a bilateralidade das taxas não passa apenas pelo seu pressuposto, constituído por dada presta- ção administrativa, mas também pela sua finalidade, que consiste na compensação dessa mesma prestação. Se a taxa constitui um tributo comutativo não é simplesmente porque seja exigida pela ocasião de uma prestação pública mas porque é exigida em função dessa prestação, dando corpo a uma relação de troca com o contribuinte’ (Sérgio Vasques, em Manual de Direito Fiscal , p. 207, edição de 2011, Almedina). Entretanto, a revisão constitucional de 1997 introduziu, a propósito da delimitação da reserva parlamentar, a categoria tributária das contribuições financeiras a favor das entidades públicas, dando cobertura constitucional a um conjunto de tributos parafiscais que se situam num ponto intermédio entre a taxa e o imposto [artigo 165.º, n.º 1, alínea i) ]. As contribuições financeiras constituem um tertium genus de receitas fiscais, que poderão ser qua- lificadas como taxas coletivas, na medida em que compartilham em parte da natureza dos impostos (porque não têm necessariamente uma contrapartida individualizada para cada contribuinte) e em parte da natureza das taxas (porque visam retribuir o serviço prestado por uma instituição pública a certo círculo ou certa categoria de pessoas ou entidades que beneficiam coletivamente de um atividade administrativa) (Gomes Canotilho/Vital Moreira, em Constituição da República Portuguesa Anotada , I vol., p. 1095, 4.ª edição, Coimbra Editora). As contribuições distinguem-se especialmente das taxas porque não se dirigem à compensação de prestações efetivamente provocadas ou aproveitadas pelo sujeito passivo, mas à compensação de prestações que apenas presu- mivelmente são provocadas ou aproveitadas pelo sujeito passivo, correspondendo a uma relação de bilateralidade genérica. Preenchem esse requisito as situações em que a prestação poderá beneficiar potencialmente um grupo homogéneo ou um conjunto diferenciável de destinatários e aquelas em que a responsabilidade pelo financiamento de uma tarefa administrativa é imputável a um determinado grupo que mantém alguma proximidade com as finalidades que através dessa atividade se pretendem atingir (sobre estes aspetos, Sérgio Vasques, ob. cit., p. 221, e Suzana Tavares da Silva, em As taxas e a coerência do sistema tributário, pp. 89-91, 2.ª edição, Coimbra Editora). Por via da nova redação dada à norma do artigo 165.º, n.º 1, alínea i) , a Constituição autonomizou uma ter- ceira categoria de tributos, para efeitos de reserva de lei parlamentar, relativizando as diferenças entre os tributos unilaterais e os tributos comutativos e obrigando a uma reformulação da discussão sobre a exigência da reserva de lei, relativamente às contribuições especiais que não se pudessem enquadrar no preciso conceito de taxa. Como sublinha Cardoso da Costa, a este propósito, por via dessa autonomização, o teste da bilateralidade, no sentido preciso que lhe era atribuído como característica essencial do conceito de taxa, deixou de poder ser sempre decisivo para resolver os casos duvidosos ou ambíguos quanto à natureza do tributo; e deixou de poder manter-se, também, a orientação jurisprudencial que tendia a qualificar como imposto, mormente para efeito da aplicação do correspondente regime de reserva parlamentar, as receitas parafiscais que não pudessem ser qualificadas tipicamente como taxas (em ‘Sobre o Princípio da Legalidade das Taxas e das demais Contribuições Financeiras’, in Estudos em Homenagem ao Professor Doutor Marcelo Caetano , vol. I, pp. 806-807, ed. de 2006, Coimbra Editora; sobre a jurisprudência mencionada, cfr. o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 152/13).» Ora, atentas as diferenças de regime constitucional, em matéria de competência para a respetiva criação, entre contribuições e impostos, pode porventura pensar-se que a eventual qualificação do tributo em causa nos presentes autos como contribuição é suficiente para evitar o juízo de inconstitucionalidade da norma do n.º 4 do artigo 21.º da TTMO. Porém, tal conclusão revela-se inexata, pelas razões aduzidas no Acórdão n.º 848/17, no qual o Tribunal Constitucional declarou inconstitucionais, com força obrigatória geral, as normas respeitantes à criação, pelo Município de Lisboa, da denominada Taxa Municipal de Proteção Civil. Como se escreveu nesse aresto: «[O] tributo em apreço encontra-se previsto exclusivamente num regulamento municipal habilitado por uma lei que apenas prevê a aprovação de taxas (o RGTAL). Deste modo, e tal como já afirmado no Acórdão n.º 581/12, “[…] uma vez que inexiste qualquer outro diploma legal que contenha uma habilitação genérica para a aprovação pelos municípios de outro tipo de tributos, das duas uma: ou o tributo [em análise] se pode reconduzir ao conceito

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