TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019

74 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL mas já é arbitrária e ininteligível a segregação e quantificação de diversas partes integrantes da unidade, como seria a atribuição de importância relativa a cada família de instrumentos musicais numa orquestra sinfónica, a decomposição do preço de um bilhete de teatro pelas várias personagens da peça ou a quantificação do contributo para a saúde individual de cada um dos órgãos do corpo humano. Não há, na verdade, nenhuma prestação administrativa, ainda que meramente hipotética, específica e comprovadamente associada à com- ponente «depósitos subterrâneos» de uma unidade de abastecimento de combustíveis. Na medida em que pretenda revestir forma comutativa, um tributo com tal incidência objetiva não pode deixar de se ter por arbitrário; a prestação administrativa não chega a ser presumida, sendo simplesmente ficcionada. Esta conclusão é reforçada pela análise da «fundamentação económico-financeira» incluída na TTMO. Segundo a mesma, o tributo tem dois fundamentos: «o benefício obtido com a ocupação de um espaço público» e o «objetivo de racionalizar a proliferação destas ocupações». Quanto ao primeiro – a ocupação de um espaço público –, é manifesto que não se aplica aos casos em que os equipamentos estão situados em propriedade privada (ou, pelo menos, em propriedade não-munici- pal), sendo certo que o regime do tributo nem sequer distingue uns e os outros casos para efeitos de deter- minação dos montantes a pagar. Isto, está claro, se por «espaço público» não se entender qualquer espaço, independentemente da sua titularidade, «aberto ao público»; mas tal conceito não tem qualquer conexão relevante com o de prestação administrativa aproveitada ou causada pelo sujeito passivo da relação tributária, pelo que é, por essa razão, insuscetível de traduzir a comutatividade própria das taxas. Quanto ao segundo fundamento – a racionalização da atividade –, trata-se do que habitualmente se designa de «objetivo extrafiscal», no sentido em que um tributo é criado, não com o propósito exclusivo de angariar receita, mas com o fito de dissuadir a aquisição de determinados bens ou o ingresso em determina- das atividades reputadas indesejáveis ou lesivas de interesses difusos. Ora, um tributo cuja finalidade exclu- siva é a de orientar comportamentos não é, por definição, um tributo comutativo, visto que não é cobrado como contrapartida de uma prestação administrativa aproveitada ou provocada pelo sujeito passivo. Impõe-se, por estas razões, a conclusão de que o tributo sobre o «armazenamento de produtos de petró- leo (depósitos subterrâneos)», criado pelo n.º 4 do artigo 21.º da TTMO, não constitui uma taxa. 8. Firmada a conclusão de que o tributo aqui apreciado não é uma taxa – por lhe faltar a qualidade essen- cial da comutatividade –, pode o mesmo, ainda assim, constituir uma contribuição e não um imposto. De facto, encontra-se perfeitamente estabilizada na jurisprudência do Tribunal Constitucional posterior à revi- são constitucional de 1997 a conceção tripartida e gradativa dos tributos públicos – por ordem decrescente de bilateralidade: taxas, contribuições e impostos –, sintetizada do seguinte modo no Acórdão n.º 539/15: «O imposto constitui uma prestação pecuniária, coativa e unilateral, exigida com o propósito de angariação de receitas que se destinam à satisfação das necessidades financeiras do Estado e de outras entidades públicas, e que, por isso, tem apenas a contrapartida genérica do funcionamento dos serviços estaduais. O que permite compreen- der que os impostos assentem essencialmente na capacidade contributiva dos sujeitos passivos, revelada através do rendimento ou da sua utilização e do património (artigo 4.º, n.º 1, da Lei Geral Tributária). A taxa constitui uma prestação pecuniária e coativa, exigida por uma entidade pública, em contrapartida de prestação administrativa efetivamente provocada ou aproveitada pelo sujeito passivo, assumindo uma natureza sinalagmática. A taxa pres- supõe a realização de uma contraprestação específica resultante de uma relação concreta entre o contribuinte e a Administração e que poderá traduzir-se na prestação de um serviço público, na utilização de um bem do domínio público ou na remoção de um obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares (artigo 4.º, n.º 2, da Lei Geral Tributária). A taxa tem igualmente a finalidade de angariação de receita. Mas enquanto que nos impostos esse propósito fiscal está dissociado de qualquer prestação pública, na medida em que as receitas se destinam a prover indistinta- mente às necessidades financeiras da comunidade, em cumprimento de um dever geral de solidariedade, nas taxas surge relacionado com a compensação de um custo ou valor das prestações de que o sujeito passivo é causador ou

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