TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 104.º volume \ 2019
71 acórdão n.º 181/19 de 31 de dezembro, prevê no seu artigo 10.º, n.º 3, a presunção de culpa leve – que é condição suficiente da responsabilidade exclusiva do ente público – ‘sempre que tenha havido incumprimento de deveres de vigilância’. Em suma, o dever legal de fiscalização dos postos de abastecimento de combustíveis por parte das câmaras municipais cria uma presunção suficientemente forte no sentido de que a simples localização daqueles postos em determinada circunscrição concelhia é causa de uma atividade de vigilância e de ações de prevenção por parte do município correspondente, não só para dar cumprimento à lei, como principalmente para evitar que os riscos quanto à segurança de pessoas e bens, os riscos para a saúde pública e os riscos ambientais associados à existência e funcionamento daquelas instalações se materializem. (...). Aliás, estes sabem bem e à partida que, por força da lei, a existência de postos de abastecimento de combustí- veis “não localizados nas redes viárias regional e nacional” obriga os municípios em cuja circunscrição se localizem a uma ação de vigilância permanente, de modo a verificar o cumprimento permanente dos requisitos técnicos específicos desse tipo de instalações, e que vão para além das vistorias previstas e inspeções periódicas. Com efeito, a fiscalização prevista no artigo 25.º do Decreto-Lei n.º 267/2002, de 26 de novembro, não se esgota nas ações previstas no artigo 22.º do mesmo diploma nem se confunde com o cumprimento do dever geral de polícia. Assim, tal ação fiscalizadora pode ser tida como efetivamente provocada (e, em certo sentido, também aproveitada) apenas pelos proprietários dessas instalações, justificando-se, por conseguinte, o pagamento de uma compensação. Na verdade, conforme referido no artigo 3.º do RGTAL, “as taxas das autarquias locais são tributos que assen- tam na prestação concreta de um serviço público local”. No caso vertente é razoável e forte a presunção, feila a partir da natureza dos postos de abastecimento de combustíveis e dos deveres legais de fiscalização que incumbem às câmaras municipais (factos indiciários), da existência de uma atividade de vigilância permanente por parte dos serviços camarários dirigida àquele tipo de instalações e ao seu modo de funcionamento. (...). A implantação dos mesmos postos] “inteiramente” em propriedade privada ou em terrenos do domínio público municipal é, para este efeito, irrelevante, já que os riscos e a vigilância legalmente exigida são idênticos nas duas situações. O que releva é o tipo de instalação e não a natureza privada ou pública onde a mesma se encontra implantada. Mais: essa atividade de vigilância é, pela peculiaridade dos requisitos técnicos que visa controlar, exclu- sivamente imputável às ditas instalações. Nos municípios em que não se localizem lais postos de abastecimento [ou instalações de armazenamento de combustíveis], não há lugar a tal ação de vigilância». Por outro lado, o Tribunal entendeu que o tributo podia ser caracterizado como contrapartida da per- missão do exercício da atividade de exploração de postos de abastecimento de combustíveis, em virtude da qual o município se obriga perante o sujeito passivo a tolerar uma atividade que interfere a título permanente no gozo de determinados bens públicos, como o ambiente, o urbanismo, o ordenamento do território ou a gestão do tráfego. Segundo esta perspetiva, baseada no Acórdão n.º 177/10, que caracterizou como taxa um tributo incidente sobre a afixação de painéis publicitários em propriedade privada, o tributo constituía a contrapartida da remoção de um obstáculo jurídico à atividade exercida pelo sujeito passivo, através da qual o município se vinculava a uma prestação administrativa de facto negativo: «Considerando conjuntamente todos estes aspetos, a interrogação que se pode formular é a de saber se um município, obrigado a suportar permanentemente no seu espaço público interferências decorrentes de uma ativi- dade económica sujeita a procedimentos públicos de licenciamento previstos em legislação especial e igualmente aplicável à Administração municipal e à Administração central, que, todavia, não considera nem faz relevar tais impactes negativos para efeitos de fixação das taxas aplicáveis, pode, por sua iniciativa, e em ordem à prossecução das suas atribuições nos domínios afetados pela atividade licenciada, tributá-la, tomando como referência as licen- ças previamente atribuídas. Noutros termos: será que a «remoção do obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares» a que se refere o artigo 3.º do RGTAL, como pressuposto das taxas, é necessariamente específico de uma dada taxa, ou pode ser comum e, por conseguinte, valer para outras taxas conexionadas com dimensões da atividade licenciada não consideradas na fixação da taxa que remove o obstáculo jurídico em causa? (…).
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